Poucas horas depois de ter começado a circular a informação de que o Presidente russo, Vladimir Putin, estaria pronto para enviar uma delegação a Minsk, capital da sua aliada Bielorrússia, para conversações com a Ucrânia, os mercados começaram a reagir.
No caso das commodities (matérias-primas) agrícolas, os preços do trigo, do milho e da soja, caíam [pelas 16h30 desta sexta-feira] 6,2%, 4,5% e 3%, respetivamente, face às cotações da véspera [algumas em máximos de vários anos].
No entanto, desde o início do ano que todas aquelas commodities viram as suas cotações disparar nos mercados internacionais, com destaque para o trigo, que já se valorizou 18,3%, numa tendência de alta que se agravou desde o momento em que se deu a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Ucrânia é a “padaria” da Europa
Note-se, aliás, e segundo o analista Nuno Mello, da corretora XTB, que aqueles dois países juntos respondem por cerca de 30% da produção mundial de trigo. A Ucrânia é mesmo conhecida como a “padaria” da Europa, dado o seu papel relevante no abastecimento de cereais.
A importância daquele país nesta matéria é de tal ordem que, e ainda segundo Nuno Mello, em 2021 conseguiu substituir os Estados Unidos da América nas vendas à China.
O analista da XTB sublinha que, quanto mais tempo durar o conflito mais ficará comprometida toda a cadeia não apenas de produção agrícola como também de distribuição de matérias-primas. “Apesar de as sementeiras [que ainda estão na terra] só serem colhidas daqui a três meses, o arrastamento do conflito entre os dois países irá provocar aumentos de preços, desde logo, nos próprios cereais e, em consequência, em todos os produtos que deles derivam, com destaque para o pão, mas também para as rações para animais e, no final da linha, a carne que nos chega ao prato”.
Cotação do trigo em máximos de 10 anos
De acordo com a agência Reuters, os contratos futuros de trigo negociados nos Estados Unidos alcançaram o limite diário de negociação na quinta-feira, para máximos desde meados de 2012 e os futuros de milho atingiram picos de oito meses, depois de as forças armadas russas terem entrado na Ucrânia.
Questionado sobre se a invasão russa pode comprometer a segurança alimentar mundial, Sébastien Abis, investigador associado do Instituto de Relações Estratégicas e Internacionais (IRIS) e autor da obra “Géopolitique du blé” (Geopolítica do Trigo), disse, em entrevista emitida pela AFP, que “os primeiros afetados são os ucranianos”, uma vez que “qualquer teatro de guerra tem consequências imediatas para a vida quotidiana”.
Depois, “importa lembrar que a Ucrânia é uma grande potência produtora de trigo, milho, girassol, também um pouco de soja, muita colza, cevada… As suas produções alimentam o mercado mundial porque a Ucrânia tem necessidades internas limitadas, portanto tem volumes importantes para exportar”.
Nuno Mello, analista da XTB, lembra ainda que, mesmo que, entretanto, o conflito termine, “é muito natural que algumas infraestruturas fiquem destruídas e que mesmo os próprios campos de cultivo sofram quebras na produção. Tudo isso, acabará por ter, naturalmente, impacto na formação dos preços destas matérias-primas alimentares”.