Coronavírus

Covid-19. Reunião do Infarmed entre a esperança (o pico que já passou e as vacinas que aí vêm), as dúvidas e o risco de “aliviar a mola”

A reunião no Infarmed sobre a covid-19
A reunião no Infarmed sobre a covid-19
Manuel de Almeida/Lusa

Portugal encontra-se numa “tendência de descida”, depois de ter atingido “a incidência máxima cumulativa” a 25 de novembro. Os óbitos atingirão um máximo no final deste mês e lá para o verão do próximo ano perspetiva-se um regresso à normalidade. Pelo meio é necessário imunizar a população e também aí se vislumbra um sinal de esperança

A reunião desta quinta-feira do Infarmed começou com uma “boa notícia” e terminou com uma nota de otimismo. André Peralta Santos, responsável pelas estatísticas da Direção-Geral da Saúde, anunciou que se atingiu “a incidência máxima cumulativa no dia 25 de novembro” e que há agora “uma tendência de descida”. “O abrandamento do crescimento é uma tendência generalizada na região Norte”, especificou Óscar Felgueiras, que integra a equipa da Administração Regional de Saúde do Norte.

Por sua vez, Baltazar Nunes, responsável pela unidade de investigação epidemiológica do Instituto Ricardo Jorge (INSA), refere que o indicador RT, que reflete o número de pessoas que cada caso positivo contagia, continua a descer e está agora em 0,99 a nível nacional. Ou seja, uma pessoa infetada não chega a contagiar outra. De acordo com o especialista, Portugal entrou para o conjunto de países que está em “fase de decréscimo das notificações”. Mas esta descida da incidência é recente e é preciso esperar mais algum tempo, acrescentou.

“Logo que aliviamos a mola, a mola volta a subir”

Fazendo projeções de curto prazo, Manuel Carmo Gomes, professor de Epidemiologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, disse que os óbitos atingirão um máximo no final deste mês, com uma média de 76 óbitos diários, e que o total de óbitos acumulados em 2020 com covid-19 estará na ordem dos 6000 a 6500 óbitos Os dados desta quarta-feira contabilizavam 4645).

O especialista chamou a atenção para a subida de casos após o alívio das medidas, como ocorreu na Holanda e na República Checa. “Isto é um aviso para nós. Logo que aliviamos a mola, a mola volta a subir” e assim será até à vacinação de uma parte significativa da população, concluiu.

João Gonçalves, professor da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, declarou que “os doentes que tiveram mais sintomas e foram ao cuidados intensivos são os que têm mais proteção”, sublinhando que “é isso que a vacina vai trazer: uma elevada proteção sem sintomas”. Por sua vez, Fátima Ventura, do Infarmed, anunciou que há 274 vacinas, estando 59 já em testes clínicos e 11 na terceira fase de testes. A União Europeia assegurou seis delas.

“Um milhão de pessoas já teve contacto” com o vírus

O presidente do Conselho Nacional de Saúde, Henrique Barros, referiu que, com os dados que tem, “podemos imaginar que neste momento haverá já um milhão de pessoas que teve contacto” com o vírus. “Entre 15% a 20% da população já estará imunizada, por contacto com vírus. Se estará eficazmente protegida é uma das faces desta incerteza que temos”, adiantou.

Por sua vez, Carla Nunes, da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade de Lisboa, detalhou dados estatísticos sobre a perceção de risco associado à pandemia e outras variáveis. O nível de confiança nas vacinas registou uma melhoria na última quinzena, com 11,5% muitos confiantes e 7,4% nada confiantes em relação à segurança e eficácia (65% mostram-se confiantes ou muito confiantes). São mais as mulheres e pessoas em idade ativa que se dizem pouco ou nada confiantes.

Quanto à intenção de tomar a vacina, também se verificou uma evolução positiva nos últimos 15 dias, com 30% dos inquiridos disponíveis para a tomar logo que possível e 6% a dizerem que nunca a vão tomar. 62% dos inquiridos querem esperar algum ou muito tempo para tomar a vacina. As mulheres têm “uma postura mais conservadora” do que os homens.

As dúvidas de Marcelo

Ao tomar a palavra, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, colocou quatro questões aos especialistas:

1. “Como veem o mês de dezembro em relação ao início de 2021? Parece depreender-se que apesar da evolução há necessidade de consolidação - em termos de internamentos, cuidados intensivos.”

2. "No quadro das medidas a adotar, como veem, quanto ao Natal e fim ano, a deslocação e mobilidade das pessoas? Qual é o grau de relevância?”

3. “Quanto à imunidade da população, disse o professor Henrique Barros que haverá mais de 10% de imunizados. Há outros estudos, um painel serológico, que apontam para 4 ou 5%. Temos uma dúvida, os estudos do professor Henrique Barros são muito focados no Norte, podem ser muito específicos.”

4. “Quanto a vacinas, apontou fatores de reticências da população portuguesa. Mas há um indicador prévio, que é o da subida ao longo das últimas semanas da confiança na vacina. Não pode acontecer o que aconteceu na vacinação contra a gripe, em que havia tradição de reticência e acabou num protesto pela insuficiência do número de vacinas?”.

Baltazar Nunes, do INSA, respondeu com uma sugestão: “Tentar reduzir mais ainda os contactos" até ao Natal, eventualmente criando “bolhas de Natal: a família resumir ao máximo contactos externos nos 14 dias anteriores – e o mesmo no período a seguir.” Quanto a restrições de circulação entre concelhos, será determinante perceber “se a população está ou não disponível”.

“Chegar ao verão já próximos de retomar a normalidade”

O epidemiologista Manuel Carmo Gomes mostrou-se “otimista em relação ao fim do ano” mas advertiu que isso dependerá da aplicação e cumprimento das medidas restritivas. “As medidas não devem ser aliviadas significativamente”, disse o professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. O especialista antecipou “um aumento dos contágios na semana das festas” e “um recrudescimento no início de janeiro”. No entanto, no fim de março já haverá uma quantidade suficiente de pessoas imunizadas capaz de travar os contágios, prognosticou.

“Estou otimista em relação ao período até ao fim do primeiro trimestre e à segunda metade do ano. Tenho esperança em relação ao verão e de chegarmos lá já próximos de retomar a normalidade”, acrescentou. Quanto à vacinação, Carmo Gomes lembrou que “Portugal tem tradicionalmente uma boa compreensão e adesão”, pelo que disse não ter dúvidas de que “vai acontecer o mesmo com esta”. “É tudo uma questão de tempo”, rematou.

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