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Japão sofre pior dia desde 1987, criptomoedas perdem €250 mil milhões e Europa 'no vermelho': a segunda-feira negra das bolsas mundiais

Japão sofre pior dia desde 1987, criptomoedas perdem €250 mil milhões e Europa 'no vermelho': a segunda-feira negra das bolsas mundiais
ANDREW KELLY

De Tóquio a Frankfurt, as bolsas de todo o mundo estão a negociar em queda na primeira sessão da semana, com vários mínimos a serem registados. Criptomoedas veem 250 mil milhões fugir num só dia e setor tecnológico mantém fortes quedas com fantasma da recessão nos EUA a espreitar

O índice da bolsa do Japão, o Nikkei 225, sofreu a sua maior queda diária desde a 'Segunda-feira Negra' de 1987, com uma desvalorização de 12,4% na primeira sessão desta semana (e a queda em pontos foi mesmo a maior de sempre). Este sentimento levou a que fosse acionado o chamado circuit breaker, um mecanismo que suspende a negociação de um título ou índice quando a volatilidade dispara. Mas as quedas nesta manhã não se cingiram a Tóquio: alastraram-se a toda a Ásia, afundaram as criptomoedas e estão agora a atacar as bolsas na Europa.

"O foco está agora nos receios de que a maior economia do mundo está à beira de recessão. As más notícias na economia estão agora a representar más notícias para os mercados, sendo que o relatório do emprego nos EUA foi a 'gota de água' para os investidores apertarem o gatilho da venda de ações", começa por explicar a nota diária da consultora BA&N, acrescentando que "o sentimento dos investidores sofreu uma reviravolta dramática que está a provocar uma aversão extrema aos ativos de risco e quedas muito pronunciadas nas bolsas globais".

Ao Expresso, o analista da XTB, Henrique Tomé adianta ainda que "tudo isto também está a ser agravado com os resultados das empresas tecnológicas que começam a dar sinais de abrandamento devido ao atual contexto de taxas de juro elevadas. O sentimento negativo é geral e estende-se a todos os mercados, embora o 'epicentro' das preocupações tenha começado nos EUA, todas as bolsas estão a sofrer com estas preocupações".

Na Coreia do Sul (-9,1%), a maior desvalorização diária desde 2008 levou também à suspensão da bolsa, e outros países asiáticos sofreram pesadas quedas, como Taiwan (-8,4%), Singapura (-4,4%), Austrália (-3,7%), Índia (-3,1%), China (-2,1%) e Hong Kong (1,6%). E a Europa acordou também com os pés de fora. O Stoxx 600, índice que agrupa as 600 maiores empresas da região, perde 2,3% e negoceia em mínimos de seis meses, numa manhã em que todas bolsas negoceiam no vermelho: Milão (-3,1%), Madrid (-2,6%), Paris (-2,1%), Lisboa (-2,3%), Frankfurt (-2,3%) e Londres (-2,3%).

Esta tendência vem desde sexta-feira, em Wall Street, com o índice tecnológico Nasdaq a recuar para território de correção, com uma perda superior aos 10% face aos últimos máximos históricos. Apesar de o crescimento económico ter surpreendido positivamente até agora, os dados do emprego relativos a julho preocuparam os investidores, com a taxa de desemprego a subir duas décimas para 4,3%, o nível mais alto desde outubro de 2021. Já em junho, os números finais surpreenderam pela negativa os analistas. O Goldman Sachs reviu em alta a probabilidade de uma recessão económica nos EUA de 15% para os 25% esta madrugada.

Steven Santos, analista do Banco Big, explica ao Expresso que “o mercado projeta o futuro, com base na informação - por vezes insuficiente - que temos agora”. “A menor criação de emprego e especialmente o aumento da taxa de desemprego para máximos de 3 anos agudizou preocupações sobre o mercado laboral. Naturalmente que ainda estamos longe de uma recessão, mas a perceção do mercado é que estamos agora muito mais vulneráveis a ter uma recessão do que há umas semanas ou meses atrás”, adianta.

