Economia

Covid-19. 80 mil clientes do BCP pediram para adiar pagamento de €4,5 mil milhões em créditos

Miguel Maya, CEO do Millennium BCP
Miguel Maya, CEO do Millennium BCP
José Fernandes

BCP teme pelos clientes reestruturados e acredita que a solução passa por uma entidade externa que valide se as empresas que são viáveis

Covid-19. 80 mil clientes do BCP pediram para adiar pagamento de €4,5 mil milhões em créditos

Diogo Cavaleiro

Jornalista

Covid-19. 80 mil clientes do BCP pediram para adiar pagamento de €4,5 mil milhões em créditos

Isabel Vicente

Jornalista

O Banco Comercial Português (BCP) tem já um conjunto de 80 mil moratórias pedidas pelos seus clientes, o que perfaz um conjunto de 4,5 mil milhões de euros em prestações que não serão pagas na data anteriormente acordada. É da mesma ordem, também, o montante de operações de crédito bonificadas já pedidos ao banco. O presidente da instituição mostra, porém, preocupação com os clientes que já tinham os créditos reestruturados anteriormente – e recusa, novamente, que esteja a aproveitar para limpar créditos passados com o dinheiro garantido pelo Estado.

Na audição na comissão de Orçamento e Finanças, Miguel Maya revelou que o BCP sublinhou que, no âmbito das empresas, conta com 25 mil moratórias pedidas, no montante de 2,2 mil milhões de euros. Ou seja, 88 mil euros em média em cada pedido. As moratórias permitem a suspensão do pagamento de juros e/ou capital até ao final de setembro.

Já nos particulares, no conjunto da moratória legal (crédito à habitação permanente para residentes) e da moratória privada (feita pela Associação Portuguesa de Bancos, para créditos a segundas habitações, não residentes e crédito ao consumo), o banco já segue nas 55 mil moratórias, no valor de 2,3 mil milhões de euros. Aqui, o valor médio é 41,8 mil euros.

Ao todo, são as tais 80 mil moratórias, perfazendo 4,5 mil milhões de euros. O valor representa mais de 10% da carteira de crédito do BCP em Portugal, que se fixava em 36,7 mil milhões no final do ano passado.

Nas linhas de crédito, o líder do banco privado sublinhou que há mais de 16 mil operações, correspondentes a 4,3 mil milhões de euros de crédito. As microempresas representam 54% das operações, mas apenas 9% do montante. As PME correspondem a 44% das operações, mas são muito mais importantes nos valores: 78% do montante. Já as grandes empresas têm pouco peso: “Não é aqui que as grandes empresas encontram a solução para os seus problemas”, disse Miguel Maya, indo ao encontro do que também os administradores do BPI já tinham dito, por conta do limite máximo de 2 milhões de euros a pedir por cada empresa.

Solução para empresas reestruturadas passa por entidade externa à banca

O presidente executivo do banco voltou a um tema que já tem referido e sobre o qual o Expresso já escreveu: como os bancos estão limitados na ajuda aos clientes que tinham dificuldades antes da pandemia.

“Há um tema que não está resolvido, que é o conjunto de empresas que se reestruturaram, que fizeram transformações profundas, que são viáveis. Têm de ter um enquadramento para não ficarem estigmatizadas. Um marcação leva a que os bancos não concedam crédito a estas empresas”, disse, especificando que fala de empresas que fizeram reestruturação, tanto com um processo especial de revitalização (PER) como fora de PER.

Segundo Maya, tem de se encontrar uma solução, mas não podem ser os bancos a centrar a decisão. Tem de ser uma entidade externa à banca, um instituto público, que certifique que as empresas são viáveis, apesar da reestruturação, e que podem merecer empréstimo – só que, aí, disse o banqueiro, será necessária uma garantia de 100% do Estado, para não haver penalização dos rácios do banco.

Em relação ao endividamento, “há muitas empresas que já não aguentam a dívida que têm, e, se puserem dívida em cima”, não terão condições para continuar a operar. Miguel Maya diz não ter dúvidas de que o crédito malparado irá aumentar.

Banco garante não aproveitar para substituir créditos antigos

Questionado sobre o facto de o banco estar a contactar microempresas por telefone para lhes propor emprestar dinheiro para pagar crédito antigo, Miguel Maya diz não acreditar que seja verdade. Se for, promete consequências.

“Se houver uma única situação dessas, fica o meu compromisso de colocar um processo disciplinar ao colaborador que o tenha feito e resolvo a situação. Não concedemos crédito ao abrigo destas linhas para pagar crédito antigo”, disse o banqueiro aos deputados, ressalvando que não acredita que haja um único caso. Aliás, o BCP já tinha feito um esclarecimento, rejeitando essa imputação, quando começaram a surgir rumores sobre isso.

Documentos são pedidos pelas sociedades de garantia mútua

Questionado sobre inúmeras queixas relativas ao facto de o BCP pedir documentos e aprovação de contas das empresas de 2019 e o certificado do IAPMEI, que parecem estar a dificultar a aprovação para conceder o empréstimo, Miguel Maya insiste numa tecla: “o BCP só pede informação suplementar para ajudar as empresas; se não o puder fazer, recusa a candidatura”. Mas também diz que se a empresa disser que não tem as contas aprovadas, mas apenas o balancete de dezembro de 2019, então nesse "nós dizemos mande o balancete".

O mesmo acontece com o certificado do IAPMEI que passou a ser uma exigência das sociedades de garantias mútuas. “Se queremos ser rigorosos e passar do plano das boas intenções para as boas concretizações, temos de ser sérios e dar um bom serviço ao cliente”. Ou seja, não basta as candidaturas serem aprovadas pelo banco; têm de ser aprovadas pelas sociedades de garantias mútuas e a falta de documentação pedida pode inviabilizar a sua concretização.

O BPI também frisou que, se as linhas de crédito têm burocracia, elas devem-se às sociedades de garantia mútua - e a bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados também apontou baterias a estas entidades.

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