Governo sem metas nem consensos para subir salários
Parceiros sociais lamentam que o Executivo continue a não ir além de “generalidades”
Parceiros sociais lamentam que o Executivo continue a não ir além de “generalidades”
Jornalista
É um lamento que pôs patrões e sindicatos do mesmo lado da barricada. No final de mais uma reunião na concertação social, para discutir o acordo de rendimentos e competitividade, a expressão mais ouvida nas declarações dos parceiros sociais aos jornalistas foi “generalidades”.
A intenção do Governo desde o arranque das negociações é promover um crescimento mais expressivo dos salários, para recuperar o peso dos rendimentos do trabalho no Produto Interno Bruto, aproximando Portugal da média europeia. Mas passar das palavras aos atos está a revelar-se um bico de obra para a equipa do Governo, encabeçada pelo ministro da Economia e número dois de António Costa, Pedro Siza Vieira.
Sinal disso, a ideia inicial de definir um referencial concreto para a subida dos salários, transversal a toda a economia, que servisse de indicador para a negociação coletiva foi abandonada. E mesmo um modelo com referenciais diferentes de sector para sector parece morto e enterrado. “Quer do lado das confederações patronais quer do lado das centrais sindicais houve algumas reticências em aceitar a ideia de um referencial médio, a ser fixado anualmente”, admitiu Siza Vieira, considerando que se sindicatos e associações patronais “entendem que essa não é a melhor forma também não é dramático”.
Não há referenciais e, para já, continua sem haver propostas concretas do Executivo, dizem os parceiros sociais. “Estamos mais uma vez a discutir generalidades”, vincou Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, no final da sua última reunião na concertação — a partir deste sábado, Isabel Camarinha deve suceder-lhe na liderança da Inter. “Não fazemos um acordo só com generalidades. Queremos fazer um acordo com questões concretas”, referiu Lucinda Dâmaso, que encabeçou a comitiva da UGT face à ausência do secretário-geral, Carlos Silva. Na mesma linha, pelo lado dos patrões, João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), frisou que “não assinamos um acordo de carácter genérico e pressionados pelo tempo”.
Além de Carlos Silva, também António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), e Francisco Calheiros, presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), estiveram ausentes da reunião.
Durante a reunião, o Executivo continuou a insistir em fechar um acordo até final de março, com Siza Vieira a falar mesmo num “desprestígio” se assim não for. Mas, aos jornalistas, o ministro reconheceu que as negociações podem prolongar-se. Lembrando que o acordo “é muito ambicioso”, considerou “normal” que o avanço das negociações seja “difícil”. Assegurou, contudo, que “o Governo considera que há condições para continuarmos a progredir”.
A reunião desta semana ilustra as dificuldades do ministro da Economia em alcançar consensos na concertação e chegar a propostas concretas. A agenda previa a discussão de quatro pontos do total de 11 que o Governo propõe incluir no acordo: valorização dos salários; valorização dos jovens qualificados; rendimentos não salariais; e formação profissional e qualificação. Mas todo o tempo foi passado a discutir a metodologia para recomendações à negociação coletiva sobre aumentos salariais — sem qualquer avanço prático — e o âmbito do próprio acordo, em termos de “nível de profundidade”, indicou um dos parceiros ao Expresso.
No que toca à valorização dos salários, como o Expresso já avançou, o Governo defende uma formulação em que, por cada euro de ganho de produtividade, mais de metade reverta para os aumentos de ordenados. Mas, além de ter de passar no crivo dos patrões, não é fácil operacionalizar o conceito. O acordo de rendimentos arrisca ficar apenas por uma carta de boas intenções.
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