No campeonato da saudade, há duas ligas: a dos que, hoje em dia, mal conseguem reproduzir um refrão que os fez famosos em tempos idos; e o campeonato composto por um muito seleto conjunto de bandas veteranas capazes de dar um espetáculo que não se limita à imitação barata dos tempos de glória. Nesta jogam os A-ha, que no Parque da Bela Vista conseguiram tocar um público que, notoriamente, não era conhecedor profundo de todos os recantos da discografia da banda synth-pop fundada em Oslo há redondos 40 anos, mas que soube entrar no jogo.
Com uma banda em que o núcleo duro, colocado na frente do palco, está perfeitamente delimitado - Magne Furuholmen nos teclados, Pal Waaktar-Savoy na guitarra e Morten Harket como vocalista -, os A-ha são naturalmente mais numerosos em concerto, conseguindo jogar em território pop com armas do rock.
O público começa por recebê-los, sejamos francos, como se fossem a banda da primeira parte do concerto dos Duran Duran, reagindo de forma fria a 'Sycamore Leaves', canção do arranque dos anos 90 (posterior, portanto, aos maiores 'hits' da banda), e também não se mostrando particularmente atenta à versão de 'Crying in the Rain', dedicada na Bela Vista às vítimas do atentado da noite passada em Oslo. "É um dia triste na Noruega", disseram.
Paulatinamente, os méritos dos A-ha começam a ser reconhecidos, especialmente a partir de 'Train of Thought', vitaminada na sua barragem de teclados ultra 80s. Começa também a evidenciar-se a voz bem preservada de Morten Harket, senhor de sobriedade inatacável, blusão de cabedal impecavelmente assente num corpo também ele tratado com cuidado, não denotando os 62 anos de vida.
Num concerto em crescendo, o 'click' decisivo dá-se com uma impressionante 'Hunting High and Low', primeiro em registo acústico, com piano, voz e guitarra, depois com o contributo de toda a banda, transformando o que era uma balada frágil num épico que a multidão entoou com fervor. Depois, os A-ha colheram o que semearam: 'The Sun Always Shine on TV' mostrou-se frenética e é recebida com eletricidade, 'The Living Daylights' contou novamente com coro popular, e sobre 'Take On Me', momento que encerrou um concerto de rigorosos 75 minutos, parafrasearemos agora uma passageira frequente do Rock in Rio lisboeta: levanta poeira. Se há êxitos que não morrem, é porque não os deixamos morrer. Olhem lá que belo concerto.
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