Presidente do BCP elogia ajudas ao crédito à habitação, não vê incumprimento generalizado e descansa acionistas
Miguel Maya é o presidente da Comissão Executiva do Millennium bcp desde 2018
Nuno Botelho
Miguel Maya diz que as medidas de apoio ao crédito à habitação “foram desenhadas de forma muito inteligente, e serão um contributo relevante para [dar] maior previsibilidade às famílias”. Garante que a ajuda com o desconto da Euribor não aumenta o valor da dívida, apenas estende o seu pagamento no tempo, e que, após lucros históricos, não há razão para estar a pedir mais sacrifícios aos seus acionistas
O presidente do BCP não antecipa incumprimentos generalizados nos créditos à habitação, mas admite casos de maiores dificuldades de pagamento. Considera as medidas de apoio lançadas pelo Governo oportunas e bem desenhadas, mas também diz que quem não precisa delas não deve accioná-las.
As palavras de Miguel Maya foram proferidas na conferência de imprensa de apresentação dos resultados dos primeiros nove meses do ano, onde foram anunciados lucros superiores a 600 milhões de euros, valores que não se viam desde a época de Jorge Jardim Gonçalves.
Apoio ao crédito é “inteligente”
As medidas de apoio ao crédito à habitação – alargamento da bonificação e fixação da taxa de juro com um desconto face ao montante atual – “foram desenhadas de forma muito inteligente, e serão um contributo relevante para maior previsibilidade às famílias”, segundo Miguel Maya. “Bem desenhado, oportuno”, caracterizou.
Sobre as bonificações, disse haver cerca de 2400 contratos com bonificações das taxas de juro (em que o Estado paga parte das prestações). O valor médio é de 32 euros.
Em relação à ajuda com o desconto da Euribor, Miguel Maya garante que “não há um aumento da dívida ao banco”. “O valor atual do crédito não é aumentado”, garantiu o CEO. O que acontece, garante, é que demorará mais a pagar a dívida, porque haverá adiamento para o futuro da diferença face ao que devia agora pagar.
Porém, Maya também deixa um aviso. “Quem não precisa, é óbvio que não deve [aderir]”, ressalvou.
16 mil renegociações, 4 mil resgates de PPR
O BCP fez cerca de 15.900 renegociações de créditos à habitação com os clientes, dizendo que o número é mais relevante se se recuar até julho de 2022, quando começou a subida de taxas de juro: aí, serão já perto de 20 mil renegociações.
Já em relação à possibilidade de resgate de PPR (planos poupança reforma) para amortização de crédito à habitação, houve 4 mil clientes a aproveitá-la: 2 mil utilizaram para amortizar o capital em dívida; 2 mil para amortizar prestações.
Incumprimento sem afetar floresta
Miguel Maya vê “maiores dificuldades” das famílias para pagar os créditos: “O que as pessoas dizem não é ficção. Houve aumento do custo de vida; isto é claríssimo. Não são ficções”, frisou o responsável do banco, mas, como já tinha dito anteriormente, não há um impacto generalizado preocupante.
“Se olharmos para a floresta, não há motivo que diga que haverá problema na floresta. Muitas situações que carecem de atenção não são um problema de dimensão sistémica, que possa antever aumento do incumprimento”, frisou.
Acionistas já não vão sofrer
Os lucros estão a subir, e os acionistas deverão deixar de sofrer no BCP, depois de um ano em que nada receberam. O presidente executivo do BCP acredita que não há razão para estar a pedir sacrifícios aos seus acionistas (Fosun e Sonangol são os principais), tendo em conta que os resultados têm vindo a subir e o capital é sólido.
“O banco tem uma situação normalizada, temos um caminho que nos permitiu estar na rota da rendibilidade, ter níveis de capital que consideramos robustos e adequados”, disse Miguel Maya quando questionado sobre a distribuição de dividendos no próximo ano. Em 2023, o banco não pagou esta remuneração aos acionistas.
O CEO não quis responder diretamente, até porque a proposta cabe ao Conselho de Administração, de que apenas é vice-presidente, com Nuno Amado como presidente, e depois tem de ser votada em assembleia-geral. “Ainda não quero fazer qualquer nota sobre a matéria. Seguramente, não vou pedir aos acionistas qualquer esforço nessa matéria, o banco já se encontra capitalizado”, garantiu.
“Há muitas coisas pela frente, temos uma guerra na Ucrânia que não está terminada, um conflito no Médio Oriente. Tudo nos obriga a ser prudentes, mas em nenhuma circunstância consideramos pedir um esforço tão grande como o que pedimos aos acionistas”, continuou o presidente executivo.
Miguel Maya não quis comentar o Orçamento do Estado para 2024 (“o Orçamento materializa opções políticas, que são as opções de quem foi eleito pelos portugueses”), fazendo apenas uma exceção: “O único aspeto que gostava de salientar é a enorme preocupação no equilíbrio das contas públicas, dos quais o país muito tem beneficiado. E obviamente os portugueses e o sistema financeiro têm beneficiado. Todos os outros temas traduzem opções políticas”.
BCP não vai ser só banco digital
Em relação à presença comercial, o BCP conta manter a sua atual rede, que se situa atualmente em 400 agências, menos oito do que em setembro de 2022. Pode haver algumas aberturas e encerramentos, mas não há uma desistência do mercado físico.
“O BCP não quer ser banco 100% digital”, disse Maya (até porque o banco tem já o Ativo Bank nesse segmento de mercado). A entidade quer ser um banco “com nome com cara, mas tirando todo o potencial que tecnologia permite”. “Vamos continuar a ter sucursais com proximidade”, ressalvou.
BCP foi ao limite na Efacec
Sobre a Efacec, de que o BCP é um dos bancos credores, Miguel Maya não se quis alongar, nem confirmar qual o nível de perdão de dívida que assumiu para permitir a privatização da empresa, com a venda à Mutares. “A Efacec é uma empresa que tem muitos trabalhadores, com conhecimento em tecnologia. Se fosse possível preservar essas competências e o emprego, o BCP devia fazer um esforço. Acho que se criaram condições para que a Efacec possa prosseguir o seu caminho”, assumiu.
“Fomos ao limite que considerámos que podia ser aceite”, continuou. A assinatura da venda deverá ocorrer esta semana.