Tropical, fresco e mineral o Rum da Madeira nasce do "ouro branco"
Gregório Cunha
A cana-de-açúcar já representou um fator de crescimento económico na Madeira, mas hoje a produção escasseia e os produtores de Rum da Madeira IGP não preveem tempos fáceis. Luís Faria, gerente do Engenhos do Norte, um dos mais antigos em atividade na ilha, fala sobre as origens e o futuro do setor. “Da Terra à Mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante
Na ilha “desde o início das nossas descobertas”, como explica Luís Faria, gerente do Engenhos do Norte, na vila do Porto Cruz, um dos mais antigos em atividade na Madeira, a funcionar desde 1949, a cana-de-açúcar foi uma “cultura bastante apetecida como vetor de criação de uma riqueza importante”, lê-se também no site da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR). Era conhecido por “Ouro Branco” e usado na culinária, na doçaria e até como elemento decorativo. No entanto, “quando se levou a cana-de-açúcar para o Brasil, o açúcar que era feito na ilha perdeu valor e começou-se a produzir aguardente de cana-de-açúcar, que não é mais do que o rum agrícola”, garante Luís.
E apenas há alguns anos se mudou a nomenclatura. “Alterou-se o nome para rum agrícola e isso foi uma mais-valia, porque permitiu às empresas entrarem em concursos internacionais. Houve uma admiração no mercado internacional pelo rum da Madeira. No ano seguinte, muitos especialistas vieram ver o que a ilha tinha. Passaram pelas empresas e só depois é que se identificaram”, conta.
Engenhos do Norte
Segundo a DGADR, “o Rum da Madeira IGP é um rum produzido na Região Autónoma da Madeira (RAM), obtido exclusivamente por fermentação alcoólica e destilação do sumo de cana-de-açúcar, apresentando um título alcoométrico volúmico mínimo de 37,5% vol.” A área geográfica de produção “abrange as ilhas da Madeira e do Porto Santo”, sendo as zonas de maior importância canavieira “os concelhos da Calheta, Machico (nomeadamente a zona do Porto da Cruz) e Ponta do Sol, seguidos da Ribeira Brava e restantes concelhos da costa sul da Madeira”. No Caderno de Especificações acrescentam que as características são “influenciadas pelo processo produtivo” mas que, tipicamente, o Rum da Madeira Natural é “límpido e brilhante” e o Rum da Madeira Envelhecido tem uma cor “amarelada a topázio com possibilidade de reflexos dourados a esverdeados”.
Pode ser “sujeito a um envelhecimento em cascos de madeira de carvalho por um período mínimo de três anos” e distingue-se pela “tropicalidade, frescura, mineralidade e persistência típicas”. De entre o rol de produtos com o cunho Engenhos do Norte, destacam-se as marcas “BRANCA”, “970 Reserva de 6 anos”, “980” e “NORTH”, segundo informações do site oficial. “Fazer coisas diferentes” e conseguir uma cada vez maior valorização do produto é um dos objetivos da empresa. “Temos tido várias exportações, para Inglaterra, Alemanha, Coreia do Sul, mas é pena não termos mais produto para comercializar”, atira Luís Faria.
Engenhos do Norte
“Os custos de cana-de-açúcar na Madeira são os mais elevados do mundo”
A tendência é clara: “infelizmente, a cana-de-açúcar tem diminuído a sua produção e nós, produtores de rum, estamos muito preocupados com a continuidade deste negócio”, desabafa Luís. Melhorar a posição dos agricultores na cadeia de valor é uma das medidas da PAC para o período compreendido entre 2023 e 2027, isto porque os custos da produção, a desmotivação dos jovens para a agricultura e a tendência para abandonar os terrenos onde a cana-de-açúcar é produzida ameaçam a continuidade desta cultura. “A dificuldade dos engenhos em ter cana para produzir rum começa a ser, de certa forma, complicada.”
Além disso, “o processo é muito diferente do que o que é feito internacionalmente e os custos de cana-de-açúcar na ilha da Madeira são os mais elevados do mundo”, refere. Mas afinal, como é que tudo se processa? Primeiro, “a cana é desfolhada e é cortado o sabugo, que é a parte de cima da cana”. Uns dias depois, durante a época da colheita, em março, abril e maio, é cortada, emolhada e transportada pelos camiões até aos engenhos. Lá são “trituradas e espremidas” dando origem ao sumo fresco de cana-de-açúcar que, depois de fermentado durante 24 a 48 horas, é destilado e fica pronto a ser consumido.
Engenhos do Norte
A sustentabilidade social, ambiental e económica na agricultura e nas zonas rurais são linhas orientadoras da PAC - Política Agrícola Comum que, em Portugal, tem como objetivos principais valorizar a pequena e média agricultura, apostar na sustentabilidade do desenvolvimento rural, promover o investimento e o rejuvenescimento no setor agrícola a a transição climática no período 2023-2027.
“Da Terra à Mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.
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