Justiça

Ministério Público pede multa para Mamadou Ba por difamação de Mário Machado

Ministério Público pede multa para Mamadou Ba por difamação de Mário Machado
MIGUEL A. LOPES/LUSA

“Não se pode dizer que os condenados e as pessoas que estiveram presas não têm direito à honra”, considera o Ministério Público. Em causa está uma publicação do ativista antirracismo na rede social X (antigo Twitter)

O Ministério Público (MP) pediu esta quarta-feira a condenação do ativista antirracismo Mamadou Ba a uma pena de multa pelo crime de difamação do militante nacionalista Mário Machado.

"Não se pode dizer que os condenados e as pessoas que estiveram presas não têm direito à honra. Não podemos afirmar que o assistente não se possa sentir ofendido", considerou a procuradora do MP nas alegações finais do julgamento, realizado no Juízo Local Criminal de Lisboa, sublinhando que a "honra do assistente [Mário Machado] também existe".

Em causa está uma frase escrita por Mamadou Ba na rede social X (antigo Twitter), na qual o ativista antirracismo considerou Mário Machado uma das figuras principais do assassinato do cidadão cabo-verdiano Alcindo Monteiro em 1995. Para a procuradora, o objeto deste processo é unicamente saber se a frase integra ou não o crime de difamação imputado a Mamadou Ba, salientando que "tudo o resto é ruído".

"Esta frase leva qualquer destinatário a entender o assistente Mário Machado como sendo assassino de Alcindo Monteiro", disse.

Considerou ainda que Mamadou Ba, sendo conhecedor do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça relativo à morte de Alcindo Monteiro, proferiu "uma meia-verdade", uma vez que Mário Machado não foi condenado pelo homicídio de Alcindo Monteiro.

O advogado de Mário Machado, José Manuel Castro, corroborou a posição do MP, considerando "verdadeiramente inadmissível" que se possa defender que nem todas as pessoas, independentemente do seu passado controverso, tenham direito à sua honra.

"Não se admite que, passados 20 e tal anos, se venha dizer que Mário Machado é um dos participantes envolvidos na morte de Alcindo Monteiro", disse o advogado, alegando que Mamadou Ba passou a ideia de que o dirigente nacionalista é um assassino.

Considerou assim que a frase proferida por Mamadou Ba é "uma mentira ou uma meia-verdade repetida até à exaustão" e, quanto à medida da pena, sublinhou que a juíza saberá aplicar "uma pena proporcional e adequada".

Pedido de absolvição

A advogada de Mamadou Ba, Isabel Duarte, lembrou que Mário Machado é "um nazi e um criminoso assumido" e que interveio indiretamente na morte do cidadão cabo-verdiano, tendo antes disso participado com um bastão em várias agressões a outras pessoas de raça negra.

Por isso, pediu a absolvição do seu cliente, defendendo que a frase "não contém elementos longe da realidade" e que a mesma resultou da atuação antirracista de Mamadou Ba nas redes sociais.

Entendeu ainda a advogada que este processo instaurado por Mário machado a Mamadou Ba foi feito de forma seletiva, pois "Mário Machado escolheu criteriosamente o seu cordeiro pascal" neste ativista antirracista.

"Viemos julgar um homem [Mamadou Ba] com base na banalização do mal", criticou ainda Isabel Duarte.

Quanto às críticas ao "ruído" deste processo aludido pela procuradora e pelo advogado de Mário Machado e que levou uma galeria de políticos e outras figuras públicas a depor como testemunhas do arguido, Isabel Duarte contrapôs que isso resultou do facto de este processo ter "conotações políticas" porque Mário Machado e Mamadou Ba estão em polos opostos, sendo que aquele último "teve o apoio da sociedade civil".

Nas palavras de Isabel Duarte, citando uma das testemunhas, Mário Machado é um "racista assumido e um perigo social".

No final da audiência, o arguido Mamadou Ba usou da palavra para reiterar que "Mário Machado teve um papel central na promoção da violência política que esteve na origem da morte de Alcindo Monteiro e ainda continua a ter no contexto atual".

"Ele assume-se como um combatente nacionalista, orgulhosamente filiado ao supremacismo" branco, disse Mamadou Ba, acrescentando que esta filiação à "ideologia da morte responsabiliza-o inequivocamente pelas consequências da promoção desta ideologia".

O ativista criticou a decisão do Ministério Público (MP) de acompanhar a queixa particular apresentada contra si pelo militante nacionalista Mário Machado e defender em julgamento a aplicação de uma pena de multa. À saída do Juízo Local Criminal de Lisboa, Mamadou Ba considerou que esta e outras posições confirmam "a capitulação do MP perante as manobras de manipulação da extrema-direita".

Disse também que o MP deve “defender o interesse público” e não devia ter acompanhado a queixa particular de Mário Machado, tendo ainda criticado o juiz de instrução criminal Carlos Alexandre por ter decidido levar este processo a julgamento e apelou para que a juíza de julgamento "tenha mais consciência da responsabilidade que neste momento tem em cima da mesa, que é saber o que é que o Estado de direito tem de fazer perante uma circunstância como esta". Reiterou também tudo o que afirmou sobre Mário Machado, incluindo aquilo que o levou a julgamento, dizendo "era o que faltava retirar seja o que for que já disse".

A leitura da sentença está marcada para 20 de outubro, às 11h00.

Enquanto decorriam as alegações finais, um grupo de cerca de 20 pessoas concentrou-se pacificamente junto ao edifício B do Campus de Justiça em solidariedade com Mamadou Ba.

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