Berlim queria que o fundo de resgate da Zona Euro ficasse sob a direção do luxemburguês Pierre Gramegna e vetou João Leão. Itália e Espanha estiveram com Portugal no braço-de-ferro que fez cair os dois candidatos
O ex-ministro das Finanças, João Leão, não conseguiu convencer. Esteve perto, mas faltou o apoio determinante da Alemanha que é o principal "acionista" do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) - de que fazem parte os 19 países da moeda única europeia. Berlim é a única capital com poder de veto, de que fez uso em todo um processo que culminou num braço-de-ferro entre norte e sul.
De nada serviram os contactos entre António Costa e o chanceler alemão, Olaf Scholz - ambos da família socialista europeia -, porque quem controlou o processo de seleção do novo diretor-executivo do MEE foi Christian Lindner, ministro das Finanças e líder dos liberais alemães (FDP). Esteve empenhado em dar a liderança do fundo de resgate da zona euro a um outro liberal, o luxemburguês Pierre Gramegna.
Só que, da mesma forma que a Alemanha bloqueou sistematicamente e até ao fim o nome de João Leão, também Espanha e Itália - que até julho também tinha o próprio candidato - rejeitaram sempre o luxemburguês e não houve forma de ultrapassar o impasse. Madrid e Roma, individualmente, não tinham poder de veto, mas em conjunto ou com Portugal foram o suficiente para contrariar Berlim.
Na última reunião do Eurogrupo, em Praga, no início do mês, o presidente do Eurogrupo chegou a achar que seria possível a eleição de um dos dois. Mas ninguém cedeu e o resultado final foi uma dupla desistência, anunciada esta terça-feira. As candidaturas de Portugal e Luxemburgo aniquilaram-se uma à outra.
Gramegna e Leão conhecem-se bem. Foram ambos ministros das Finanças e cruzaram-se nas reuniões do Eurogrupo, de que o luxemburguês tentou também ser presidente, perdendo duas vezes: uma para Mário Centeno (na altura a Alemanha esteve com Portugal) e outra para o atual presidente Paschal Donohoe.
João Leão chegou a ser visto com favorito. Em maio, quando começou a corrida, Fernando Medina mostrava-se confiante numa vitória portuguesa e em julho, na segunda votação, Leão chegou a ser o mais votado. Só que não basta uma maioria. É preciso garantir 80% dos votos, o que só se consegue se a Alemanha deixar, quer seja votando favoravelmente, quer abstendo-se.
Foi o que fez França. Paris votou a favor de João Leão, mas absteve-se no caso de Gramegna. Porém, de nada serviu. O processo arrastou-se, foi tornando-se cada vez mais difícil, levando o ministro português das Finanças, Fernando Medina, a mostrar-se cada vez menos otimista e mais cauteloso nas declarações. Antes do verão, garantia que Portugal seria sempre "parte da solução" e não do problema e no início de setembro admitia já a dificuldade da eleição.
Ao que o Expresso apurou, não terá ajudado o facto de Portugal ser um dos cinco países de que o ESM - através do Fundo Europeu de Estabilização Financeira - é credor. Durante o resgate, em 2011, Portugal recebeu 26 mil milhões de assistência financeira do FEEF, tendo até agora reembolsado dois mil milhões de euros.
Duas semanas para encontrar um diretor
"Continuarei os meus esforços e consultas para apresentar um candidato para o papel de director executivo do ESM", afirmou já esta terça-feira Paschal Donohoe. O irlandês não foi bem sucedido na condução do processo. Agora tem de encontrar uma alternativa até dia 8 de outubro, quando termina o mandato (não renovável) do atual diretor executivo, o alemão Klaus Regling.
Ao que o Expresso apurou, não é ainda claro quem poderá vir a reunir a vontade dos grandes países. Mas Donohoe tentará encontrar alguém que passe na vontade de todos e, desta vez, tentará evitar várias candidaturas. O objetivo será o de sondar quem poderá ser o possível vencedor e levar esse nome a votação do conselho de governadores do MEE, que, no caso, são os 19 ministros das Finanças do euro. De preferência, tudo deverá estar resolvido na próxima reunião do Eurogrupo, a 3 de outubro, no Luxemburgo.
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