O consenso preparado pelo presidente do Eurogrupo, Mário Centeno, não convenceu à primeira: nem a norte, nem a sul. E ao fim da primeira ronda de intervenções e três horas de reunião, Mário Centeno suspendia a videoconferência com todos os ministros europeus das Finanças - os da Zona Euro e os que não têm moeda única - para passar à negociação bilateral. Só perto da onze da noite desta terça-feira os ministros voltaram a falar a 27, para continuarem a discussão pela madrugada de quarta-feira.
Mas nem a tentativa de desbloquear um consenso noite fora deu frutos. Às sete da manhã desta quarta-feira, o Eurogrupo anunciou que desmarcou a conferência de imprensa, marcando nova reunião para amanhã. Foram 16 horas falhadas - como reconheceu já o ministro francês das Finanças.... e o próprio Mário Centeno.
Mostrando como foi tensa a reunião, franceses e alemães saíram da maratona a apelar ao "bom senso" dos representantes dos estados-membros, num momento especialmente importante. Os dois ministros das Finanças, segundo apurou o Expresso, acertaram posições durante a madrugada. Mas nem a posição comum do tradicional eixo político da UE e os sucessivos apelos a uma solução comum chegaram para resolver as divergências. Dito isto, o que é que impede um acordo entre os ministros das Finanças?
Um dos bloqueios que não foram ultrapassados foi o de convencer Roma a aceitar a mobilização do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) como parte da resposta europeia imediata à crise. O fundo de resgate da Zona Euro não é popular em Itália, que não desiste de pedir a criação de eurobonds e a mutualização da dívida. Só que a discussão da mutualização da dívida esbarra no "não" redondo da Alemanha, Holanda, Áustria e Finlândia.
Palavras como "eurobonds" ou "coronabonds" deverão ficar fora das conclusões da reunião do Eurogrupo. À parte de Itália, a maioria dos países não insiste nesse braço de ferro e prefere negociar, antes, a referência à necessidade de um plano de recuperação económica ambicioso - Mário Centeno defendeu essa opção no início do encontro - incluindo dentro desse plano a possibilidade de emissão conjunta de dívida (evitando as palavras tabu), mesmo que temporária e em condições específicas.
França tem defendido a solução de um fundo de recuperação económica, com a possibilidade de mutualização de dívida que baixe o custo do financiamento para todos. Espanha também alinha e esta é uma opção que interessa a países como Portugal e Irlanda. O desafio passa pela redação do texto de forma a manter viva esta opção. Só que, para ser aceite por alemães e holandeses, poderá ser mais vago do que concreto.
Bem mais detalhado deverá ser o pacote de 540 mil milhões de euros que envolve linhas de crédito do MEE (240 mil milhões); o aumento da capacidade do Banco Europeu de Investimento para conceder créditos às empresas (até 200 mil milhões de euros); e ainda o mecanismo (SURE) de empréstimos aos Governos desenhado pela Comissão Europeia para apoiar os regimes de layoff e outros de apoio à manutenção de emprego (100 mil milhões de euros).
O ponto mais difícil de resolver diz respeito à condicionalidade associada às linhas de crédito do MEE. A maioria dos países, incluindo a Alemanha, concorda com a suavização das condições de acesso. Neste ponto, os holandeses têm tido a posição negocial mais dura.
Estão dispostos a deixar que, numa primeira fase, a única condição seja a obrigação de o dinheiro emprestado servir apenas para financiar o combate à Covid19 (por exemplo, na saúde). No entanto, insistem que numa segunda fase é preciso garantir que quem recorreu a estes créditos retorne no médio prazo à sustentabilidade das contas publicas, o que não exclui que sejam pedidas reformas aos países. Aqui, Haia poderá ter de recuar se quiser convencer Itália.
Mário Centeno e os ministros das Finanças terão, nestas 24 horas de negociações informais, de esclarecer as condições de acesso ao fundo de resgate da zona euro, de modo a que a ideia de austeridade não fique colada a estas linhas de crédito que podem rondar os 2% do produto interno bruto. No caso de Portugal, poderia significar o acesso a 4,6 mil milhões de euros. Por esclarecer está também a poupança e as vantagens de recorrer a este tipo de financiamento, em vez da ida convencional dos países aos mercados.
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