Economia

Habitação. Porque falha a renda vitalícia?

Habitação. Porque falha a renda vitalícia?
José Fernandes

Num país com mais de 700 mil contratos de arrendamento, só 56 famílias recorreram aos contratos vitalícios

1. O que é o contrato de renda vitalícia?

É um modelo híbrido que se pretende alternativo entre a compra de habitação e o arrendamento criado ao abrigo do Direito Real de Habitação Duradoura (DHD), desde janeiro de 2020. O inquilino entrega ao proprietário uma caução e passa a pagar-lhe um valor mensal ao longo do contrato. A caução é de 10% a 20% do valor mediano do valor de venda de mercado do imóvel, apurado pelo INE. A rescisão terá que ser feita nos primeiros dez anos para a caução ser devolvida. A partir do 11º ano, o proprietário começa a deduzir 5% anualmente até ao 30º ano do contrato. O inquilino tem ainda a seu cargo as obras de conservação corrente e o pagamento de IMI e, em caso de morte, o contrato cessa não sendo passível de transmissão.

2. Porque não interessa aos inquilinos?

Para os inquilinos, é um mau negócio e não interessa à generalidade das famílias. “Só pessoas com elevados rendimentos é que podem recorrer a este tipo de contrato”, diz Romão Lavadinho. O presidente da Associação de Inquilinos Lisbonense (AIL) adianta que se a casa custar €200 mil, o valor da caução é de pelo menos €20 mil, mais a renda, obras e impostos. “Depois de 10 anos, o inquilino já não recebe o valor inicial. É um mau negócio”, acrescenta. Considera preferível comprar a casa ao banco, pois ao fim de 30 anos, a casa é do próprio.

3. Porque não interessa aos senhorios?

Tal como os inquilinos, os proprietários também criticaram desde o início esta medida da Nova Geração de Políticas de Habitação do Governo. Consideram-na mais uma disposição avulsa e sem grandes resultados. “Não interessa aos senhorios, pois, na prática, ficam desprovidos da propriedade sem o valor real de uma venda. Acabam por prescindir do imóvel de forma eterna ou vitalícia”, afirma Iolanda Gávea. Para a vice-presidente da Associação Lisbonense de Proprietários, o contrato vitalício é uma “curiosidade jurídica”, pois existem no ordenamento legal outras figuras que preenchem o direito real à habitação.

4. O que pode ser feito?

A instabilidade legislativa em matéria de arrendamento não agrada nem a inquilinos nem a proprietários. Alvo de sucessivas revisões, ao sabor do momento político, a revogação do Novo Regime de Arrendamento Urbano surge na ordem do dia. “Criar legislação que garanta ao inquilino a continuidade do contrato e ao proprietário o recebimento do valor acordado”, diz Romão Lavadinho.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: hmartins@expresso.impresa.pt

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