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BLITZ 2024. Grande entrevista a Nick Cave: “As pessoas mais miseráveis podem criar as coisas mais belas”

BLITZ 2024. Grande entrevista a Nick Cave: “As pessoas mais miseráveis podem criar as coisas mais belas”
Venetia Scot

Teve este ano novo álbum e regressou a Portugal com os Bad Seeds no outono. Em Londres, Nick Cave recebeu-nos para, demoradamente, conversar sobre amor e luto, salvação e a Bíblia. A morte de dois filhos, diz, mudou a sua perceção dos outros; hoje, o mais importante é “estar atento às alegrias do presente”. Sem nostalgia e sem tretas, uma entrevista que republicamos na reta final de 2024

BLITZ 2024. Grande entrevista a Nick Cave: “As pessoas mais miseráveis podem criar as coisas mais belas”

Lia Pereira

Em Londres

Who’s next?” A voz soa firme, quase autoritária, e contém vestígios do sotaque da Austrália, onde Nicholas Edward Cave, o terceiro de quatro irmãos, nasceu há quase 67 anos. À porta do salão de entrada de um hotel de luxo em Chelsea, Londres, um dos músicos mais venerados da sua geração espera-nos: altíssimo e eternamente esguio, veste fato escuro e gravata azul, que afagará e enrolará amiúde ao longo da hora que se segue. “Entra no meu escritório”, brinca, enquanto nos sentamos à sua frente, com uma longa mesa pelo meio. “Ouvi dizer que toda a gente vai para Lisboa agora. É o novo sítio da moda, não é?”, indaga, servindo-se de água com gás. A 27 de outubro, Nick Cave regressa a Portugal com os seus Bad Seeds, para um concerto na Meo Arena, em Lisboa, que servirá de apresentação do novo álbum, “Wild God”, nas lojas a 30 de agosto. Quando elogia­mos o tom das canções, entre o êxtase e a redenção, parece surpreender-se: “Gostaste? A sério?”, pergunta, arregalando os olhos de um azul magnético, encimados por grossas sobrancelhas negras que se contorcem a cada resposta.

Gostámos, a sério, mas sob a aparente euforia das novas canções esconde-se inevitavelmente a mágoa que o veterano sempre tratou por tu e que se agudizou nos últimos anos, com a morte de dois dos seus quatro filhos: primeiro Arthur, de 15 anos, caiu numa ravina perto de casa dos pais, em 2015, e em 2022 Jethro, de 31 anos, fruto da relação com a modelo australiana Beau Lazenby, perdeu a vida em circunstâncias não reveladas. Nos palcos — incluindo em Portugal, que visita com frequência, tendo tocado no Porto em 2018 e 2022, ano em que atuou também em Lisboa —, Nick Cave encontrou a salvação, através da “enxurrada de amor” que os fãs lhe entregaram noite após noite. À nossa frente, numa segunda-feira de inusitado calor em Londres, o homem que escreveu ‘Into My Arms’ ou ‘People Ain’t No Good’ ergue-se imperial, como sempre. Mas mede as palavras com régua e esquadro, pontuando cada frase mais delicada com silêncios ponderados ou mostrando entusiasmo e indignação com gestos largos, amplos, como o pregador cuja pele veste nos concertos.

O som da água com gás a cair no copo de vidro dá o sinal de partida: eis a nossa conversa com Nick Cave, um dos grandes autores e performers do nosso tempo, um sobrevivente e, no universo peculiar da música popular, uma lenda.

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