A Comissão Europeia apresentou esta quarta-feira as propostas legislativas formais para rever o modelo de governação económica na União Europeia, que se traduzirão numa flexibilização dos objetivos de endividamento dos Estados-membros, conforme o Expresso avançou esta terça-feira.
Em causa estão as regras orçamentais que os Estados-membros terão de cumprir e que vão manter os conhecidos tetos de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) para o défice orçamental e de 60% do PIB para a dívida - limites que já vêm do Tratado de Maastrich. Contudo, é dado mais tempo e maior margem de manobra aos Estados-membros para reduzirem a dívida.
Assim, cai a polémica regra de redução da dívida ao ritmo de 1/20 ao ano, para os países que estão acima da linha vermelha dos 60% do PIB (para a dívida que excede esses 60%). Um ritmo considerado irrealista e que praticamente nenhum governo cumpria. Em alternativa, os países ganham flexibilidade e a possibilidade de desenharam os próprios planos de redução de dívida.
Com as regras orçamentais na UE ainda suspensas, no seguimento da pandemia de covid-19 e da guerra na Ucrânia, mas estando já definido que voltam a vigorar em 2024, a Comissão Europeia está numa corrida contra o tempo para rever o modelo de governação económica na UE. O objetivo é forjar um consenso entre os Estados-membros e conseguir que aprovem a reforma antes do final do ano.
Depois da comunicação técnica avançada em novembro passado, a Comissão apresentou esta quarta-feira as propostas legislativas formais para a alteração das normas. E que bebem muito desse documento técnico.
Reconhecendo que as regras atuais são muito complexas, que impõem exigências irrealistas no que toca à redução da dívida, sobretudo dos países mais endividados (regra de 1/20), e têm poucos incentivos ao investimento e ao desenvolvimento de reformas estruturais, Bruxelas aponta agora para trajetórias de redução da dívida articuladas com os Governos de cada país.
A despesa líquida passa a ser o indicador de referência a ser monitorizado por Bruxelas e as condições de ajustamento vão depender das condições específicas de cada país.
Nesse sentido, um elemento central nas propostas de Bruxelas é que os países apresentem planos nacionais de médio prazo que combinam política orçamental, reformas estruturais e investimentos prioritários, com um horizonte de quatro anos. Período que pode, em certos casos, ser estendido em mais três anos (perfazendo um total de sete anos).
Os planos são desenhados pelos países e propostos à Comissão, que os avalia, mas têm depois de ser aprovados pelos ministros das Finanças da UE. Um processo e uma lógica semelhante à da negociação do Plano de Recuperação e Resiliência, para garantir que os países se identificam com o plano de redução de dívida e os implementam sem desculpas.
É com base nesses planos que a CE fará uma análise à sustentabilidade da dívida, definindo limites anuais para a despesa líquida, que mantenham o défice abaixo dos 3% do PIB e a dívida numa trajetória descendente. E que terão de ser respeitados pelos países nos seus orçamentos nacionais.
Será esse o indicador operacional para monitorização pela CE e para a adoção de procedimentos corretivos, que são também reforçados. É o caso do procedimento por défice excessivo (PDE) para os países que não cumprem a redução da dívida.
Até agora, a Comissão nunca abriu um PDE para os países com dívida elevada e que não cumprem o critério da dívida - abriu apenas para os que não cumprem o défice - mas com as novas regras torna-se mais claro e simples lançar um procedimento corretivo e aplicar sanções. Já as regras do PDE para os países que não respeitam o défice mantêm-se inalteradas.
Além disso - e este é um ponto adicional face à proposta técnica de novembro passado - aos países com défice acima dos 3% do PIB é exigida ainda uma redução de meio ponto ao ano até alcançarem essa fasquia. Já o indicador de evolução do saldo orçamental estrutural (que exclui os efeitos do ciclo económico e medidas extraordinárias) atualmente previsto nas regras, também cai.
A Comissão aponta para que os países possam já começar a preparar o plano de redução da dívida para o próximo ano, para o período 2025-2028. Mas isto implica que os 27 cheguem a um consenso e aprovem as novas regras antes do final do ano. Um objetivo “ambicioso”, admite o Comissário da Economia, Paolo Gentiloni, mas que o italiano acredita ser possível.
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