Foi um dos maiores medievalistas portugueses, professor e diretor da Torre do Tombo. Viveu em Timor, estudou na Bélgica. Nasceu em Leiria, em 1933. Sofria há vários anos da doença de Parkinson
Em fevereiro de 2021, foi somente por escrito que José Mattoso aceitou dar uma entrevista ao Expresso. Sofria de Parkinson já avançado e por isso o gosto de a conceder veio acompanhado pela afirmação de que, talvez, fosse a última. Nessa altura, a pandemia que assolava o mundo era o tema central das conversas – a guerra na Ucrânia só começaria um ano depois.
O historiador, na altura com 88 anos, tinha lançado meses antes um livro pela Temas e Debates, a editora onde tem a obra publicada. Chamava-se “A História Contemplativa” (Temas e Debates) e era uma coleção de ensaios escritos entre 1996 e 2013. Neles, refletia sobre o ofício e a metodologia do historiador, além das temáticas que desde sempre lhe interessaram. Assim, ao mesmo tempo que explicava como o seu trabalho equivale ao “movimento da Humanidade sujeita ao tempo”, por sua vez desdobrado em “História vivida” e “História escrita” – “o que o Homem fez desapareceu com o tempo, mas foi re-representado, isto é, ‘tornado presente’ pelo que contou, pelo que escreveu e pelo que criou” -, debruçava-se sobre “a religião dos alentejanos”, “a leitura e a escrita na cultura monástica medieval”, “Portugal no reino de Leão” ou o que é ser um medievalista (como ele). Uma ânsia de definir e definir-se percorre o livro, tão atual ainda que os textos pertençam a essa saga escrita que com o tempo moldamos e nos molda.
José Mattoso, que morreu este domingo vítima de Parkinson, escolheu a História por ser uma narrativa, a nossa. A que contamos sobre nós mesmos. Antes disso, tinha optado pela vida monástica, passando 20 anos na Abadia de Singeverga, em Santo Tirso. Mas essas duas vias não estavam desligadas: “Não sou historiador por opção profissional, mas para ser fiel à vocação monástica, na medida das minhas capacidades”, disse ao Expresso há dois anos. Diferenças entre os seus ideias e a prática – entre a vida ativa de um monge e a contemplação que ele procurava para si - levaram-no a sair de Singeverga, passando a alternar períodos de reclusão voluntária em aldeias ou povoados isolados com outros de docência e atarefada investigação.
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