Frédéric Frère, CEO da Travelstore
"Assistimos a uma paragem total das nossas vendas"
Como enfrentou estes meses de incerteza?
O principal desafio para qualquer empresa é de lidar com falta de visibilidade a muito curto prazo. Já nos habituámos desde há muitos anos a evoluir em contextos bastante voláteis, que tornavam cada vez mais complexo realizarmos previsões e estratégias de longo prazo, mas num contexto como o atual em que não sabemos o que nos espera no proximo mês, aí não, nada nos tinha preparado para tal dificuldade. Somos assim obrigados a “navegar à vista”, recorrendo a uma analogia marítima já muito usada, e isso contraria todas as boas práticas de gestão aplicadas nas empresas de sucesso. Outro desafio relevante é o da liderança porque é nas crises, nas tempestades, que as capacidades dos lideres pode fazer verdadeiramente diferença e ser determinante para o futuro da empresa. Refiro isto numa perspetiva positiva porque, como todos sabemos, as crises são geradoras de oportunidades - a crise financeira é um bom exemplo disso em relação a Portugal - e estou convicto de que temos certamente um desafio interessante à nossa frente, que é o de transformar uma enorme ameaça numa possível oportunidade.
Que medidas é que foram tomadas para fazer face às dificuldades?
Vou responder no plural porque a única forma de se lidar com esta crise é através do trabalho de uma equipa muito coesa e determinada em vencer. Aproveito, aliás, para realçar um dos aspetos verdadeiramente positivos que tenho encontrado nesta crise, que é o fantástico espirito de união e entreajuda que tenho sentido nas pessoas em geral e certamente na nossa equipa, nos nossos colaboradores. Desde o primeiro dia da crise, julgo que temos mantido uma postura extremamente proativa e isto, apesar de termos assistido, praticamente de um dia para outro, a uma paragem total das nossas vendas. O nosso negócio assenta em três capacidades chave que são a gestão de viagens de negócios, a gestão de eventos corporativos, e a realização de viagens de lazer à medida, cada uma executada no âmbito de unidades de negócios com elevada autonomia. Temos assim desenvolvido inúmeras iniciativas que dizem respeito à segurança dos nossos colaboradores e dos nossos clientes, à preservação da estabilidade económica da empresa, à formação dos colaboradores, à assistência e apoio aos clientes - que foi particularmente intensa durante as duas primeiras semanas da crise, em que não descansámos noite e dia para repatriar a totalidade dos viajantes para os seus destinos de escolha -, à comunicação com os clientes através da organização de webinars regulares com a participação de conhecidas personalidades da industria e, por fim, gostaria de destacar uma iniciativa de responsabilidade social que foi muito bem acolhida tanto pelos parceiros de negócio que contribuíram como pelas pessoas a quem se destinou que foi o “Thank You Voucher”. É uma iniciativa que teve por objetivo contribuirmos modestamente ao reconhecimento e agradecimento aos profissionais de saúde.
Já se sente retoma na marcação de viagens?
Atualmente começamos a assistir aos primeiros sinais de retoma por parte dos nossos clientes embora ainda muito tímidos. Algumas empresas estão ansiosas de poder dispor de visibilidade relativamente a quando, e para onde vão poder recomeçar a viajar, mas de momento as informações ainda são limitadas. Dito isto, nós acreditamos que, pelo menos até ao final deste ano, as empresas irão viajar pouco, não tanto devido ao risco sanitário - porque os aeroportos e as companhias aéreas estão a implementar várias medidas que irão tornar o risco quase nulo desde que as pessoas apliquem os cuidados mínimos exigidos - mas mais por motivos económicos, aproveitando para conter custos. Durante uns tempos iremos assistir à utilização intensa das plataformas de vídeoconferência mas, com o tempo, tudo deverá voltar à normalidade porque chega um momento em que as pessoas querem “saltar do ecrã para fora” e fechar negócios. Outro aspeto positivo que merece ser realçado é a excelente imagem que Portugal está a consolidar junto dos mercados internacionais e que poderá reforçar ainda mais a competitividade do país a nível do turismo de negócios, e da realização de conferências e eventos. As áreas de eventos do nosso grupo estão assim a registar um numero crescente de pedidos de orçamento para o final do ano e, sobretudo, para o próximo ano por parte de clientes internacionais. O teletrabalho e o distanciamento físico vão cada vez mais motivar as empresas a juntar os seus colaboradores em dadas alturas, o que vai favorecer a indústria dos eventos, sejam domésticos ou, com o tempo, internacionais.
