O PS enviou esta sexta-feira um requerimento solicitando que a secretária de Estado da Mobilidade, Cristina Dias, seja ouvida, perante o que considera o “adensar de dúvidas” que resultaram das recentes audições realizadas na Assembleia da República. Em causa está a indemnização de 79.087,58 euros que a governante recebeu quando saiu da CP, poucos dias antes de ter entrado noutra instituição do Estado, a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT).
Até agora houve quatro audições sobre o assunto na Comissão de Economia, Obras Públicas e Habitação. As do atual presidente, Pedro Moreira, e a de um dos seus antecessores, Manuel Queiró, que era presidente à data da saída de Cristina Dias da empresa. Foram também ouvidos Sérgio Monteiro, então secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações, e Francisco Fortunato, ex-diretor da EMEF.
Nessas audições foram lançados novos dados sobre o tema e foram conhecidos documentos internos da CP que atestam que Cristina Dias já tinha sido convidada para o conselho de administração da AMT quando a 22 de julho de 2015 pediu para sair da CP, onde ocupava o cargo de vice-presidente. Além disso, Manuel Queiró negou ter conhecimento da ida de Cristina Dias para a AMT. Em declarações feitas anteriormente ao Correio da Manhã, Queiró garantiu que, se Cristina Dias tivesse feito um aviso formal sobre a ida para a AMT, a indemnização de saída teria sido de um valor diferente ou não teria sequer existido.
No requerimento o PS refere que a 22 de julho de 2015 Cristina Dias “remeteu um ofício dirigido ao presidente do conselho de administração da CP para revogação do seu contrato de trabalho por mútuo acordo” e que nesse mesmo dia teve lugar uma “reunião extraordinária da administração para aprovar a rescisão do contrato, mediante uma indemnização de aproximadamente 79 mil euros, sendo que o departamento de recursos humanos tinha já preparado o cálculo da indemnização a ser atribuída”.
Indica também que “no dia imediatamente seguinte, o conselho de administração da CP voltou a reunir de forma extraordinária para prescindir do cumprimento do prazo de produção de efeitos de renúncia estipulado por lei, sendo que, entretanto, Cristina Dias renunciou ao cargo de vice-presidente da CP”.
“Não se concebe nenhum parecer jurídico ou processo de decisão devidamente fundamentado na CP que sustente em termos próprios a indemnização referida”, acrescentam nesse requerimento os deputados do grupo parlamentar do PS, que questionam se não se poderá “estar perante um grave tratamento de favor” a Cristina Dias atendendo às datas das reuniões extraordinárias do concelho de administração da CP, além do facto de Manuel Queiró ter dito que “não existiu qualquer comunicação prévia de que a saída da Dra. Cristina Dias da CP teria lugar a 23 de julho de 2015, e que a mesma transitaria de imediato para a AMT”.
“Perante um imperativo esclarecimento sobre os contornos políticos, éticos e jurídicos de todo este processo, considera o Grupo Parlamentar do Partido Socialista ser o momento de ouvir a própria Dra. Cristina Dias, atual Secretária de Estado da Mobilidade, sobre o seu processo de saída da CP e respetiva indeminização. Assim o exige o princípio da transparência”, adianta o partido no requerimento enviado ao deputado Miguel Santos, presidente da Comissão de Economia, Obras Públicas e Habitação.
Carta não referia a AMT
Numa carta com a data de 22 de julho de 2015, dirigida a Manuel Queiró, Cristina Dias pedia ao então presidente do conselho de administração da CP que analisasse a hipótese de, “por acordo, pôr termo” ao seu contrato de trabalho “nas condições em vigor na empresa”.
“Para o efeito e tendo em conta toda a minha carreira profissional na CP bem como os cargos desempenhados, solicito que para efeitos de cálculo do valor da indemnização me sejam considerados todos os anos de trabalho efetivo, desde 2 de dezembro de 1992 a junho de 2015, ao serviço desta empresa”.
A gestora lembrava que exerceu as funções de diretora do gabinete de desenvolvimento organizacional, qualidade e ambiente no período que antecedeu a sua nomeação para vogal do conselho de administração, e que tinha a categoria profissional de técnica licenciada. Nessa carta não era feita qualquer referência à sua ida para a AMT poucos dias depois.
De acordo com os registos internos da CP, o seu último dia de trabalho foi 22 de julho de 2015. A 15 de julho desse ano Cristina Dias tinha sido ouvida na Comissão de Economia e Obras Públcias no âmbito da sua indigitação para exercer o cargo de vogal do conselho de administração da AMT.