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Teresa Paula Brito apresenta a volúpia do sexo ao Estado Novo: um capítulo de “A Revolução Antes da Revolução”, de Luís Freitas Branco

Teresa Paula Brito (à esq.), Maria Teresa Horta (à dir.) em 1971
Teresa Paula Brito (à esq.), Maria Teresa Horta (à dir.) em 1971
Arquivo A Capital/Impresa Publishing

Estamos a 18 de maio de 1971, um dia formador da canção portuguesa, com uma récita de Ana Maria Teodósio, apresentação do poeta David Mourão-Ferreira e cobertura em peso dos jornais, rádio e televisão. Perante um auditório em silêncio, sob andamento rock, Teresa Paula Brito, incensada pela crítica mais progressista de então, canta versos de Maria Teresa Horta: “Colheste as flores/ da tua chama/ apagaste devagar/ os teus sentidos/ Sossegaste o corpo/ em sua cama/ desguarneceste em mim/ os teus motivos.” Um acontecimento (esquecido) em plena ditadura patriarcal, a que Luís Freitas Branco lança luz em “A Revolução Antes da Revolução”, livro do qual a BLITZ publica o quinto capítulo, o mesmo onde se escreve sobre a censura de que José Cid e o Quarteto 1111 foram alvo

“Colheste as flores/ da tua chama/ apagaste devagar/ os teus sentidos.”

A voz é de Teresa Paula Brito, perante um auditório em silêncio, na Avenida Visconde de Valmor, em Lisboa, expectante face a um lançamento literário e discográfico que certamente seria recordado nos anos vindouros como um acontecimento notável. Estamos a 18 de Maio de 1971, um dia formador da canção portuguesa, com uma récita de Ana Maria Teodósio, apresentação do poeta David Mourão-Ferreira e cobertura em peso dos jornais, rádio e televisão. Ao lado do palco, de braços cruzados, Maria Teresa Horta recolhe-se enquanto a plateia folheia o seu novo livro de poemas, Minha Senhora de Mim, e ouve uma versão rock'n'roll a girar na vitrola, que acentua a insubmissão dos versos:

“Sossegaste o corpo/ em sua cama/ desguarneceste em mim/ os teus motivos.”

Os motivos do poema eram claros, a volúpia do sexo que arde desgovernada pelo corpo feminino, que em plena ditadura patriarcal é um «profundo segredo» de «secreto recanto». As canções são urgentes e transgressoras, como o rock mais instigante que sobrevive ao teste do tempo, e os elementos estão todos alinhados: o cunhado de Maria Teresa Horta, Nuno Filipe, dá um andamento de rock progressivo, remete para a carnalidade do poema e para aquele instante particular do rock anglo-saxónico; a vocalista Teresa Paula Brito, exaltada pela critica como a derradeira voz feminina desta geração, vencedora dos Prémios Imprensa, controla a tensão e cicia ameaçadora; e nos bastidores estão os elementos da banda revolucionária de José Cid, Quarteto 1111, que combatiam na linha da frente pelo entrosamento da canção moderna com a tradição portuguesa.

“Que a vela acesa corte a madrugada/ e lhe desdiga a calma e a palavra/ Colheste devagar o meu queixume/ Ó meu amor!/ Ó meu aceso lume!”

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