Coronavírus

Reunião do Infarmed: pico previsto para início de dezembro, especialistas pedem firmeza

Governo, Presidente, conselheiros de Estado e partidos voltaram a ouvir os especialistas sobre a pandemia, dois meses depois. Primeiros dados revelados mostram que, a seguir ao contexto familiar, é no trabalho que o vírus mais se tem espalhado. Mas em 40% dos casos não há dados sobre a forma de contágio. Especialista da DGS avisa que as medidas, agora, vão demorar mais a ter efeito

Reunião do Infarmed: pico previsto para início de dezembro, especialistas pedem firmeza

Isabel Leiria

Jornalista

Na reunião do Infarmed, convocada pela primeira vez desde há dois meses, o diretor de serviços de informação e análise da DGS informou que o organismo tem indicação do link epidemiológico, ou seja, a origem da infeção, para cerca de 60% dos casos recentes onde existe informação - cruzando análise laboratorial com os dados recolhidos pelos médicos. Entre estes, confirma-se que o contágio mais frequente ocorre em contexto familiar - seguindo-se depois o contexto laboral, lares e em menor dimensão ainda o contexto escolar e social.

Segundo André Peralta Santos, os números confirmam a maior incidência de novos casos na região Norte, que é superior a 960 novas infeções nos últimos 14 dias por 100 mil habitantes, um dos critérios definidos pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC) para medir a severidade da evolução epidemiológica. O número é muito elevado, tendo em conta que o limite de 240 por 100 mil habitantes já é considerado de risco. Nesta segunda vaga, o número de infeções por SARS-CoV-2 começou a subir de forma mais acentuada durante o mês de outubro na região Norte e com menos intensidade na região de Lisboa e Vale do Tejo.

Neste momento, a maior incidência de casos está na região do Grande Porto. Face às novas circunstâncias, as "medidas de restrição de mobilidade vão demorar mais a ter efeito", avisou.

Na região Norte, mais de 2,8 milhões de pessoas vivem em concelhos em que a taxa de incidência é superior a mais de 960 novos casos por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias. É o equivalente a quase 80% da população residente nesta região, explicou depois Óscar Felgueiras, professor de Matemática da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, que traçou o retrato da evolução epidemiológica na região Norte que continua a ser a mais preocupante.

Ainda assim, sublinhou o matemático, está a haver, em geral, um abrandamento de crescimento dos novos casos, sendo que há áreas onde já se verifica uma descida neste indicador, como é o caso de alguns concelhos do distrito do Porto.

Há 88 dias que os casos crescem de forma sustentada

O especialista que se seguiu confirmou a informação: o Rt está a decrecer, ou seja, a incidência está a desacelerar. "Continuamos a crescer mas com crescimentos menos acentuados", o que acontece desde o meio de outubro. Mas nada que permita relaxar as medidas para as próximas semanas, decisão que o Governo irá tomar na sexta-feira.

Segundo Baltazar Nunes, responsável do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, o indicador que mede o número de reprodução efetivo de casos (quantas pessoas cada infetado contagia em média) está agora em 1,11 a nível nacional. Este valor está acima de 1 há 88 dias, ou seja, há três meses que os novos casos crescem de forma sustentada. Além disso, a incidência é de 6500 casos por dia nos últimos cinco dias, o que representa seis vezes a incidência da 1ª onda.

É um valor muito "expressivo", diz Baltazar Nunes, mesmo admitindo que nos primeiros meses de epidemia não estivessem a ser diagnosticados todos os casos.

Pico até ao início de dezembro

Manuel Carmo Gomes, professor de Epidemiologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, sublinhou de seguida os "perigos" que ainda existem, em particular no mês que vem. O risco mantém-se elevado, mesmo com a tendência nacional para o Rt descer (desde o dia 11 de outubro), o que indicia redução do número de contactos, e com a redução da taxa média de aumento diário de novos casos (chegou a ser de 7% e 8%, o que significava que dez em dez dias duplicava o número de casos).

Assumindo que estas tendências positivas se mantêm, espera-se que entre o fim do mês e o início de dezembro o Rt esteja ao nível de 1, o que significa o pico desta segunda vaga. Assim sendo, esse pico deverá ocorrer entre 25 e 30 de novembro, com cerca de 7 mil casos por dia em média. Já o pico de mortes poderá acontecer na segunda semana de dezembro, com uma média diária de cerca de 95 a 100 óbitos. "Já estamos perto desses valores, mas há uma desaceleração do crescimento também."

"Se mantivermos o Rt abaixo de 1 continuamente, a onda desce mesmo", explica Manuel Carmo Gomes. Mas se se mantiver no 1, o país entra num planalto, como aconteceu na primeira vaga. Só que nessa altura a média de casos diários andava nas três centenas e não entre 6 e 7 mil casos como agora, com consequências muito graves a nível dos internamentos, óbitos e pressão sobre o SNS.

"Temos de ser firmes a trazer o R para baixo continuamente", apela o professor de Epidemiologia.

Marcelo disparou muitas perguntas e dúvidas

O Presidente ouviu todos os especialistas e depois levantou-se, com "algumas perguntas a fazer". Eram muitas, para todos os especialistas que se tinham ouvido.

  • "Disse que é preciso manter as medidas. Está a pensar nas ensaiadas em Portugal nos últimos tempos. Cabe nisso a graduação por grupos de municípios? Faz sentido graduar, ou há medidas que devem ser homogéneas?
  • Até onde devem ir as medidas? Em que situações extremas admitiria medida extrema, como no início da pandemia?
  • Por quanto tempo essas medidas?
  • Haverá outro pico a seguir a este? Em janeiro, fevereiro, é eventável a existência de novo pico?
  • O que é que pensa quanto a situação de stress nos cuidados intensivos?
  • Olhando para casos e internamentos, qual é a probabilidade de pressão, quer para a panóplia de medidas, quer para o comportamento dos portugueses, quer para a resposta do SNS?
  • Do que disse, parece resultar que as escolas são os locais onde há menor risco de contágio - parece. Importante saber se assim é.
  • Faz sentido ou não haver decisões sobre universidades, politécnicos ou secundário, de acordo com a análise do peso comparativo dos contágios nas escolas, como com o risco de fechadas as escolas, continuar a convivência
  • O risco na restauração é menor? - este é dos pontos mais discutidos e polémicos nas medidas a adoptar.
  • Quanto à vacinação, para além da esperança na resposta capaz dos políticos e para quando? Qual o calendário? Vimos com a vacina da gripe que é lento, estamos a falar de meses?

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: ILeiria@expresso.impresa.pt

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