21 janeiro 2022 3:17
Carolina Deslandes no Coliseu dos Recreios, em Lisboa
Carolina Deslandes, um dos nomes mais celebrados da pop portuguesa atual, foi ao Coliseu de Lisboa fazer a revisão da matéria dada e presentear os fãs com as canções que vão construir o seu futuro próximo. Os amigos Agir, Bárbara Bandeira, Bárbara Tinoco e Carlão juntaram-se à festa
21 janeiro 2022 3:17
Há quem a adore e também há, certamente, quem não a suporte, porque o sucesso tem dessas coisas. Uma coisa é indiscutível: ninguém fica indiferente a Carolina Deslandes. E isso, pesados os prós e os contras, só pode ser uma coisa boa. Ao fim de dez anos de percurso, ela é uma das artistas pop mais celebradas do país e tem um punhado de canções infalíveis como garante desse estatuto. Esta quinta-feira, num concerto no Coliseu dos Recreios que durou para lá de duas horas – o primeiro dos quatro agendados para as salas nobres de Lisboa e Porto neste fim de janeiro –, vestiu-se com capa de super-heroína, escolheu a sua peruca mais vistosa e deu ao seu público, fiel como poucos, tudo aquilo que ele queria e muito mais.

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS
A impaciência de uma plateia maioritariamente jovem, alguma mesmo muito jovem, fez-se sentir com peso nos 20 minutos que o concerto demorou a arrancar – quem pensava que a pandemia tinha mudado algo nos horários tardios dos concertos em Portugal, é melhor começar a desenganar-se – mas quando a sombra de Deslandes surgiu bem alto no palco, foi uma verdadeira explosão aquilo que se sentiu na sala praticamente lotada. Abrindo o espetáculo com a fasquia bem alta, estiveram as canções de “Mulher”, de 2020, “um dos projetos de que me orgulho mais”: a ‘Tempestade’ num copo de água, a afirmação de que vai fazer o que lhe ‘Apetece’, um ‘Não Me Importo’ que é provavelmente o “rebuçado” mais bem embrulhado de todo o seu reportório (aqui com interferência de ‘Ready or Not’, dos Fugees) e o muito participado ‘Vergonha na Cara’, dedicado às “amizades tóxicas”, aos “patrões abusadores” e àqueles “namorados” que precisam de ser despachados.

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS
Entre discursos espontâneos, e outros bem ensaiados, sobre a sobrevivência da cultura em tempos de pandemia e o seu amor pela música, pancadinhas nas costas pela nomeação para os Grammys (latinos) e recordações daquele momento em que só vendeu 12 bilhetes para um concerto, aquando da edição do seu segundo álbum, Deslandes cantou os amores e desamores que a trouxeram até ao momento presente. Depois de uma ‘Sinais de Fumo’ cantada com o fortíssimo coro que a acompanhou durante grande parte do concerto, recuou a “Casa”, o álbum de 2018 que cimentou o seu sucesso, para recuperar o balanço brasileiro de ‘A Miúda Gosta’, ‘Não me Deixes’ e uma ‘Nuvem’ dedicada ao avô, que a demoveu de seguir o curso de direito para ser a artista que queria ser. “Tinha muita necessidade de aprovação e achava que não cantava nem escrevia nada de jeito”, admite, “às vezes, a frase certa no momento certo muda tudo”.

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS
De “Casa” saiu ainda o sucesso ‘Avião de Papel’, sem Rui Veloso mas com um gigantesco coro a acompanhá-la, e ‘Adeus Amor Adeus’. De seguida, depois de um pedido de desculpas ao pai pelo “decote” e de explicar que só fez um ensaio para o concerto porque esteve infetada com covid, partiu para um punhado de canções novas. E chegaram com aviso prévio: “O meu próximo disco não é um disco feliz. Estas canções nasceram de um período muito difícil da minha vida, mas dos corações partidos nascem as canções mais bonitas”. Acompanhada apenas pelo coro e guitarra acústica, mostrou, de rajada, ‘Conta-me’, ‘Amei-te’ (que diz ouvir-se a cantar com Camané – “Tenho o número dele, mas ainda não lhe liguei”) e ‘A Paz’, que revela ser o seu próximo single. Mas não se ficou por aí: primeiro cantou ‘Supermercado’ com Rita Rocha (de quem foi mentora no “The Voice Kids”), a primeira convidada especial da noite, depois chamou a amiga Bárbara Tinoco ao palco para, em trio, cantarem ‘Querido Ex-Namorado”, uma canção para “capitalizar a dor”, e, junto com o coro, serviram também um ‘Não Desistas Já de Mim’ que se tornou um dos pontos altos da noite.

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS
As surpresas não se ficaram por aí. E uma das mais recompensadoras terá sido outra nova canção, ainda inédita, chamada ‘Precipícios’, um explosivo êxito ali à espreita apresentado em dueto com Carlão. O colega de júri do “The Voice Kids” despediu-se da sua fugaz, mas intensa, participação com rasgados elogios (“És a maior”) e viu-os devolvidos com direito a provocação: “Parece que cada vez que o homem aparece está sempre mais bonito”. Na reta final do corpo principal do concerto, ouviram-se, ainda, uma sensível ‘Por Um Triz’, a “celebração das relações que não duraram para sempre mas duraram” que levou ao Festival da Canção, uma versão contra o patriarcado da tradicional ‘A Saia da Carolina’ e ‘Não É Verdade’, o single que a apresentou ao mundo, pós-Ídolos, em 2012.
A saída de palco antes do encore foi automaticamente preenchida com gritos de “só mais uma”. Sabia-se muito bem qual era a “uma” que faltava, mas afinal vieram três. A primeira, ‘Leva-me a Casa’, retirada do projeto “Mercúrio”, que gravou em 2020 com Jimmy P, foi servida em dueto sentido com a amiga Bárbara Bandeira; a segunda, claro, ‘A Vida Toda’, o seu maior sucesso até à data e a canção que, assume, foi “a que me trouxe aqui”; e, a terminar, ‘Mountains’, o dueto que faltava com o amigo de longa data Agir.

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS
Mais de duas horas em palco não é para todos, mas Carolina Deslandes não é uma artista qualquer. Nem todos conseguem encher Coliseus, chegar a um público tão vasto, e poucos têm a destreza de manter os fãs alimentados constantemente. Ela fá-lo, desmesuradamente bem, e o séquito de seguidores devolve-lhe a gentileza. Em palco, a linha entre a demasiada informação e as simples partilhas com uma sala cheia de “amigos” é ténue e Deslandes pisa-a, assumidamente, quando deixa no ar que se tivesse o telemóvel consigo em palco para ligar a Camané, como um fã lhe sugeriu, o Tinder ia “apitar por todo o lado” (“estou a brincar, eu não tenho Tinder”) ou quando começa frases com “se calhar não vos devia contar isto, mas vou contar”. Antes dos agradecimentos finais à banda, à equipa, ao quinteto de cordas que esteve em palco consigo, ao coro e aos convidados, deixou uma das frases mais emocionadas da noite: “Vocês não sabem, mas vir aqui e cantar, muitas vezes salva-nos a vida”.

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS

CAROLINA DESLANDES – CONCERTO COLISEU DOS RECREIOS