Imagine que o Terreiro do Paço, em Lisboa, ficava submerso, ou que num dia de maré alta, a Ria de Aveiro ou a Ria de Faro ficavam inundadas. Parecem cenários exagerados ou dramáticos mas, infelizmente, não são. São, sim, um dos impactos mais prováveis das alterações climáticas em Portugal, tal como a possibilidade da Florida, nos EUA, ficar debaixo de água, ou os glaciares da Gronelândia derreterem. Mas tudo isto são impactos a longo prazo. Neste momento, há já vários que são bem mais visíveis. Por exemplo, o facto de a praia do Portinho da Arrábida ter perdido 60% do seu areal nos últimos 50 anos ou verificarem-se temperaturas acima dos 20 graus em meados de outubro (como este domingo). Ou ainda, de uma forma mais geral, a existência de longos períodos de seca, vagas de calor, ou tempestades e tornados mais fortes.
Para os cientistas e especialistas que estudam estes fenómenos estas são as consequências mais evidentes, não só em Portugal, mas no mundo. É que, no que respeita às alterações climáticas, há duas certezas. Uma delas é que o aumento das emissões dos gases com efeito de estufa, como o carbono (carros ou centrais a carvão) ou o metano (agricultura ou vacas), aquecem a temperatura da atmosfera o que altera o clima. A outra é de que é muito difícil dizer que um fenómeno específico foi provocado pelas alterações climáticas.
“A pior característica das alterações climáticas é não se poder atribuir impactos de forma directa”, diz ao Expresso Pedro Barata, CEO da Get2C, uma empresa de consultoria na área das emissões de carbono. Por exemplo, continua, os incêndios que têm acontecido em Portugal nos últimos anos não podem ser directamente atribuídos às alterações climáticas, porque há casos de fogo posto e porque ainda existe um grande desordenamento do território. Contudo, explica Pedro Miranda, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), o facto de o fogo de Pedrógão Grande, em junho de 2017, ter alastrado tão depressa deveu-se a um evento chamado de ‘downburst’. “É uma corrente de vento que desce a muita velocidade e que faz o fogo andar muito depressa. Também aconteceu em 2011 no Algarve”, explica.
Independentemente destes fenómenos serem ou não consequências directas das alterações climáticas, o objetivo de vários governos a nível mundial é reduzir o mais possível estes fenómenos extraordinários e as consequências que têm no ecossistema e na sociedade, como a fome, as migrações ou a falta de habitação digna. Para atingir esse objetivo, é necessário atuar nas emissões de gases com efeitos de estufa, principalmente o CO2. “Emissões zero é uma utopia. Elas vão existir sempre. O que se pretende é a neutralidade carbónica, ou seja, encontrar formas de compensar as emissões com a captura e armazenamento de CO2”, explica Carlos Fulgêncio, coordenador em Portugal do The Climate Reality Project, fundado por Al Gore. Uma das formas de neutralizar as emissões é através do reforço de produção através de energias limpas, como o vento ou o sol, mas “a melhor tecnologia para isto são as árvores”, repara. Aliado a isto é também necessária “uma mudança estrutural no modo de vida”, acrescenta. E a covid-19 pode ajudar, principalmente na mobilidade, diz ainda.
Estes são alguns dos temas que serão aprofundados já amanhã, 20 de outubro, no segundo debate digital do projeto “50 para 2050”, uma iniciativa do Expresso e da BP. O tema para este encontro é “Os grandes impactos das alterações climáticas em Portugal” e, tal como o anterior, poderá ser visto no Facebook do Expresso a partir das 11h00. Além de Pedro Barata, Pedro Miranda e Carlos Fulgêncio, o debate contará ainda com a presença de outros oradores, entre eles, Tiago Martins de Oliveira, presidente da Agência de Gestão Integrada dos Fogos Florestais.
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