Habitação. Porque falha a renda vitalícia?

Num país com mais de 700 mil contratos de arrendamento, só 56 famílias recorreram aos contratos vitalícios
Num país com mais de 700 mil contratos de arrendamento, só 56 famílias recorreram aos contratos vitalícios
Jornalista
É um modelo híbrido que se pretende alternativo entre a compra de habitação e o arrendamento criado ao abrigo do Direito Real de Habitação Duradoura (DHD), desde janeiro de 2020. O inquilino entrega ao proprietário uma caução e passa a pagar-lhe um valor mensal ao longo do contrato. A caução é de 10% a 20% do valor mediano do valor de venda de mercado do imóvel, apurado pelo INE. A rescisão terá que ser feita nos primeiros dez anos para a caução ser devolvida. A partir do 11º ano, o proprietário começa a deduzir 5% anualmente até ao 30º ano do contrato. O inquilino tem ainda a seu cargo as obras de conservação corrente e o pagamento de IMI e, em caso de morte, o contrato cessa não sendo passível de transmissão.
Para os inquilinos, é um mau negócio e não interessa à generalidade das famílias. “Só pessoas com elevados rendimentos é que podem recorrer a este tipo de contrato”, diz Romão Lavadinho. O presidente da Associação de Inquilinos Lisbonense (AIL) adianta que se a casa custar €200 mil, o valor da caução é de pelo menos €20 mil, mais a renda, obras e impostos. “Depois de 10 anos, o inquilino já não recebe o valor inicial. É um mau negócio”, acrescenta. Considera preferível comprar a casa ao banco, pois ao fim de 30 anos, a casa é do próprio.
Tal como os inquilinos, os proprietários também criticaram desde o início esta medida da Nova Geração de Políticas de Habitação do Governo. Consideram-na mais uma disposição avulsa e sem grandes resultados. “Não interessa aos senhorios, pois, na prática, ficam desprovidos da propriedade sem o valor real de uma venda. Acabam por prescindir do imóvel de forma eterna ou vitalícia”, afirma Iolanda Gávea. Para a vice-presidente da Associação Lisbonense de Proprietários, o contrato vitalício é uma “curiosidade jurídica”, pois existem no ordenamento legal outras figuras que preenchem o direito real à habitação.
A instabilidade legislativa em matéria de arrendamento não agrada nem a inquilinos nem a proprietários. Alvo de sucessivas revisões, ao sabor do momento político, a revogação do Novo Regime de Arrendamento Urbano surge na ordem do dia. “Criar legislação que garanta ao inquilino a continuidade do contrato e ao proprietário o recebimento do valor acordado”, diz Romão Lavadinho.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: hmartins@expresso.impresa.pt