Espanha é “desafio e oportunidade”

O decréscimo da população e o isolamento estão a obrigar o Alto Alentejo a assumir uma nova centralidade
O decréscimo da população e o isolamento estão a obrigar o Alto Alentejo a assumir uma nova centralidade
Jornalista
Ponto prévio: “Deve haver desgraças maiores que Portalegre, mas não está a correr bem. É um dos casos mais difíceis”, na opinião de Daniel Bessa. O economista não escondeu o seu pessimismo quanto ao panorama económico da cidade. “Se formos realistas, não há razão nenhuma para embandeiramos em arco”, acrescentou, sem deixar de reconhecer pequenas notas positivas que, se bem exploradas, poderão fazer a diferença a longo prazo. E que para a região passarão sempre por um aprofundamento das relações com a tão próxima mas pouco explorada Espanha.
É o vizinho que possui uma economia quatro vezes superior à portuguesa mas com o qual os fluxos comerciais sempre foram mais reduzidos do que seria de esperar por razões históricas que só agora começam a ser debeladas. “Nunca senti a imagem do domínio espanhol sobre Portugal”, apontou João Paulo Crespo, sócio do Grupo Fertiprado, que aproveitou o palco do XXV Encontro Fora da Caixa para defender que trabalhar com um parceiro da dimensão dos espanhóis só pode ser bom para o futuro da região. Sobretudo quando centros regionais ibéricos, como Badajoz, por exemplo, estão mais próximos do que propriamente o litoral português.
No fundo, trata-se da vontade (e necessidade) em assumir uma nova centralidade que as opiniões manifestadas ao longo da tarde no repleto Centro de Artes do Espetáculo de Portalegre deixaram bem claro. Ambição a que José Félix Ribeiro não se mostrou indiferente e pela qual não esconde otimismo, sobretudo se formos “melhores no conhecimento, na capacidade de inovação e em conseguir atrair pessoas para cá”. Para o economista, “se olharmos para o Alto Alentejo, as coisas estão a correr bastante melhor do que aquilo que poderíamos imaginar” e as condições existem para que a região possa ser a “montra do Portugal moderno face ao mercado espanhol”. Para isso é preciso estacar as perdas populacionais que têm afetado a área, naquele que é um dos problemas mais graves com que a cidade (e grande parte do interior) se depara e que pode encontrar uma solução na aposta educativa. “No coração disto estão quase sempre politécnicos e universidades e esta é a rede essencial para nos ligarmos ao resto do país e a Espanha. Não há nada que impeça”, atirou.
António Nogueira Leite não tem dúvidas de que é necessário “criar oportunidades de geração de riqueza”, o que “não se faz só com a construção de autoestradas.” Se para o economista é claro que “Espanha é desafio e é oportunidade” também é claro que “precisamos de criar instituições que permitam atrair empresas”, e que também desempenham um papel primordial no sentido de “projetar o interior.” Para tal, pede aos empresários e grandes nomes da região que sejam capazes de se unir e trabalhar para um bem comum, pois só assim serão “capazes de fazer coisas que a partir de Lisboa não se consegue” e forjar o seu próprio caminho.
Trata-se de aproveitar os sinais positivos, como Daniel Bessa lembrou e que passam pela “chegada de jovens para ensino superior e de novos investidores” atraídos pelas potencialidades da área. “Não podemos confiar nas políticas públicas porque têm boas intenções mas geralmente são mal executadas”, segundo José Félix Ribeiro, que enumerou exemplos da agricultura ou pecuária para mostrar que é possível prosperar na região. Sem esquecer um dos ex-líbris da cidade — a tapeçaria — para vincar que uma tradição com essa qualidade representa “um capital simbólico e de diferença que não se pode perder.”
Os empresários da região procuram manter essa identidade e apostam na promoção dos produtos locais dentro e fora de portas. “A carne alentejana está boa e com saúde. Não tenho dúvidas nenhumas que é uma das melhores carnes do mundo”, lançou para cima da mesa o presidente da Carnalentejana, e que por isso se distingue mais pela qualidade do que pela quantidade, o que implica “um preço diferenciado.” Ativo que tem que ser protegido quando o responsável garante que “o Alentejo está a ser alvo de uma invasão de culturas que nada tem a ver com as condições da região”. José Maria Falcão, administrador da Cersul, falou também da agricultura biológica como algo ainda “pouco rentável” mas “extremamente atraente” e que se enquadra na política do “primeiro aglomerador de produtores de cereais em Portugal”. Qual é ela? “Não nos interessa volume, interessa-nos produzir bem.” Como explicou António Nogueira Leite, “temos que jogar com os benefícios de Portalegre numa economia que é global”.
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