O euro digital dá soberania e acaba com a dependência de Visa e Mastercard
O que podemos esperar do Euro Digital? Privacidade e soberania monetária, respondeu administrador do Banco de Portugal
O que podemos esperar do Euro Digital? Privacidade e soberania monetária, respondeu administrador do Banco de Portugal
Vem aí um euro digital depois de 2025, mas as notas e as moedas ainda estão para durar. Hélder Rosalino, administrador do Banco de Portugal, subiu ao palco do Congresso dos Negócios Digitais, em Lisboa, e logo tratou de evitar enganos e apontar para uma mudança que poderá chegar bem antes do fim do numerário. O euro digital é moeda e também canal de transação – e por isso permite criar “uma forma de pagamento que vale para toda a zona euro”.
Visa, Amex ou Mastercard são americanas e têm o exclusivo do processamento de pagamentos que atravessam todos os estados membros. Em paralelo com estas marcas que processam pagamentos transacionais, surgem outras de nova geração, como a Paypal. É um cenário que “pode gerar a prazo uma dependência (do mercado europeu) dessas marcas”, alertou Hélder Rosalino. E daí o euro digital ser apontado como um passo importante para a “soberania monetária europeia”, referiu o administrador do Banco Central Europeu.
A corrida ao euro digital arrancou em 2020, tendo como objetivo uma eventual estreia a partir de 2025. Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE), recordou que notas e moedas são para manter enquanto o mercado as quiser, e no Congresso organizado pelos operadores de telecomunicações, Francisco Barbeira, administrador do BPI, e Ricardo Correia e diretor de ativos digitais da R3, previram igualmente que o as notas e moedas não acabam tão depressa. É um sinal de que a digitalização também terá os seus ritmos – mas que não invalida que o futuro euro, já desmaterializado, tenha em conta dois fatores cruciais: tem de operar quando não há internet, e deve garantir uma “privacidade muito próxima das notas e moedas”, referiu Hélder Rosalino.
Atualmente, o euro digital está fase de desenvolvimento, com cinco casos de estudo atribuídos já a conhecidos intervenientes no mercado. A meta de 2025 também assume contornos de contrarrelógio. Nos EUA trabalhos similares estão em curso, e na China o yuan já é transacionado em grande escala – mas com dois elementos diferenciadores: as carteiras digitais que suportam as transações foram disponibilizadas por grandes marcas tecnológicas, e já há países como Índia e Paquistão ou Brasil a aceitar o yuan digital como moeda de negócio. Além de uma ameaça ao futuro do euro digital, a versão desmaterializada da moeda chinesa também pode iniciar uma missão de desgaste do dólar americano, enquanto divisa favorita dos negócios transnacionais.
Talvez por algumas destas circunstâncias, Ricardo Correia prevê que “os bancos centrais podem vir a tornar-se redundante”, e Hélder Rosalino que já não estava em palco, mas deu indício de ter posição oposta. O administrador do Banco de Portugal recordou que o euro digital é também uma forma de as autoridades cumprirem a missão de emissão de moeda, ao mesmo tempo que desenvolvem ferramentas que facilitam a vida dos consumidores – mas que terão de ter disponibilidade permanente, tal como as moedas e as notas quando estão nas mãos de um consumidor.
O euro digital pode ser apenas parte da revolução financeira em curso na UE. O Regulamento Europeu dos Criptoinvestimentos já foi aprovado no final de abril, e os estados membros dispõem agora apenas de 18 meses para executar essa legislação (aplicar com alterações aprovadas localmente). E com essa legislação poderá dissipar-se parte de alguma confusão que se mantém sobre criptoativos como a bitcoin, que não têm qualquer reserva de valor associada, e as denominadas stablecoins, que podem ser emitidas por bancos ou empresas, mas estão indexadas a atividades ou reservas de valor.
Francisco Barbeira enaltece a diferença que poderá fazer ao mercado ter uma regulação para criptoativos: passa a haver muitas mais “possibilidades para as fintechs (empresas de tecnologias que operam na área financeira) e bancos possam apresentar soluções e muita inovação em cima deste espaço regulado”. Dito de outra forma: o dinheiro e emitido sempre que alguém quiser e a tecnologia ou permitir. Resta saber quem é que o compra.
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