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O Dickens de Newark, o Proust dos masturbadores: o romance de Roth sobre... Roth

O Dickens de Newark, o Proust dos masturbadores: o romance de Roth sobre... Roth
ERIC THAYER/REUTERS

“Zuckerman Libertrado” é o segundo dos nove romances de Philip Roth com este protagonista. Que é um alter-ego seu. Um escritor que publica um livro-choque e detesta a fama conquistada

De que é que Zuckerman se libertou? Neste segundo de nove ‘romances Zuckerman’, publicado em 1981, o alter ego de Roth começa por não conseguir libertar-se do sucesso. Ficcionista jamesiano “arrancado à obscuridade” quando escreveu um livro-choque, “Carnovsky” (como quem diz: “Portnoy”), Nathan Zuckerman descobriu que ser célebre tem desvantagens. Por mais que queira continuar a viver como um desconhecido, é impossível: pessoalmente, por carta, ou por telefone, contacta com fãs insistentes, judeus que acham que ele ofendeu os judeus, leitores que lhe pedem que não lave a roupa suja em público, senhoras que juntam fotos marotas, pessoas que lhe agradecem e que o ameaçam.

Todos discutem “Carnovsky”: críticos literários, rabinos, talk shows, colunas de mexericos. Mas serão Carnovsky e Zuckerman (e Roth) a mesma pessoa? O protagonista lamenta que ninguém distinga “entre o ilusionista e a ilusão”, e lembra a lição de Aristóteles, para quem uma “acção representada”, embora seja catártica, não pode ser levada a sério. Mas o romance é “a arte da descrição”, e todos, incluindo a família e as ex-mulheres, levam a sério as descrições de Zuckerman, o Dickens de Newark, o Proust dos masturbadores. E entre ajustes de contas à clef, somos apresentados a um desgraçado que decora factóides para concursos televisivos, a uma actriz planturosa dividida entre Kierkegaard e Fidel Castro, e a outros admiradores neuróticos, vingativos ou ridículos. No último terço da narrativa, a comédia exasperada dará lugar ao ‘lirismo sentimental’ e à amargura, com a morte do pai de Nathan e o regresso fugaz a Newark. O pai, mesmo antes de morrer, já não está lá, entubado, assustado, mas capaz ainda de amaldiçoar o filho. E a casa e o bairro onde Nathan viveu na infância e adolescência são agora uma “réplica liliputiana” do passado. É então isso, a finitude, que o liberta e entristece.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: pedromexia@gmail.com

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