Encarar os empréstimos feitos à TAP como irrecuperáveis, uma ideia que se cimentou junto da opinião pública, é uma ideia errada. E mais tendo em conta o facto de, em outros países que também resgataram companhias aéreas durante a pandemia, ter havido restituição de fundos investidos ao erário público, disse Nazaré da Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP), no Parlamento, esta quarta-feira, 29 de março.
No Parlamento a requerimento da Iniciativa Liberal (IL), respondendo a questões sobre gestão das empresas públicas, a presidente do CFP lamentou o que diz ser a ideia generalizada de que é inevitável o Estado não recuperar os fundos aplicados na TAP.
“Considero um aspeto muito crítico o que vemos em relação à TAP (…). Verificamos que a ideia que passou junto da opinião pública é que esses valores de recapitalização que têm sido feitos praticamente poderiam ser considerados como dados a fundo perdido", disse, respondendo ao deputado da IL, João Cotrim de Figueiredo.
“Num contexto da plausível privatização da companhia (…) ficamos com a ideia de que o Estado nunca mais vai recuperar o esforço financeiro”, criticou. “Creio que a ideia deveria ser outra”, defendeu.
O que “contrasta com o que aconteceu com outras companhias aéreas que tiveram uma situação complicada durante a pandemia e que foram fortemente apoiadas pelos estados durante a pandemia, mas logo que a situação de lucro voltou tiveram a preocupação de reembolsar o Estado”, esclareceu.
A TAP foi alvo de um plano de reestruturação total que implicou a aplicação de 3200 milhões de euros em dinheiros públicos na transportadora aérea desde 2020, no âmbito do acordo com a Comissão Europeia. Uma crise espoletada pela pandemia da covid-19, com início em 2020, que parou a aviação global e obrigou ao resgate e reestruturação de companhias aéreas em todo o mundo.
Este esforço financeiro na transportadora aérea, recordou Costa Cabral, “teve um custo de oportunidade, porque o que foi alocado à TAP poderia ter sido alocado” a outras áreas, acrescentou.
Mais à frente na audição, em resposta a questões do deputado do PCP Duarte Alves sobre as consequências de não recapitalizar a TAP - com o parlamentar a sublinhar o possível impacto de uma falência no esforço financeiro da Segurança Social - Nazaré da Costa Cabral considerou que a decisão do Governo em 2020, uma “opção estratégica” do Executivo, terá “jogado com o impacto da pandemia”, numa altura de resgates generalizados na Europa de companhias aéreas.
“Mas aquilo que me parece é que a mensagem que dada por essas empresas foi um pouco diferente” à transmitida em Portugal em relação ao futuro desses fundos, ressalvou, acrescentando que companhias aéreas como a Lufthansa restituíram fundos ao estado, neste caso o estado alemão.
“Na TAP o discurso foi um bocadinho diferente. Isso é que eu não vejo como uma opção salutar naquilo que é o respeito pelo esforço que foi feito por todos nós”, considerou.
Empresas públicas devem ter lucro
Respondendo a questões do deputado da IL João Cotrim de Figueiredo sobre a ausência de retorno do investimento público, a presidente do CFP disse que, no debate sobre “saber se as empresas [públicas] devem gerar lucro ou não”, posiciona-se com uma resposta afirmativa. “Creio que as empresas devem ter essa finalidade, mesmo que se trate de uma empresa pública, e deve ter como finalidade ser bem gerida”.
Uma análise ao parque empresarial público “permite-nos ver que, de facto, além da situação patrimonial, tipicamente os resultados económicos das empresas públicas traduzem níveis de rendibilidade negativos, desde logo a rendibilidade das vendas”.
“Há um problema de gestão”, disse, e “a tutela deve começar a olhar com outros olhos sobre como é que deve ser gerido” o parque empresarial público, “quais devem ser as suas missões” e se este deve ser “bem gerido”.
Até porque, acrescenta, “uma empresa que é bem gerida traz retorno para o Estado, traz lucros que assumem a forma de dividendos”.
Empresas do grupo BPN são “ferida nas finanças públicas”
O esforço financeiro do Estado “é mais permanente” em certas áreas que exigem naturalmente mais capital. A presidente do CFP alertou, contudo, que "é preciso controlar a gestão para que esse esforço não seja um esforço sistemático de alocação de dinheiros públicos que comprometam as finanças públicas”.
Deu o exemplo das empresas da esfera do nacionalizado BPN, “uma herança que tarda em resolver-se e de que se tem falado pouco”, como a Parlvalorem e a Parups, “são nos últimos anos sorvedouros de dinheiros públicos, com permanentes injeções de capital em forma de empréstimos", com “um empréstimo feito em 2019 de 1200 milhões de euros”.
A Parvalorem é, de resto, “a campeã dos capitais próprios negativos”, notou, com 3300 milhões de euros negativos em 2021, a recordista entre as empresas do Estado.
“É uma situação que está ainda por resolver, é uma ferida nas nossas finanças públicas e que tarda em ser resolvida”, disse.
Notícia atualizada às 12h31
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