Geoff Dyer não consegue estar quieto. Se mesmo numa monografia (“Zona”, sobre o “Stalker” de Tarkovski) discutia não apenas o filme em causa mas tudo o que lhe vinha à cabeça, imagine-se num livro que tem como tema as últimas coisas, os últimos tempos, o crepúsculo, o declínio, a desistência, o inacabado, o fim. Isso significa que nestas páginas, organizadas em sequências de fragmentos, encontramos os Doors e a canção ‘The End’; Kerouac incapaz de lidar com o sucesso; Dylan e Ginsberg visitando o túmulo de Kerouac; o estilo tardio de Dylan; a doença em D. H. Lawrence; Turner que “nunca pintou o seu último quadro”; Nietzsche abraçado a um cavalo em Turim; os últimos quartetos de Beethoven; os poemas de Wordsworth sobre o tempo; a decadência de Hemingway; histórias de desportistas e músicos de jazz; etc., etc. Se David Foster Wallace escreveu “Roger Federer as Religious Experience”, Dyer escolhe essa e outras figuras como experiências existenciais significativas ou como alegorias.
Queixando-se da idade e de umas quantas maleitas (ainda que esteja a meio dos 60 anos e em óptima forma), do tempo que avança, ou de já não ter todo o tempo do mundo, o ensaísta investiga ideias como o comeback ou o “eterno retorno”. E então isto vem a propósito daquilo, e surge mais um caso, mais um exemplo. Dyer é espontâneo, irrequieto, cândido, mas em contrapartida abusa da trivialidade diarística pour épater, com anotações sobre os ovos que comeu ao pequeno-almoço ou os frasquinhos de champô que traz dos hotéis. Se cita o magnífico “A Sensibilidade Apocalíptica”, de Frank Kermode, é no sentido de uma afinidade temática, porque aos “estudos” e às “teorias” prefere as sensações minuciosas, as impressões inesperadas, as intuições divertidas. E o livro vale sobretudo por isso: a semelhança entre o tenista Federer e o futebolista Bergkamp, a improbabilidade de a pintura nos fazer chorar, regressar aos textos da segunda vaga feminista como quem decide jogar squash na meia-idade.
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