Deco acusa banca de dificultar renegociação dos créditos à habitação, mas não tem números
Mathieu Stern/unsplash
A taxa de esforço média das famílias que pedem ajuda à Deco ultrapassa os 80% diz Natália Nunes coordenadora da instituição. Famílias “em situação desesperante” querem renegociar os créditos à habitação e não conseguem. Taxa fixa não resolve o problema dos mais vulneráveis
“Os clientes são afastados sempre que querem renegociar” porque os bancos invocam a revisão dos créditos como uma espécie de “pedra de arremesso”, referindo que, se os consumidores renegociarem os seus créditos, terão mais problemas no acesso a novos créditos. É esta a mensagem deixada por Natália Nunes, coordenadora do gabinete de proteção ao consumidor da Deco, esta tarde no Parlamento.
Num tema que não é original, Natália Nunes consegue surpreender os deputados ao afirmar que “a taxa de esforço média das famílias que têm vindo ter connosco [com crédito à habitação] ultrapassa os 80%” do rendimento, o que revela “as dificuldades e situação desesperante" de muitas delas. Adverte contudo, que “não são todas, apenas as famílias que estão em dificuldade”.
A coordenadora do gabinete de apoio da DECO refere ainda que, em famílias com rendimentos mais baixos “o poder negocial junto dos bancos é muito reduzido e por isso pedem à Deco ajuda para evitar situações de incumprimento ou terem de recorrer a um processo de insolvência”.
Natália Nunes refere que o Banco de Portugal pode ter mais números sobre a necessidade dos consumidores relativamente à renegociação dos créditos à habitação, mas reconhece, quando questionada sobre que formas podem existir para ultrapassar os problemas, que não tem “varinha mágica”.
“Não tenho varinha mágica”, afirma , mas o regulador “deve ter um papel mais interventivo para as famílias não entrarem em incumprimento ou mesmo em insolvência”.
“Temos muita dificuldade em saber números”. Sabe-se apenas que só 1% dos créditos foram objeto de renegociação", diz Natália Nunes. “Há famílias na iminência de entrarem em situação de incumprimento, que reunindo os requisitos do último diploma, mas não conseguem”, prossegue explicando que os bancos deviam atuar depois de verificar que a situação se alterou. “Por um lado temos as famílias que querem pagar, por outro os bancos a dizerem às famílias que não reestruturam os créditos".
Quer Natália Nunes quer o economista da Deco, Vinay Pranjivan, afirmam que os diplomas que existem sobre renegociação não são suficientes, ou melhor não trazem mais valia face ao que já existia. E sublinham que os bancos devem ser obrigados a dizer aos clientes quais as razões porque não lhes reestruturam o crédito.
Vinay Pranjivan afirma que, ao contrário do que se possa pensar, “a concorrência em Portugal é muito baixa”. E explica: “80% do mercado está concentrado em 5 bancos e entre eles poderá haver a fusão de um deles”, e nesse cenário “o poder negocial dos consumidores é menor”. Na União Europeia , diz, “a concentração é de 60%”.
Taxa fixa não resolve problema dos que mais precisam
Natália Nunes diz que a taxa fixa no crédito à habitação “é importante mas não para as famílias em dificuldade financeira porque será sempre uma taxa mais elevada do que a taxa variável que têm”. E se as famílias estão em dificuldade não vão poder pagar mais.
Também Vinay Pranjivan esclarece que “há uma diferença muito grande entre a taxa fixa e a taxa variável”, apelando a que pudesse ser “uniformizado o critério da formação do preço” e dessa forma não haver uma diferença tão grande. “A procura por taxa fixa é mais baixa porque o preço é maior”, e nem há 20 anos era mais vantajoso contratar uma taxa fixa, porque são sempre mais elevadas, acrescenta o economista.
O economista da Deco referiu ainda que o papel dos bancos deve ser também “social e esse tem sido esquecido". E no que diz respeito ao papel da CGD afirma que, sendo o banco do Estado, deve “ter mais proatividade nos aumentos do juros dos depósitos”. Embora refira que no que diz respeito aos depósitos cada banco tem o “seu pricing”. Há bancos a apresentar, desde fevereiro, taxas de juros mais altas nos depósitos mas são sobretudo taxas promocionais.
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Natália Nunes, a pedido dos deputados, deu dois exemplos de consumidores que se queixaram à Deco, referindo que o banco diz que não reúnem as condições para pedir o apoio criado temporariamente pelo Governo.
Mas antes disso deixa uma nota: “Para ter o apoio (no máximo de 720 euros) o consumidor não pode ter poupanças acima de 30 mil euros”. “Num dos e-mails que recebi é dito: não estou apta para me enquadrar na proposta do Governo embora tenha os requisitos solicitados, uma taxa de esforço superior a 35%”, dá nota a coordenadora da Deco referindo que em muitos casos os bancos poderão não estar a somar os créditos todos daquela família ou consumidor.
Num outro caso, o consumidor dá nota: “Devido ao aumento exponencial das taxas de juros o meu crédito á habitação passou de 416 para 616 euros e o banco diz que não tenho apoio, quando no meu caso a taxa de esforço ultrapassa os 35%”.
Segundo Natália Nunes pode estar a dar-se o caso de não se somarem os diversos créditos daquele cliente e apenas se olhar para o crédito à habitação.
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