Economia

Medicamento para Parkinson da Bial tem luz verde das autoridades norte-americanas

Medicamento para Parkinson da Bial tem luz verde das autoridades norte-americanas
Tiago Miranda

Trata-se do segundo fármaco ‘made in Portugal’ e já tem aprovação da autoridade do medicamento norte-americana. Deve começar a ser comercializado neste mercado até ao final do ano

A Bial soma mais uma vitória. O medicamento Ongentys (Opicapona), para a doença de Parkinson, desenvolvido pelo laboratório nacional, foi aprovado pelo regulador do mercado farmacêutico norte-americano Food and Drug Administration (FDA) na passada sexta-feira. Com esta luz verde, o fármaco pode iniciar a sua comercialização nos EUA, o que deverá acontecer até ao final do ano.

À semelhança do que já aconteceu com o primeiro medicamento ‘made in Portugal’, o anti-epilético Zebinix também da Bial, o Ongentys também vai entrar neste mercado através de uma parceria. Em fevereiro de 2017, a companhia portuguesa celebrou com a farmacêutica Neurocrine Biosciences, um contrato de licenciamento exclusivo para o desenvolvimento e comercialização em território norte-americano da Opicapona. A Neurocrine perspetiva o lançamento da Opicapona nos EUA até ao final do ano, adianta a Bial. “O lançamento do medicamento no mercado norte-americano depende de estarem reunidas as condições e depende do nosso parceiro”, adiantou António Portela, presidente executivo (CEO) do laboratório, em conferência de imprensa via chamada de vídeo.

“É um marco importantíssimo para a Bial. Temos um segundo medicamento nos EUA”, sublinhou o CEO. Os EUA representam já o primeiro mercado em vendas de farmácia para Bial e, neste país, existem cerca de um milhão de doentes de Parkinson e mercado dos fármacos para esta patologia soma cerca de 800 milhões de dólares.

Aprovação europeia em 2016

Sobre as perspetivas de vendas do Ongentys nos EUA, António Portela prefere “não avançar cenários, até porque a Nerocrine é cotada em Bolsa”, mas refere que até ao final de 2020 esta nova entrada no maior mercado farmacêutico do mundo poderá render cerca de 5 milhões de euros em vendas à Bial.

Trata-se do segundo fármaco de raiz nacional, já tinha sido aprovado pela autoridade regulamentar europeia em 2016 e começou a ser vendido na Europa entre finais desse ano e o início de 2017. Está disponível no Reino Unido, Alemanha, Espanha, Itália e Portugal, e a Bial acredita que, entre 2020 e 2021, possa vir a ser introduzido em outros países europeus (Suíça, Áustria, Dinamarca, Finlândia, Noruega e Suécia), bem como no Japão e Coreia do Sul. No Japão a entrada ainda depende da realização de mais ensaios na população japonesa, para revalidação dos resultados, por imposição das autoridades locais. “É um mercado que funciona de uma forma diferente”, faz notar António Portela.

Sobre a demora da aprovação pela FDA (Food and Drug Administration), o CEO explica que o pedido só foi submetido em março de 2018. Além disso, foram necessários mais dois “pequenos ensaios, já que o dossiê [para a autorização de introdução no mercado] era muito robusto com cerca de mil doentes tratados” e, mesmo assim, o processo de aprovação decorreu dentro dos “tempos normais”. “Apesar da pandemia de covid-19, a FDA cumpriu os prazos”, faz notar.

Se nos EUA a Bial tem optado por jogar pelo seguro com o conforto de parceiros locais, habituados a lidar com a FDA, na Europa, a farmacêutica portuguesa optou por não licenciar o Ongentys. Ou seja, é a Bial que comercializa em exclusivo o medicamento no espaço europeu e já trata 32 mil doentes neste continente, onde se estima que a doença de Parkinson afete cerca 1,2 milhões de pessoas (em Portugal são 50 mil).

Aposta em novas moléculas

A Bial tem centrado a sua atividade na Investigação e Desenvolvimento (I&D) de novos medicamentos, sobretudo nas neurociências, numa aposta que já deu dois frutos. Até hoje é a única farmacêutica portuguesa com produtos de investigação própria: um medicamento para a epilepsia e este antiparkinsoniano. Em 2009, foi licenciado o primeiro medicamento de patente portuguesa, o Zebinix, para a epilepsia e a Bial cumpriu, assim, o plano traçado em finais da década de 80, de aposta na inovação e de investigação de novos medicamentos. Em 2016, já com António Portela ao leme da companhia (substituiu no cargo o pai, Luís Portela), repetiu-se o feito, com a chegada ao mercado do Ongentys, para a doença de Parkinson.

Nos últimos 10 anos, o peso das vendas nos mercados internacionais tem sido crescente, representando hoje cerca de 75% do volume de negócios da empresa que em 2019 ultrapassou os 300 milhões de euros, dos quais 60% dizem respeito ao Zebinix e Ongentys.

Sobre este desempenho, António Portela diz que “a companhia hoje é fruto da aposta em investigação de desenvolvimento de produtos próprios”.

A farmacêutica da Trofa (perto do Porto), conta com mais de 15 mil novas moléculas sintetizadas e coloca, em média, mais de 20% da sua faturação anual à I&D. “No ranking ‘The 2019 EU Industrial R&D Investment Scoreboard’ (dados referentes ao ano 2018), a Bial foi a segunda empresa portuguesa com maior investimento em I&D, com 54 milhões de euros, ocupando a 395ª posição no ranking das 1000 empresas Europeias”, frisa o laboratório.

Recentemente, a Bial teve a aprovação de um contrato de investimento com a aicep Portugal Global – Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal no valor de 48 milhões de euros. O projeto terá apoios de 30% do valor total e pretende trazer para o mercado mundial fármacos inovadores nas áreas do sistema nervoso central e cardiovascular. O fármaco em desenvolvimento que está mais avançado destina-se a hipertensão arterial pulmonar e que está na fase II de ensaios clínicos e que António Portela acredita que no final de 2020 ou início do próximo ano entre na fase III, que é última etapa antes da comercialização.

Porém este calendário pode vir a sofrer alterações por causa da covid-19, já que os ensaios são realizados em hospitais e, por exemplo, e Espanha e Itália, a Bial tem tido “constrangimentos” a este nível.

Sobre o impacto da pandemia no negócio e atividade da farmacêutica, António Portela diz que no primeiro trimestre produziram mais 50% para satisfazer o pedido do Infarmed (a autoridade reguladora do medicamento em Portugal) de reforçarem os stocks de fármacos, bem como para dar resposta a uma maior resposta por parte dos doentes, muitos deles crónicos, que compraram mais devido ao receio de poderem ficar sem tratamento. “Agora no segundo trimestre estamos a sentir uma queda enorme na procura”, revela o CEO, acrescentando que mesmo assim “vamos manter níveis elevados de atividade, até porque não sabemos se podemos ter de enfrentar uma segunda vaga da covid-19”. Para o encerrar de 2020, António Portela opta por não fazer projeções sobre o desconhecido. “Por causa da covid-19, temos vários cenários traçados, uns mais positivos, outros menos. Não sabemos se será catastrófico”, menciona o gestor, admitindo que não sabe “se os 300 milhões de euros de faturação serão afetados”.

A Bial tem filiais em nove países e vende os seus produtos em mais de cinquenta mercados, sobretudo da Europa, África e América.

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