Economia

1984: a segunda crise depois do 25 de Abril

2 abril 2023 8:15

100 mil trabalhadores tinham salários e subsídios em atraso e só 22% dos desempregados inscritos recebiam subsídio

rui ochoa

A economia portuguesa caiu mais de 1% no ano em que a economia mundial cresceu quase 5%. A ‘culpa’ foi dos impactos das receitas do FMI aplicadas desde 1983

2 abril 2023 8:15

A recessão de 1984 em Portugal acabou por ser um acontecimento atípico na época. Enquanto a economia mundial cresceu 4,6% e os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) — de que Portugal era membro fundador — registavam um avanço de 5%, a economia portuguesa encolhia 1,3% e o rendimento por habitante emagrecia ainda mais, quase 2%. A nossa vizinha Espanha cresceu 1,7%. Uma década depois do 25 de Abril, Portugal sofria uma segunda crise económica. Não foi tão dura como a de 1975, quando a economia contraiu mais de 3% e o PIB per capita encolheu quase 7%. No quase meio século de democracia, a recessão de 1984 acabou por ser das mais modestas. Até à data, foi a segunda mais fraca.

A anomalia portuguesa deveu-se aos efeitos da terapia acordada com o Fundo Monetário Internacional (FMI) desde 1983. O Governo de coligação PS-PSD, chefiado por Mário Soares, tinha ao leme das Finanças Ernâni Lopes que conseguiu, em dois anos, reduzir o buraco externo para menos de metade. O défice da balança de transações correntes — então, o alvo da receita do FMI — caiu de 14% do PIB em 1982 para 3,1% dois anos depois. Ficou abaixo da Irlanda (4,7%) e da Grécia (5,8%), os periféricos da época com que mais nos comparávamos. O ministro, cuja imagem ficou célebre pelo cachimbo que fumava, pôde congratular-se, logo em junho de 1984, em uma nova carta de intenções ao Fundo, que “o principal esforço de estabilização em 1983, que consistia no reforço da balança de pagamentos, foi alcançado” e prometia repetir a dose. Mas, logo, naquele verão, reconhecia “um enfraquecimento da atividade económica maior do que o previsto”.