Covid-19. Bruxelas tenta melhorar a cooperação com as farmacêuticas para acelerar a produção de vacinas
Thierry Breton
Thierry Monasse/Getty Images
Depois do embate com a AstraZeneca por causa dos atrasos na produção de vacinas, a Comissão Europeia tenta agora melhorar a comunicação com as farmacêuticas. Bruxelas quer servir de ponto de contacto para ajudar as empresas a ultrapassarem problemas de produção e a aumentarem o número de vacinas
Na corrida para vacinar a população europeia, a Comissão Europeia tenta melhorar a comunicação e a cooperação com as farmacêuticas. Depois do braço de ferro da semana passada com a AstraZeneca, que levou à criação de um mecanismo para controlar a exportação de vacinas para territórios situados fora do espaço da União Europeia, Bruxelas muda de estratégia: baixa o clima de tensão e avança com a criação de um grupo de trabalho liderado pelo comissário Thierry Breton.
O francês, que tem a pasta do Mercado Interno, promete disponibilidade "24 horas por dia, sete dias por semana" para ouvir as farmacêuticas e ajudar a encontrar soluções para problemas na cadeia de abastecimento e na produção.
"Há que garantir que os problemas são comunicados e depois vemos como podemos ajudar", diz Breton, em entrevista a um grupo de correspondentes em Bruxelas, que incluiu o Expresso. O comissário argumenta com a experiência profissional anterior - foi administrador e presidente de várias multinacionais - para garantir que conseguirá articular-se com a indústria farmacêutica para ajudar a acelerar a produção de vacinas e garantir que as doses contratualizadas chegam aos 27 Estados Membros.
"Ninguém tem a experiência de aumentar a produção de forma tão rápida", diz, referindo-se desde logo à BioNTech, Moderna e AstraZeneca, com quem a Comissão fechou contratos e cujas vacinas já têm autorização da Agência Europeia de Medicamentos para ser distribuída na UE.
Breton admite que o desenvolvimento e aprovação das vacinas podia ter acontecido mais rapidamente do que se esperava, não dando tempo para assegurar a produção de doses suficientes para os primeiros meses após a autorização. "Acredito que todos estavam à espera que passassem mais meses antes de serem aprovadas pela Agência Europeia de Medicamentos".
Agora, os atrasos estão à vista. Primeiro foi a Pfizer a parar as máquinas para poder otimizar e aumentar a produção. Depois foi a AstraZenaca a revelar que afinal só conseguiria entregar 40 milhões dos 120 milhões de doses que a UE esperava receber até final de março.
A presidente da Comissão Europeia tem estado debaixo de fortes críticas, porque os contratos com as farmacêuticas foram fechados pelo executivo comunitário em nome dos 27. Von der Leyen continua a dizer que a estratégia foi a correta, empurrando responsabilidades para as farmacêuticas e pedindo paciência até que cheguem todas as doses.
Esta terça-feira, numa carta conjunta assinada por Von der Leyen e António Costa aos restantes líderes europeus, a Comissão e a presidência portuguesa da UE defendem que é preciso "conjugar todos os esforços com a indústria para aumentar o fornecimento de vacinas e a capacidade de produção na União Europeia".
Na missiva é ainda dito que o executivo comunitário deve mobilizar todos os recursos "seja através investimento adicional na modernização ou reorientação de instalações existentes ou na construção de novos locais, facilitando acordos entre fabricantes através de cadeias de fornecimento ou qualquer outra solução".
É isso que a equipa de Breton tentará agora fazer. Mais de 80% das doses de vacinas das maiores farmacêuticas são produzidas na UE, mas a capacidade de produção está longe de estar adaptada a uma pandemia. Por outro lado, as matérias-primas vêm muitas vezes de fora do espaço europeu.
O comissário francês diz que, caso as empresas enfrentem falhas na cadeia de abastecimento de "determinados componentes", a Comissão poderá tentar procurar o seu "fornecimento na Europa ou noutro lugar". Outro exemplo tem a ver com as linhas da produção. "Uma coisa é produzir a vacina, outra é colocá-las em frascos", diz Breton, mostrando-se disponível para agilizar o contacto com outras empresas que possam ajudar a resolver este tipo de "obstáculos".
O novo grupo de trabalho - ou 'task force' - poderá também servir para apoiar a AstraZeneca já nos próximos meses. "Sim", diz Thierry Breton. Acredita que é possível ajudar a empresa a recuperar o atraso na produção europeia prevista para o atual trimestre, escusando-se, no entanto, a entrar em detalhes. O francês diz que a Comissão não quer fazer o trabalho das farmacêuticas, mas acredita que "colocar pressão" também "ajuda", principalmente se "isso levar a soluções", algo "que qualquer CEO [líder executivo] compreende".
Esta quarta-feira, a empresa britânica GSK anunciou que vai produzir a vacina contra a covid-19, da CureVac, na fábrica que tem no sul da Bélgica, numa cooperação que pretende dar resposta às novas variantes do vírus. Também a francesa Sanofi vai produzir vacinas da Pfizer. A expectativa da Comissão é a de que possa haver mais cooperação entre empresas concorrentes para acelerar a vacinação europeia que para já decorre mais lentamente que a britânica, a norte-americana ou a israelita.