“Mais linhas de crédito significa mais dívidas para os agricultores. Precisamos de ajudas a fundo perdido já, senão as sementes não vão para a terra e não há comida para ninguém”, diz Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), em reação às medidas de apoio ao sector anunciadas esta segunda-feira pelo Governo.
O mesmo responsável acrescenta que “dá a sensação de que o Governo ainda não percebeu as especificidades da agricultura. Falar de linhas de crédito numa altura em que os fatores de produção e os custos da energia aumentam a um ritmo quase diário - e que isso está a estrangular o sector –, é não fazer a mínima ideia do que é a gestão do dia a dia de uma propriedade agrícola. Os agricultores não podem suportar este tipo de situação”.
Medidas "claramente insificientes"
Pedro Santos, dirigente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), está em linha com aquelas declarações e explica que a situação é muito grave e que este pacote de medidas é “claramente insuficiente”. Aliás – sublinha – a anunciada antecipação de 500 milhões de euros de ajudas é uma forma de iludir a opinião pública pois, se utilizam agora este dinheiro vão deixar um problema em aberto lá mais à frente no tempo, quando o nós precisamos agora é de medidas realmente extraordinárias. Isto é um número de mero ilusionismo político”.
Entre as medidas extraordinárias que seriam necessárias, segundo este responsável da CNA, desçam-se, por exemplo a “imposição de um teto máximo nos preços dos combustíveis. O Governo só não faz isso se não quiser. Vivemos tempos extraordinários – com uma seca a somar-se aos efeitos de uma guerra – para os quais precisamos de medidas extraordinárias”.
O fim "mais que provável" de muitas explorações agríclas
O responsável da CNA diz que os agricultores não podem dar-se ao luxo de ficar à espera de autorizações de Bruxelas para o Governo mexer nos impostos sobre os combustíveis ou para qualquer outra alteração. “Quando, por exemplo, os agricultores não têm alimentação para os animais e começam a vender aqueles que são reprodutores isso só significa uma coisa: o fim mais que provável das suas explorações e a mudança de atividade tão rápido quanto possível”.
No que respeita à questão da eventual escassez de cereais, Eduardo Oliveira e Sousa defende que a União Europeia terá de se entender para fazer compras em bloco, tal como fez com as vacinas no auge da pandemia.
Medidas sugeridas pela CAP
O presidente da CAP relembra as medidas que esta confederação já apresentou a Bruxelas e que, no seu entendimento o Governo deve apoiar:
- Reconhecimento, por parte da Comissão Europeia, da situação de catástrofe em que Portugal se encontra, para que seja possível tomar medidas de caráter excecional no âmbito da Política Agrícola Comum;
- De entre essas medidas excecionais, devem ser autorizados pagamentos diretos aos agricultores, para garantir que a produção não para;
- Derrogação para semear e pastorear a áreas de pousio, áreas que por exigência da PAC não podem ser utilizadas – a Alemanha, neste momento, já recuperou para a produção de cerais cerca de um milhão de hectares de terras em pousio, para garantir o aumento do seu autoabastecimento
- Prever um apoio direto aos agricultores para alimentação animal – este apoio é determinante para que haja dinheiro para comprar rações, pois com o recente aumento de preços tornou-se financeiramente incomportável pagar a base da alimentação animal;
- Diminuição do período de retenção dos animais na exploração;
- Intervir no mercado através de compras centralizadas de matérias primas essenciais à produção (fertilizantes, por exemplo), mas também de cereais que estão na base da alimentação animal;
- Flexibilizar as regras para a importação de cereais oriundos de mercados terceiros;
- Permitir a alimentação de animais em regime de produção biológico com alimentos não biológicos – uma vez reconhecida a situação de catástrofe em Portugal, deverão ser aplicadas as derrogações;
- Adiantamento das ajudas da PAC aos agricultores;
- Medidas de investimento mais céleres e menos burocráticas – tais medidas podem e devem ser trabalhadas por forma a serem integradas no Plano de Recuperação e Resiliência para o setor Agro;
- Aumento do valor da regra de minimis, para permitir que os agricultores tenham acesso a linhas de crédito de longo prazo bonificadas para reporem a tesouraria
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