Lítio: autarcas saem incrédulos de reunião com o ministro do Ambiente
Os concelhos da região das Beiras e Serra da Estrela vão avançar com o seu próprio estudo para avaliar o impacto da prospeção e eventual exploração de lítio na região
Os concelhos da região das Beiras e Serra da Estrela vão avançar com o seu próprio estudo para avaliar o impacto da prospeção e eventual exploração de lítio na região
“Eu nem queria acreditar no que acabara de ouvir do próprio ministro do Ambiente do meu país: além de nos ter confirmado que a área destinada a prospeção no meu concelho se sobrepõe a 30% da área do regadio da Cova da Beira – onde o Estado investiu mais de 320 milhões de euros nos últimos anos -, ainda ficámos a saber que a nossa contrapartida seriam alguns milhares de euros anuais por cada mina aberta, sabendo que a nossa região gera atualmente 100 milhões anuais em agricultura, precisamente porque passou a ter água do regadio”.
O desabafo é de Paulo Fernandes, presidente da Câmara Municipal do Fundão, um dos concelhos visados pela autorização de prospeção e pesquisa de lítio, recentemente anunciada pelo Governo, à saída, no final da tarde de quarta-feira, de uma reunião com o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes.
“Nós, os municípios, temos de ter uma palavra sobre o que se passa no nosso território. Os nossos pareceres não podem ser meramente consultivos, como agora nos disse o ministro do Ambiente – contrariando o que nos tinha sido dito antes, assegurando que seriam ‘vinculativos’ nestas matérias”, disse ainda o autarca, em declarações ao Expresso.
O ministro do Ambiente, que se recusou a prestar declarações ao Expresso, apesar de dois pedidos para o efeito, iniciou esta quarta-feira uma série de reuniões com vários autarcas cujos territórios serão alvo de ações de prospeção e pesquisa de lítio, encontros esses que continuarão esta quinta-feira, em Lisboa.
“Tudo isto não passa de uma mera formalidade, para que depois ninguém diga que os municípios não foram ouvidos pelo Governo mas, na verdade, é só para cumprir calendário”, considera outro dos autarcas que ontem desceu do norte do país até à capital e que pediu para não ser identificado.
Dois dos presidentes de Câmara com quem o Expresso falou, após a reunião com o ministro, asseguraram que a Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela, que engloba 15 municípios particularmente visados pelas autorizações de prospeção de lítio, “repudia veementemente estas decisões e vai ela própria fazer um estudo estratégico sobre o impacto ambiental, económico e social” da atividade mineira do lítio.
“Então mas faz algum sentido o ministro do Ambiente vir dizer-nos que se a exploração avançar no nosso concelho, a contrapartida seriam 100 mil euros anuais por cada mina aberta no nosso território, sabendo nós, por exemplo, que qualquer parque eólico ou solar retribui muito mais que isso e, provavelmente, com muito menos impacto negativo?”, questiona Vítor Proença, presidente da Câmara Municipal do Sabugal, um dos concelhos com maior área do país [cerca de 820 quilómetros quadrados], mas com 40% do seu território elegível para prospeção de lítio.
“Tudo isto é um absurdo, assim como também o é o facto de não nos estar a ser fornecida quase nenhuma informação pelo Governo para partilharmos com as nossas populações, que, legitimamente, nos levanta cada vez mais questões”, enfatiza ainda o autarca do Sabugal.
Apesar de tudo, refere, “foi-nos dito que, depois das operações de prospeção e pesquisa de lítio, ou mesmo depois da exploração – caso avance -, a paisagem seria reposta e reflorestada e que o nosso território não ficaria cheio de montes e serras esventradas. Mas é muito pouco e isso não nos satisfaz. Na verdade nós somos frontalmente contra a exploração do lítio no nosso concelho, ainda mais porque continuamos sem saber o que ganharíamos localmente com essa situação”.
O autarca do Sabugal, que também esteve quarta-feira reunido com o ministro do Ambiente, reforça que considera lamentável que continue a não haver informação clara e em abundância para tranquilizar as populações que, de um dia para o outro, poderão ver as suas vidas totalmente alteradas. E, conclui, “é urgente tornar este processo claro e transparente e não se entende como é que uma operação destas dimensões, a nível nacional, é anunciada ali mesmo junto às eleições legislativas do passado dia 30 de janeiro”.
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