Europa aperta o cerco às embalagens e desafia a indústria
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Ambiente: comissão propõe regulamento que estabelece medidas restritivas e impõe “metas ambiciosas” para travar o desperdício e fazer da embalagem sustentável uma regra no mercado. Em prol da economia circular: reduzir, reutilizar e reciclar
Os pratos e copos descartáveis servidos nos restaurantes e cafés para consumo no interior do estabelecimento serão proibidos. Outras embalagens de utilização única usadas para acondicionar frutas e legumes ou os frascos miniatura de champô oferecidos nos hotéis também terão os dias contados na União Europeia (UE). As saquetas de chá, as cápsulas de café e os adesivos para frutas e vegetais terão que ser obrigatoriamente compostáveis. Vamos poder receber um valor monetário por cada garrafa de plástico ou lata de alumínio que colocarmos nos sistemas de devolução e depósito, que vão passar a existir nos supermercados, estações ferroviárias e outros pontos de grande afluência.
Tudo isto fará parte do quotidiano da UE nas próximas décadas de acordo com a proposta da Comissão de regulamento sobre embalagens, que visa combater esta fonte crescente de desperdício — cada europeu gera, em média, por ano, 177 mil quilos de resíduos de embalagens. Para isso, impõem-se regras e, pela primeira vez, fixam-se metas para redução dos resíduos (em 15% até 2040 por Estado-membro per capita, face a 2018), para a reutilização de conteúdo reciclado a incorporar nas novas embalagens plásticas, e reiteram-se as atuais metas da reciclagem. O objetivo é que todas as embalagens sejam recicláveis até 2030, como já previa o Plano de Ação para a Economia Circular.
“O caminho é por aí, mas a ambição das metas e o calendário a elas associado, que é muito curto, causa-nos alguma preocupação. Além disso, o documento estabelece medidas que precisam de algum tempo de adaptação em toda a cadeia de valor”, observa Ana Cristina Carrola, vogal do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente. É o caso, exemplifica, da gestão das embalagens compostáveis enquanto resíduos, já que, em Portugal, “a recolha seletiva e as infraestruturas de tratamentos biodegradáveis ainda se encontram um pouco incipientes”. Ou da disponibilidade de matéria-prima secundária com a qualidade necessária exigida para a reincorporação em novas embalagens, acrescenta Pedro Simões, diretor-geral da Novo Verde: “E se não for possível, são necessárias tecnologias que permitam tratar os resíduos sem grande qualidade para serem aproveitados, pois estamos a substituir matérias-primas virgens por secundárias, por resíduos.”
A Comissão Europeia estima que, até 2030, estas regras permitam reduzir as emissões de gases com efeito de estufa provenientes de embalagens para 43 milhões de toneladas, o consumo de água em 1,1 milhões de metros cúbicos e os custos dos danos ambientais para a economia e a sociedade em €6,4 mil milhões. E ainda gerar mais de 600 mil empregos no sector da reutilização.
Depois de ter estado em consulta pública nos Estados-membros, a proposta foi debatida ontem — quinta-feira, 16 de março — pela primeira vez, pelos ministros do Ambiente da UE, prevendo-se a sua aprovação até ao final de 2024. “A negociação está numa fase muito inicial e várias alterações substanciais podem ocorrer”, frisa Ana Cristina Carrola, adiantando que “não é consensual” a aplicação da figura do regulamento, que é de aplicação obrigatória e automática, em detrimento da atual diretiva, passível de ser adaptada ao contexto de cada país.
Mira ao plástico, ao consumidor e à inovação
São, portanto, vários os desafios que se colocam às diferentes fileiras de materiais que compõem as embalagens, a algumas mais do que a outras. Bruxelas mantém mão pesada para o plástico, sector que continua a ser alvo de “discriminação”, diz Nuno Aguiar, da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos (APIP): “Continuam a existir propostas de eliminação, restrição e colocação no mercado de algumas embalagens que não fazem qualquer sentido. E a incorporação de reciclado é também um grande desafio, porque nem todos os materiais reciclados podem ser utilizados no contacto alimentar.”
No entanto, a peça-chave deste puzzle é o consumidor, lembra o coordenador técnico da APIP, porque “podemos ter a embalagem mais reciclável possível, mas se o consumidor não fizer a sua parte, separando e depositando a embalagem, perde-se todo o esforço que se fez a montante”. E por isso é necessário educá-lo e incentivá-lo. “O agregado familiar que separa e deposita tudo nos ecopontos corretos paga o mesmo que aquele coloca tudo no indiferenciado. É preciso rever a legislação”, sustenta Paulo Sousa, CEO da Colep, fornecedora de embalagens metálicas e plásticas, para quem a regulamentação permite abrir “uma série de oportunidades” para a inovação na embalagem.
E é precisamente com essa missão, refere Pedro Simões, que surge o Novo Verde Packaging Enterprise Award, o prémio a que o Expresso se associa e que distingue os projetos mais inovadores no sector das embalagens [ver caixa]: “Procuramos soluções no âmbito da economia circular e que deem resposta aos desafios que este regulamento vem colocar.”
Inovar vale €25 mil
O prémio distingue o projeto que ajude a melhorar a produção das embalagens, tornando-as sustentáveis e fiéis à economia circular
O prémio
O Novo Verde Packaging Enterprise Award visa dinamizar a investigação e apoiar o melhor projeto no sector das embalagens e resíduos de embalagem. O vencedor recebe um prémio de €25 mil para aplicar na execução do projeto.
O desafio
Apresentar uma solução inovadora que possibilite melhorias significativas em qualquer parte do ciclo de vida das embalagens e com impacto positivo na gestão de resíduos.
Os candidatos
O concurso destina-se à indústria, comércio, serviços, academia e a outras áreas tecnológicas relacionadas com o sector das embalagens.
As datas importantes
As candidaturas podem ser submetidas até 31 de março em www.novoverde.pt/packaging-enterprise-award. As cinco finalistas serão anunciadas até 30 de abril. Em maio, o júri elegerá a melhor.
Um novo prémio
A iniciativa Novo Verde Packaging Enterprise Award, que recompensa um projeto inovador no sector das embalagens, conta nesta edição com o Expresso como parceiro de media. Este prémio, que distingue trabalhos de investigação e desenvolvimento (I&D) com origem na indústria, distribuição ou nas áreas tecnológicas, terá um valor global de €25 mil.
Textos originalmente publicados no Expresso de 17 de março de 2023
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