Nuno Aleixo, diretor-geral da Nortravel
"Não cancele as suas férias, adie-as"
A transição para o digital vai-se acelerar com a pandemia?
As agências de viagens, também no digital, foram das atividades que desde o inicio do século sentiram o impacto da tendência global por parte dos consumidores de reservarem em canais digitais serviços turísticos. Para nós é mais um canal de distribuição do nosso produto a par das redes de agências de viagens físicas existentes. Ao longo dos últimos anos, todo o sector transformou-se, adaptou-se e atualiza-se em permanência às novas ferramentas que são colocadas ao nosso dispor. Nesta fase de pandemia, o único canal de comunicação aberto com os nossos viajantes foi o digital e fruto desta experiência ´forçada´ conseguimos ajustar mais alguns procedimentos que faziamos presencialmente, e sentimos que o nosso cliente ficou tranquilo com estas mudanças. Esta fase permite-nos também cortar tempo na implementação de novos sistemas de divulgação e venda do nosso grupo, quer seja nos operadores turísticos, quer seja na nossa rede de agências de viagens. Continuará a existir uma coabitação no mercado entre os balcões de agências de viagens e as “OTA’s” (Online Travel Agencies) e existem várias empresas, nacionais e internacionais. Estamos esperançados no futuro da atividade turística e podemos afirmar que todos nós estamos muito mais bem preparados, fruto do “boom” turístico dos últimos anos e do reconhecimento global da nossa capacidade profissional.
Como é que se lidou com esta fase dentro da empresa?
Nesta fase o mais importante é passar confiança aos consumidores para que voltem a viajar em segurança. Para isso toda a sociedade tem que seguir à risca as orientações da DGS e garantirmos que quem nos visita também as segue. A iniciativa do Turismo de Portugal do selo “Clean & Safe” é um excelente instrumento que toda a cadeia de valor turístico deve aplicar, a começar nas agências de viagens, passando pelos alojamentos, restauração e todas as atividades ligadas ao sector. São iniciativas como esta que fazem com que os viajantes voltem a ganhar confiança para viajar. Todos os nossos colaboradores estão em constante atualização sobre a evolução da pandemia, em todos os destinos para onde operamos - Portugal e estrangeiro - para que possamos dar a informação essencial aos viajantes. O nosso seguro de viagem foi adaptado a esta nova realidade de pandemia, ajustando-se às necessidades atuais de saúde.
Os desafios foram evoluíndo?
O principal desafio para todos nós, enquanto sociedade, é salvaguardar a saúde publica, que está altamente abalada com esta pandemia. Estamos perante a maior crise da nossas vidas e o sector do turismo foi o primeiro a ressentir-se e seguramente será das ultimas atividades económicas a recuperar. No PIB português, o turismo tem um peso muito significativo e foi o grande motor da economia nos últimos anos. No inicio desta pandemia sentimos o impacto no cancelamento de todas as viagens para a Páscoa, que é um dos períodos de maior movimento nas agencias de viagens. Também muito difícil foram os repatriamentos dos vários turistas portugueses espalhados pelo mundo e podemos afirmar que foi um desafio superado, com a colaboração de todas as entidades envolvidas. De seguida, também as reservas do verão começaram a sofrer vários cancelamentos, com os clientes a solicitarem o reembolso dos valores adiantados para suas férias. Precisávamos de tempo para dar total garantia aos consumidores que o seu dinheiro não estava em risco. O governo legislou no final de abril sobre esta matéria, permitindo transformar os depósitos em vouchers com validade até 31 de dezembro de 2021, além de os clientes poderem sempre recorrer ao Fundo de Garantia de Viagens e Turismo, tutelado pelo Turismo de Portugal, caso alguma agência de viagens não honre os seus compromissos. Conseguimos assim passar uma grande confiança e um lema aos viajantes que reservaram nas agências de viagens: não cancele as suas férias, adie-as. Outro grande desafio que temos atualmente é se os consumidores ainda terão confiança suficiente para gozarem férias fora da sua residência habitual no período de verão que se avizinha. Os operadores turísticos e agências de viagens, desde que começou o desconfinamento gradual em Portugal, têm vindo adaptar a sua oferta para poder responder às novas exigências dos viajantes. Outro desafio que temos vindo a superar é a readaptação de todos os colaboradores, através de constantes formações online, a esta nova realidade de trabalho.