Tecnologia

Google. O futuro da gigante da Internet está nas mãos dos tribunais americanos

O Tensor promete tornar a Google um concorrente sério nos processadores
O Tensor promete tornar a Google um concorrente sério nos processadores

O mais recente processo em tribunal contra a Alphabet pede a venda de parte do grupo empresarial. E se o juiz der provimento a esse pedido?

Em menos de três anos, a Alphabet foi levada cinco vezes aos tribunais americanos – mas são três os processos que confirmam de que algo mudou na relação entre a gigante da Internet e as autoridades dos EUA. Uma das queixas juntou, em 2020, os procuradores de 15 estados com o Texas à cabeça de um processo de posição dominante do Google nas pesquisas da Internet; em 2021 arrancou um segundo processo com o apoio de 36 estados em 2021 e a alegação de posição dominante nas lojas de aplicações para telemóveis; e o caso mais recente foi conhecido na semana passada, com a queixa apresentada nos tribunais pelo Departamento de Justiça e oito estados dos EUA, que apontam o dedo a práticas anti-concorrências na publicidade na Internet em geral. Na UE, o grupo Alphabet já tem o recorde das multas mais chorudas devido a práticas relacionadas com a publicidade, mas nos EUA, os mais recentes processos podem transformar radicalmente o grupo empresarial a que costumamos chamar Google.

“O governo dos EUA sabe que em monopólio não há concorrência. Pode haver uma tendência para proteger as empresas do próprio país, como acontece em muitos outros países, mas também costuma ser dado ênfase aos direitos dos consumidores. E há o interesse das autoridades em garantir a livre concorrência, além de evitar monopólios que não favorecem consumidores e outras empresas”, descreve Paulo Trezentos, diretor executivo da empresa portuguesa Aptoide.

Para Trezentos, os processos contra a Google não são propriamente novidade: além de ter participado com queixas que poderão ter contribuído para a multa de mais de €4,125 mil milhões na Europa, o líder da Aptoide também cooperou com os procuradores americanas que participaram na queixa apresentada por 36 estados devido a práticas relacionadas com o alegado benefício da loja de apps Play, da Alphabet, em detrimento de lojas como a Aptoide, ou outras que competem pela venda de apps do sistema operativo Android (que é detido pela Alphabet).

A Alphabet reagiu ao mais recente processo pondo em causa a neutralidade do Departamento de Justiça dos EUA (DoJ). “O processo iniciado pelo DoJ tenta apurar vencedores e derrotados num mercado altamente concorrencial como é o sector das tecnologias da publicidade. Esta ação largamente replica um processo infundado liderado pelo Procurador Geral do Texas (em 2020), e grande parte foi rejeitada por um tribunal federal. O DoJ está a repetir o argumento furado de que há um abrandamento da inovação, um aumento de taxas de publicidade, e que há a intenção de tornar mais difícil o crescimento de milhares de pequenos negócios e editores”, responderam os serviços institucionais da Google.

O processo iniciado em 2020 ficou seguramente aquém dos intentos da Procuradoria Geral do Texas, mas não foi além de uma meia vitória para a Alphabet. Nesse processo, os juízes não deram como provada a acusação relacionada com o abuso de poder de um acordo de parceria entre Meta (Facebook) e Alphabet.

No mais recente processo, o contexto e as provas usadas são diferentes dos de 2020. Documentos internos usados na queixa apresentada pelos DoJ com mais oito estados, é mesmo revelada uma advertência de um executivo da Alphabet, junto dos pares, a referir os riscos a que o grupo empresarial se sujeita devido à concentração de poder.

“Em termos de analogia, é como se o Goldman (Sacks) ou o Citibank fossem donos da New York Stock Exchange (a denominação em inglês da entidade reguladora da Bolsa de Nova Iorque)”, referiu esse executivo da Alphabet, segundo a mais recente acusação lançada pelo DoJ contra a Alphabet.

Do lado de lá do Atlântico, estas ações em tribunal não deixam de produzir reações. “Verifica-se que a Google (Alphabet) tem de jogar em dois tabuleiros. Nos EUA, estes casos são encaminhados para os tribunais. Mas na Europa, estes processos não são decididos pelos tribunais e vêm das obrigações impostas a nível da regulação”, atenta Paulo Trezentos.

O tabuleiro europeu revelou-se especialmente doloroso para tesouraria, mas, por sua vez, o tabuleiro americano pode, no limite, acabar com o que é hoje a Alphabet.

O mais recente processo, iniciado num tribunal da Virgínia, pretende forçar a venda de parte da empresa responsável por diferentes ferramentas publicitárias na Internet, refere o New York Times.

A eventual separação das unidades de negócio já não é propriamente nova. No final do mandato do Presidente Donald Trump, o Congresso, que reúne as câmaras parlamentares dos EUA, já havia iniciado inquirições aos líderes dos maiores grupos tecnológicos – e o nome da iniciativa política conhecida como Breaking Up the Big Tech (tradução possível: “partir as grandes tecnológicas”) já dava como possível a obrigatoriedade de algumas das grandes marcas tecnológicas terem mesmo de se separar – através de venda ou constituição de novas empresas - de parte dos negócios, para evitar monopólios ou falta de concorrência no mercado.

No circuito político, há quem aponte o dedo a uma alteração na forma como o governo dos EUA, agora com John Biden na Casa Branca, elevou a intensidade do escrutínio do poder das grandes tecnológicas.

O facto de o Departamento de Justiça ter participado na mais recente queixa contra a Alphabet pode ser encarado como um sinal de apoio político a um processo que terá de ser sempre decidido nos tribunais – ao contrário do que sucedeu na UE, com a aplicação da multa por parte da Comissão Europeia, que foi depois confirmada pelo Tribunal de Justiça da UE.

Além da participação no mais recente processo judicial contra a Google, há outros sinais de que as autoridades americana estão atentas aos intentos das tecnológicas: recentemente, a Comissão Federal do Comércio solicitou aos tribunais que bloqueassem a compra de uma startup por parte da Meta, e antes disso questionou a Microsoft sobre a compra da produtora de videojogos Blizzard, por 69 mil milhões de dólares. O cerco político e judicial está longe de ser um exclusivo da Alphabet.

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