Bruxelas colocou entrave à construção de nova sede do Novo Banco nas Amoreiras
Terreno que pertence ao Novo Banco situa-se nas Amoreiras
António Pedro ferreira
Auditoria especial da Deloitte revela que a administração do Novo Banco queria tornar o terreno como “central” para o negócio, para construir a sede, mas a Comissão Europeia não autorizou
A Comissão Europeia colocou um entrave a que a nova sede do Novo Banco fosse construída no terreno da Artilharia 1, perto das Amoreiras, em Lisboa. A revelação é feita no relatório da auditoria especial da Deloitte, segundo a versão que foi enviada ao Parlamento já expurgada de factos confidenciais, a que o Expresso teve acesso.
Em causa está o fundo de investimento imobiliário fechado (FIIP) das Amoreiras, de que o Novo Banco é o principal detentor. Além do projeto de investimento para este terreno, o banco liderado por António Ramalho ponderou ali juntar todos os escritórios distribuídos pela capital.
“Durante o ano de 2019, o banco solicitou a reclassificação de parte dos terrenos detidos pelo FIIP Amoreiras de ‘não core’ para ‘core’ no contexto dos compromissos assumidos pelo Estado português com a Comissão Europeia”, descreve o relatório da auditoria especial da Deloitte, que se debruça sobre o ano de 2019, e que foi realizada devido à injeção de dinheiros públicos no banco no ano seguinte.
Ou seja, em 2019, o Novo Banco pretendia autorização de Bruxelas para que parte daquele ativo fosse considerado central para o seu negócio e não um ativo de que tivesse de se desfazer. “Esta reclassificação tinha como objetivo a construção da nova sede do banco”, explica a auditoria. Ora, a Comissão Europeia negou a solicitação a 19 de novembro.
O Novo Banco colocou €21,5 milhões no fundo Amoreiras em 2016 e 2017
Dias antes, contudo, o Novo Banco já tinha investido mais dinheiro no fundo, concretizando um aumento de capital de 36 milhões de euros no fundo. “Este aumento viria a concretizar-se em dezembro de 2019, tendo como objetivo financiar o plano de execução da estratégia de desenvolvimento urbanístico de um lote de terreno em Lisboa”, revela a auditoria, como aliás o Expresso tinha noticiado. “Devido ao atraso no licenciamento do projeto, só uma parcela reduzida dos fundos obtidos através do aumento de capital havia sido utilizada no final de 2020”, continua o relatório.
Segundo descreve a Deloitte, o Novo Banco acredita que este aumento de capital reflete um investimento no terreno e não propriamente uma “nova aquisição”, que careceria da autorização devido às limitações do banco impostas pela venda e compromisso de capitalização pelo Fundo de Resolução, em 2017.
Este terreno está avaliado por um custo de aquisição de 248 milhões (foi parar à esfera do Novo Banco devido a um incumprimento de uma sociedade do empresário Vasco Pereira Coutinho), ainda que as certificações legais do próprio fundo imobiliário apontem para incertezas sobre a avaliação. Ainda no ano passado, a Câmara Municipal de Lisboa exigiu explicações ao banco para as alterações que pretendia fazer ao terreno.
Terreno nas Amoreiras estava avaliado em €159 milhões em 2019
Ainda sobre esta operação, a Deloitte concluiu “não haver evidência na redação das atas do conselho geral e de supervisão da prestação de consentimento prévio para o processo de aumento de capital a realizar num fundo de investimento”, o das Amoreiras. De qualquer forma, há provas de que o andamento do processo foi sendo referido a este órgão de acompanhamento, liderado por Byron Haynes, do trabalho feito pela gestão executiva, de António Ramalho, de acordo com o mesmo documento.
Há dias foi noticiado pelo Eco que o Novo Banco desistiu de construir a sua sede no terreno da Artilharia I, estando agora a estudar a opção de seguir para o Tagus Park, em Oeiras.
António Ramalho, presidente do Novo Banco
TIAGO MIRANDA
Auditoria vê perdas sobretudo do BES
A auditoria da Deloitte, cujo trabalho de campo foi iniciado em novembro de 2020, tendo sido concluído no fim de março deste ano, faz uma avaliação do exercício de 2019. Está dividido em três parcelas: gestão de créditos; investimentos e desinvestimentos; imóveis e outros títulos. No caos das Amoreiras, o que está em causa é um investimento.
O ano em análise é 2019, quando se concretizaram as operações de vendas de grandes carteiras de ativos: Nata II, de crédito malparado; Sertorius, de imóveis; Albatros, de crédito e imóveis da sucursal em Espanha. Além disso, foi o ano em que ficou fechada a alienação da seguradora GNB Vida. Com as perdas registadas nos ativos protegidos pelo mecanismo de capital contingente, o Novo Banco solicitou, por conta de 2019, 1.037 milhões de euros ao Fundo de Resolução (corrigido depois para 1.035 milhões, para descontar a atribuição de bónus à gestão). Até 2019, o dinheiro que saiu do Fundo de Resolução para o Novo Banco ascendeu a 2.978 milhões.
“Uma parte muito substancial das perdas registadas em 2019 resulta de ativos originados maioritariamente em período anterior à constituição do Novo Banco e que já apresentavam perdas ou desvalorizações relevantes de anos anteriores”, concluiu a auditoria.