O Governo mantém o seu compromisso com a estratégia de atração de “nómadas digitais” para Portugal. Porém, a discrepância entre o regime fiscal destes últimos e o dos cidadãos portugueses representa “um equilíbrio difícil” que só será resolvido através “da mudança do padrão da economia portuguesa”, disse o ministro das Finanças, Fernando Medina, numa intervenção na conferência Web Summit, em Lisboa.
Em resposta à pergunta do jornalista britânico Duncan Hooper, da CGTN, sobre a justeza da diferença de atitude do fisco entre residentes e estrangeiros, Medina reforçou que “precisamos de ter um regime competitivo” em Portugal, não só em termos de ambiente - como “a capacidade de receber pessoas”, especificou - mas também em termos fiscais.
Mas o ministro reconheceu que “precisamos de alcançar um equilíbrio para que as pessoas não pensem que estamos a penalizar quem viveu aqui toda a sua vida. E criar este equilíbrio, digo-lhe muito francamente, não é fácil”.
“Conhecendo muito bem a economia e a sociedade portuguesa", disse Medina, “precisamos de mudar o padrão da economia” nacional, criando ao mesmo tempo “oportunidades para a nova geração” de residentes e atraindo profissionais “qualificados que querem fazer as suas vidas aqui”.
“Reconheço que não é um equilíbrio estável, é um equilíbrio que temos de continuar a construir”, mas “estou convencido de que as soluções que temos no momento são as que precisamos”, acrescentou.
“Não queremos replicar Silicon Valley” em Portugal
Medina descreveu os regimes de atração de profissionais estrangeiros qualificados, como o estatuto de residentes não-habituais e o novo visto para nómadas digitais, como parte de uma “aberta e simplificada política de imigração”, algo “completamente oposto ao que estamos a ver em vários países do mundo”.
O ministro das Finanças
aludiu a medidas já previstas no Orçamento do Estado para 2022, e para os quais o Governo tem autorização legislativa. Como a relacionada com a
patent box, que aumenta o limite de não-tributação nos rendimentos de propriedade industrial; e às mudanças no regime de
stock options, um regime que “não era particularmente competitivo” mas que vai sofrer mudanças este ano de forma a que paguem imposto “a uma taxa baixa” apenas quando forem exercidas.
Mencionou igualmente a atualização do Sifide, que reembolsa o investimento em investigação e desenvolvimento, um regime que vai ser "reforçado".
O objetivo não é “replicar Silicon Valley” em Portugal, porque “Portugal tem uma posição muito definida no ecossistema global”, acrescentou Medina.
Mais importantes do que as medidas fiscais para as empresas, “são as medidas que fazem com que as pessoas se sintam confortáveis numa sociedade que está disposta a receber estrangeiros como a portuguesa”, segundo o ministro.
E Fernando Medina não teme à partida saídas de empresas criadas cá para outras paragens, como aconteceu com vários unicórnios portugueses. “Se uma empresa tem de ir para Silicon Valley pelo ambiente financeiro lá ser mais fácil, perfeito”, disse Medina.
Da TAP aos criptoativos
O interlocutor de Medina, a dada altura, queixou-se de ter recebido um email da TAP a reconhecer que a experiência de viagem poderia não ser a melhor dados os constrangimentos com que a companhia aérea portuguesa lida desde que foi nacionalizada durante o primeiro ano da pandemia da covid-19.
Medina respondeu com o aeroporto. “Tenho de reconhecer que precisamos, obviamente, de melhores infraestruturas e espero que o meu Governo tome essa decisão”, disse o ministro. Perante a insistência do jornalista, o governante já não se pôde esquivar a comentar a situação atual da transportadora aérea, sob a tutela do ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos.
“Vamos criar um calendário que seja mais benéfico para o valor da empresa e para o interesse público”, avançou, mas notou que é objetivo do Governo “criar uma sinergia ou integrar a TAP num grupo maior”.
Sobre a reputação portuguesa de ser um “criptoparaíso”, Medina disse que o Executivo “ainda está a aprender” e que “não quer tomar decisões rápidas e erradas que podem ser prejudiciais” para esta indústria nascente.
A decisão de criar um enquadramento fiscal que põe fim a uma excepção europeia que, por omissão, isentava de imposto as mais-valias obtidas nas transações deste tipo de ativos digitais, visou “criar um sistema fiscal eficaz mas competitivo”, de acordo com Fernando Medina.
À comunidade de investidores em ativos digitais, o ministro reforçou que “estamos sempre alinhados com as melhores práticas e iremos evitar decisões rápidas que possam matar a indústria em Portugal (…) dando passos firmes no que é preciso fazer". O objetivo é que “percebam que há previsibilidade”, acrescentou.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: pcgarcia@expresso.impresa.pt
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes