Quando, ao princípio da noite de 23 de junho de 1858, as autoridades bateram à porta da família Mortara, em Bolonha, ninguém supunha ao que vinham. Salomone Mortara era um próspero comerciante judeu, pai de oito filhos e o que o meirinho, às ordens do tribunal do Santo Ofício, lhe vinha comunicar era aterrador. Bolonha pertencia, então, aos Estados Papais, as ordens que Pietro Lucidi, líder dos carabinieri, tinha eram perentórias. Edgardo, um dos filhos Mortara, agora com seis anos, fora secretamente sujeito a um batismo de emergência — em risco de morte — por uma criada da família. Deste modo, como as leis da Igreja interditavam que uma alma resgatada pelo sangue de Cristo fosse educada por infiéis, Edgardo iria ser retirado à família e enviado para Roma, como catecúmeno, à guarda parental do próprio Papa, Pio IX. E assim aconteceu. Salomone Mortara moveu céus e terra para que o filho lhe fosse devolvido e o caso chegou às mais altas instâncias internacionais, com esforços diplomáticos de França, Inglaterra e Estados Unidos para que Pio IX revertesse os seus intentos. Debalde. O caso teve uma importância relevante na opinião pública da época e consequências políticas. Edgardo continuou em Roma, acabaria conquistado pela fé católica, mais tarde seria ordenado sacerdote, acabando por morrer, na Bélgica, em 1940. Há muito que o poder temporal do Papa fora desmanchado pelo Risorgimento e o caso Mortara quase esquecido.
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