Festa ou deceção? As reações e a matemática à primeira gala Michelin para Portugal
Gala Michelin, no Algarve
Com quatro novos restaurantes com estrela e apenas um com a segunda, a primeira gala do Guia Michelin para Portugal deixou no ar deceção. Mais ainda quando comparando com as distinções de 2023, é preciso descontar três restaurantes que saem da constelação
A expectativa era grande para a gala do Guia Michelin que decorreu esta terça-feira no Algarve, em Albufeira, e apesar de se contabilizarem mais um restaurante com duas estrelas (Antiqvvm, no Porto) e mais quatro que se estreiam com a primeira estrela Michelin (2Monkeys e Sála, ambos em Lisboa, Desarma, no Funchal, e Ó Balcão, em Santarém), a verdade é que ainda não foi este ano que Portugal foi distinguido com a tão ansiada terceira estrela. Na verdade, desde 1929, quando estes galardões foram atribuídos pela primeira vez no nosso país, nunca tal feito foi alcançado por restaurantes nacionais.
Pior. Ainda que forma discreta, a Michelin não o anunciou na gala, a verdade é que, em relação a 2023, três restaurantes perderam a tão cobiçada e famosa estrela: Eneko Lisboa e Largo do Paço, em Amarante, por encerramento, e Vistas Rui Silvestre, sem justificação oficial, ainda que espaço tenha perdido o chef, agora a liderar o Fifty Seconds Experience, na Torre Vasco da Gama que, curiosamente, manteve a estrela conquistada com Martín Berasategui.
Contas feitas, Portugal tem agora 31 restaurantes com uma estrela Michelin (em 2023 tinha 31) e tem 8 restaurantes com duas estrelas, apenas um a mais em relação ao ano anterior. Conclusão: passou de 38 premiados para 39!
“Entre a expectativa e a realidade, o importante é aprender a não criar expectativas”, começa por referir José Avillez no final da Gala Michelin, para logo acrescentar, convicto: “Para mim, o Belcanto é um restaurante que merece ter três estrelas Michelin. Estou triste por não ver mais restaurantes com uma estrela e mais alguns com a segunda, mas reconheço que o Guia faz um trabalho sério e respeitável”. O chef português, distinguido também no Encanto, conclui que “não é relevante fazer um guia exclusivo para Portugal, quando isso não resulta em Portugal ganhar mais estrelas. Ainda assim, é um grande investimento para Portugal e bom para a divulgação da nossa gastronomia”. Já Vítor Matos, o vencedor da noite, assume que “não estava à espera que Portugal não tivesse pelo menos um restaurante com três estrelas”.
Escreve o Guia Michelin, em comunicado, que o chef Vítor Matos “é o cozinheiro que mais brilha nesta edição”. Assim, além de ver o Antiqvvm, no Porto, a conquistar duas estrelas, também o projeto 2Monkeys, com Francisco Quintas, no Torel Palace Lisbon, atinge no primeiro ano de abertura, uma estrela do Guia Michelin. Também o Blind, espaço no Torel Palace Porto, liderado por Vítor Matos, recebeu o prémio de Jovem Chef, atribuído a Rita Magro. “Não estava mesmo à espera de conseguir a segunda estrela no Antiqvvum, mas convicto da primeira com o projeto 2Monkeys, que mais facilmente chegará à segunda”, afirma com convicção.
Já Octávio Freitas revelou “um desalento muito grande entre os chefs que desejavam muito a atribuição, pela primeira vez, de três estrelas a restaurantes portugueses, mais ainda quando esta foi a primeira Gala Michelin exclusiva para o nosso pais”. Para a grande parte dos presentes, a surpresa maior da noite foi a atribuição de uma estrela Michelin ao restaurante Desarma, instalado no topo do Hotel The Views Baía, no Funchal, e liderado por Octávio Freitas. Com esta distinção, o chef, que cozinha profissionalmente há 26 anos na ilha, pretende demonstrar aos mais jovens que “é possível fazer uma carreira bonita sem sair da Madeira e a trabalhar bons produtos e com bons profissionais”, enaltecendo o facto de “com uma brigada jovem, em apenas um ano conseguimos chegar aqui, a este palco”.
Entre as novidades com uma estrela Michelin está o restaurante Ó Balcão, em Santarém, que também foi distinguido com estrela Verde. O chef Rodrigo Castelo não escondeu a emoção: “Não estava à espera, mas confesso que o sonho comanda vida e a estrela era muito ambicionada há já algum tempo”. O estreante Sála de João Sá acabou por surpreender ao conquistar a primeira estrela. A distinção foi muito celebrada e o chef deixou um recado a todos os que trabalham para conquistar prémios: “É melhor e mais útil ouvir quem vai ao restaurante do que prestar atenção ao que se diz e escreve nas redes sociais”. De fora da contabilidade do Guia Michelin ficou a mulher de João Sá, a chef Marlene Vieira.