Sistema financeiro

BCE alerta que adiar a transição climática diminui o poder de compra das famílias e os lucros das empresas

BCE alerta que adiar a transição climática diminui o poder de compra das famílias e os lucros das empresas
picture alliance/Getty

Banco Central Europeu acredita que o risco dos créditos concedidos pelos bancos vai duplicar até 2030 no cenário em que a transição verde não é acelerada

BCE alerta que adiar a transição climática diminui o poder de compra das famílias e os lucros das empresas

Diogo Cavaleiro

Jornalista

Quem espera não alcança – ou, melhor, alcança piores resultados, com mais riscos. Esta parece ser a mensagem que o Banco Central Europeu (BCE) deixa nas conclusões que retira dos testes de stress climático que divulgou esta quarta-feira, 6 de setembro. Iniciar a transição climática só no fim desta década traz menos lucros para as empresas, obrigando-as a fazer investimentos mais caros, diminui o poder de compra das famílias e, por isso, traz mais risco para os bancos. Uma conclusão retirada no dia em que António Guterres, secretário-geral da ONU, argumentou que o “colapso climático começou”.

A base de partida da avaliação feita pelo BCE é de que a “melhor forma para alcançar uma economia de zero emissões de carbono para as empresas, famílias e bancos na zona euro é acelerar a transição verde para um ritmo superior ao atual”. O próprio vice-presidente do BCE, o espanhol Luis de Guindos, o diz: “mover-nos ao atual ritmo vai aumentar os riscos e os custos para a economia e o sistema financeiro. Há uma óbvia necessidade de acelerar o caminho para [o Acordo de] Paris”, declara, citado nos documentos do BCE hoje divulgados.

A conclusão é retirada de três cenários que são traçados, em que o BCE olha para os oito anos que faltam para o final de 2030 (incluindo o atual) e compara uma aceleração imediata da transição (em 2023), outro em que só em 2026 o investimento dispara e outro que só nos anos seguintes ganha mais fôlego. A transição mede-se, nesta ótica do BCE, pelo investimento feito em energias renováveis e pelas medidas de mitigação das emissões de carbono.

Risco de crédito dispara

O que a autoridade liderada por Christine Lagarde defende é que a transição mais imediata vai implicar já custos mais elevados e maior investimento, mas o risco do crédito dos bancos (por exemplo, devido a incumprimento de famílias e empresas) começa a diminuir em 2026. Já o cenário que mais se atrasa está nos próximos anos sem grande investimento e grandes custos, mas o risco do crédito vai entrar numa rota ascendente, sem sinal de descida no prazo observado pelo BCE.

“Os bancos ficarão expostos a maior risco de crédito se a transição tiver de ser acelerada num momento mais tardio, e será preciso investir a preços mais altos”, escreve a autoridade. Aliás, no segundo cenário, em que o investimento já se atrasa e não é imediato, “os bancos podem esperar que o risco de crédito cresça mais de 100% até 2030 comparado com 2022, quando na transição acelerada o aumento é apenas de 60%”.

Este é o segundo teste do género realizado pelo BCE, que em 2021 tinha já dito que os custos de uma transição verde são sempre compensados pelos benefícios a longo prazo, olhando, nesse caso, mais para os custos tangíveis no mundo associados às alterações climáticas. Dois anos depois, o supervisor centrou-se mais na transição e no seu calendário. O olhar é sobre as empresas, famílias e bancos, e não estão aqui resultados individualizados das instituições bancárias, já que isso foi já feito nos testes divulgados em julho de 2022.

A questão climática tem vindo a ganhar importância para os supervisores, fazendo com que estes olhem para o assunto com maior atenção e inclusive elevando a pressão sobre os bancos: afinal, uma parte relevante da transição terá de ser por eles financiada. Porém, ainda recentemente o Banco de Portugal concluiu que a esmagadora maioria dos créditos dados teve como destinatários empresas sujeitas a riscos climáticos (seja pelo sector, seja pela localização).

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: dcavaleiro@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate