É muito fácil esquecermo-nos de que os Simple Minds nasceram no punk. Em 1977, o grupo era ainda conhecido como Johnny & The Self-Abusers, tendo dado alguns concertos - o mais mediático como banda de abertura dos então emergentes Generation X, de Billy Idol - e acabando ainda antes de lançar um disco, dividindo-se em duas fações. Acabou por vencer aquela que continha Jim Kerr e Charlie Burchill, ainda hoje, e respetivamente, vocalista e guitarrista do grupo que acabou por "roubar" o seu nome a um verso de 'Jean Genie', de David Bowie.
É fácil esquecermo-nos, porque, num supremo ato de ironia, os Simple Minds são (sobretudo) conhecidos por 'Don't You (Forget About Me)', canção pop suprema dos idos anos 80, tornada êxito mundial através da sua inclusão em "O Clube", comédia de culto de John Hughes. E, se lhe quisermos juntar outra camada de ironia, 'Don't You (Forget About Me)' nem sequer foi composta pelos Simple Minds: é o resultado de uma colaboração entre o produtor Kevin Forsey e o guitarrista Steve Schiff, e até foi "oferecida", em primeira instância, a Bryan Ferry e depois a Billy Idol...
Se incidimos demasiado sobre esta canção em particular, é porque foi ela o despertador para um público que, durante quase uma hora e meia - o tempo que levou até ela surgir no alinhamento -, se mostrou particularmente amorfo, salvaguardando uma ou outra ocasião em que responderam afirmativamente aos pedidos de palmas por parte de Jim Kerr. Assim que se escutaram as notas iniciais de 'Don't You (Forget About Me)', a alegria pairou estridente no ar, os telemóveis ergueram-se, as gargantas eclodiram, as pernas desataram a correr das barracas da cerveja para mais perto do palco. Aparentemente, e apesar de já contarem com 45 anos de canções no currículo, só existe uma capaz de levar alguém a um concerto dos Simple Minds. Se isso é bom, se é mau, se é irrelevante? Dependendo do ponto de vista, acabará por ser as três.
Não obstante esse facto, e não obstante também alguns problemas com o som (algo que parece estar a afetar esta edição do EDP Vilar de Mouros em particular, principalmente do lado esquerdo do palco), os escoceses acabaram por assinar um ótimo concerto, destacando-se sobretudo a performance de Cherisse Osei, diabinho de 35 anos e um sorriso maior que o mundo, que se mostrou implacável na sua bateria. Não foi por acaso que foi dela o nome mais aplaudido, quando Kerr apresentou os elementos que compõem o grupo. O vocalista, que justificou alguns movimentos de dança a menos com uma lesão numa perna, foi puxando pela plateia como pôde - sobretudo com um "está tudo bem?" repetido ad nauseam.
Contratados para substituir os cancelados Limp Bizkit e Hoobastank, e apenas quatro meses após terem atuado nos Coliseus de Lisboa e Porto, os Simple Minds trouxeram guitarras planantes e teclados new wave a um festival onde a nostalgia não é um estado de espírito, é um modo de vida. 'Waterfront', que se foi arrastando em crescendo, brilhou no meio de toda a noite. Pouco depois, 'Book Of Brilliant Things' trouxe a palco a vocalista Sarah Brown, dona de uma magnífica voz soul; por lá permaneceria até ao final do espetáculo, ajudando o grupo em temas politicamente mais engajados, como 'Mandela Day' (com Kerr a cruzar os pulsos, simbolizando a prisão do falecido líder sul-africano) ou 'Belfast Child' (dona de um momento sublime e solene, que abriu depois espaço à bateria). Pelo meio, 'Vision Thing', "uma canção mais alegre". O final, depois do êxito, fez-se com outro: 'Alive and Kicking'. É possível que eventualmente nos esqueçamos dos Simple Minds, mas daquela canção nunca nos esqueceremos.
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