Isto, a juntar à inação da Reserva Federal norte-americana, que na semana passada manteve as taxas de juro inalteradas em máximos históricos, aumenta os receios de uma recessão na maior economia do mundo. Depois dos números do emprego, os mercados aumentaram as hipóteses de um corte de juros em setembro para 78%, prevendo agora um corte de 50 pontos base (e não apenas de 25 pontos base). As taxas estão no intervalo 5,25% - 5,5% e os mercados antecipam um corte para os 3% até ao final de 2025.

A aversão aos ativos de maior risco por parte dos investidores está a provocar uma tempestade no mercado de criptomoedas, que desvalorizou mais de 250 mil milhões de euros num só dia, com a bitcoin a desvalorizar 11% para os 47,8 mil euros, o valor mais baixo desde fevereiro deste ano. A ether, a segunda moeda digital mais valiosa, encolhe 21% também para mínimos de seis meses.

Japão sofre as maiores quedas do dia

Variação diária (em percentagem) de alguns dos maiores índices do mundo

Buffet provoca tempestade na tecnologia

"Durante o fim de semana, soube-se que Warren Buffett vendeu metade das ações da Apple, contribuindo para o sentimento negativo em torno das ações que se iniciou no final da semana passada", diz ao Expresso, Steven Santos. A Berkshire Hathaway, empresa do conhecido investidor Warren Buffet, reduziu a sua posição na Apple para quase metade, gerando receios junto dos investidores sobre a sustentabilidade do setor tecnológico. A fabricante de iPhones continua a ser a empresa com maior peso na carteira de Buffet, mas a posição encolheu para 84,2 mil milhões de dólares (cerca de 75 mil milhões de euros).

A Berkshire Hathaway reduziu a sua exposição ao mercado de ações (no total, tirou 75 mil milhões de dólares destes títulos) e reforçou o seu montante em cash para os 277 mil milhões de dólares, reforçando a ideia de que se está a afastar dos ativos de risco e lançando a desconfiança entre o mercado, numa altura em que o setor tecnológico está sofrer fortes quedas, depois de no primeiro semestre ter disparado em bolsa. Desde janeiro até ao início deste mês, o Nasdaq, índice que agrupa as maiores tecnológicas dos EUA, valorizou 26%, com as "Sete Magnificas" (Apple, Amazon, Alphabet, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla) a dispararem 57%. Mas, desde essa data até esta segunda-feira, tudo mudou: o Nasdaq acumula uma perda de 10% e o grupo das maiores tecnológicas encolhe 14%.

Na pré-abertura de sessão desta segunda-feira (os índices dos EUA só começam a negociar por volta das 14h30 de Portugal continental), esta tendência agrava-se. O S&P 500, que agrupa as 500 maiores empresas norte-americanas, encolhe 2,5%, o Nasdaq Composite cai 4,1% e o Dow Jones perde 1,6%. Empresas como a Apple (-7,9%), a Nvidia (-8,94%) ou a Tesla (-6,4%) estão entre as maiores derrotadas na pré-abertura de sessão.

Índices nos EUA recuam dos máximos

Variação do S&P 500, Nasdaq e do índice que agrupa as sete maiores empresas tecnológicas, desde o início deste ano

Banco do Japão lança pânico entre investidores

Em Tóquio, as bolsas caíram mais do que no resto do mundo nesta segunda-feira e a atuação recente do Banco do Japão pode ajudar a explicar este movimento, após ter aumentado as taxas de juro pela segunda vez nos últimos 17 anos, na semana passada. Isto, segundo os especialistas, pode ameaçar a estratégia chamada carry trade. Ao Expresso, Steven Santos explica que "estamos perante o desfazer de um carry trade, estratégia em que os investidores se financiavam em iene, moeda historicamente segura, barata e de baixo risco, para comprar ativos noutras moedas, sobretudo em dólares americanos"

E acrescenta: "com o Banco do Japão a aumentar as taxas de juro, o dólar americano pressionado pelos dados de emprego abaixo do esperado divulgados na semana passada e receios de uma recessão nos EUA, existiu um aumento da procura por iene não só como ativo de refúgio como também para amortizar empréstimos, tendo repercussões em diversas classes de ativos".

Nesta segunda-feira, o iéne avançou para máximos de sete meses, com um ganho de 3,4% para os 114,67 dólares. Já o dólar norte-americano derrapa 0,5% contra um cabaz das principais moedas mundiais, um mínimo de cinco meses.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: galmeida@expresso.impresa.pt

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