Coronavírus

Semana negra. Zona euro foi o epicentro da derrocada bolsista

O índice S&P 500 em Wall Street fixou um novo recorde esta semana ao subir acima de 3390 pontos
O índice S&P 500 em Wall Street fixou um novo recorde esta semana ao subir acima de 3390 pontos
Reuters

Apesar da recuperação na sexta-feira, as bolsas da zona euro perderam 22% da sua capitalização esta semana, cerca de €680 mil milhões. À escala mundial, o índice bolsista caiu 12,4%. Perdas globais somaram €9,4 biliões durante a semana

Os mercados de ações viveram esta semana o pior momento desde a crise financeira de outubro de 1987.

Na imagem da consultora internacional MRP, da "exuberância irracional" sentida ainda em meados de fevereiro passou-se para o "pessimismo irracional" em março, com um agravamento nesta semana de 9 a 13.

As bolsas à escala mundial perderam durante a semana 12,4%, um trambolhão de 9,4 biliões de euros na sua capitalização. Registaram duas sessões de derrocada a 9 e 12 de março, que passaram para a galeria das segunda e quinta-feira negras, com quebras de 7,1% e 9,5% respetivamente no índice MSCI mundial.

Poderia ter sido bem pior, se as bolsas não tivessem recuperado 5% na sexta-feira, graças nomeadamente às injeções massivas de liquidez realizadas pelo Banco da Reserva Federal de Nova Iorque no mercado interbancário (1,5 biliões de dólares em dois dias), pela proibição de vendas a descoberto das ações com maiores derrocadas em Milão e Madrid, e pelo anúncio pela Comissão Europeia de um pacote financeiro mais amplo do que o inicialmente previsto de resposta à crise do coronavírus. A Reserva Federal (Fed) reanimou em pequena escala o programa de quantitative easing distribuindo as suas compras de títulos do Tesouro norte-americano ao longo da curva de prazos.

Rombo de mais de 20% nas praças europeias

A região mais afetada esta semana, em termos de queda percentual, foi a zona euro, que se tornou o epicentro deste abalo financeiro. Por coincidência, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a Europa o epicentro da pandemia.

O índice MSCI para a zona euro perdeu 21,7% durante a semana, provocando um rombo perto de €680 mil milhões, mais de três vezes o PIB português. Cinco bolsas da zona euro perderam mais de 20%, entre elas Frankfurt, Milão e Madrid.

Em Lisboa, o PSI 20 caiu 17,9%, abaixo da 'média' da zona euro, com duas cotadas a liderarem o trambolhão - a Altri que perdeu 28% e a Galp que recuou 25%.

Como referência, a capitalização das bolsas mundiais rondava os 85 biliões de dólares no final de fevereiro e o índice MSCI para a zona euro, envolvendo 10 praças, tinha uma capitalização de 3,1 biliões de euros.

As outras regiões do mercado bolsista registaram esta semana quebras percentuais inferiores à ocorrida na zona euro: 17,5% para a América Latina; 12,7% para a Ásia Pacífico; e 9% para Nova Iorque, segundo os índices MSCI respetivos.

Esta semana, no mercado cambial, o euro desvalorizou-se face ao dólar (-1,9%) e ao yuan (-1%) e apreciou-se em relação à libra (3,2%).

O preço do barril de petróleo fechou a semana em 34,7 dólares, depois de uma quebra semanal de 23%. Desde início do ano, já colapsou 47%. A guerra de preços entre a Arábia Saudita e a Rússia, depois do rompimento da aliança entre a OPEP e Moscovo, está a dominar o mercado do ouro negro, uma alteração geopolítica inesperada.

Radar da recessão

O aparecimento inesperado de dois 'cisnes negros' - o coronavírus chinês e a guerra de preços entre Riade e Moscovo - trouxe de volta o medo de uma nova recessão.

Na Europa é já esse o prognóstico da Comissão Europeia. Bruxelas admitiu na sexta-feira uma previsão de recessão em 2020 na zona euro.

À escala da economia mundial, o Fundo Monetário Internacional alterou, no espaço de apenas quinze dias, a sua previsão de uma aceleração ainda que ligeira em relação a 2019, para um crescimento abaixo de 2,9% registado no ano passado.

Face a este quadro, os investidores reagiram com desilusão ao pacote anunciado pelo Banco Central Europeu na quinta-feira. Esperam, agora, a concretização do pacote de resposta em curso na Europa, uma eventual descida de mais 0,75 a 1 ponto percentual na taxa diretora da Reserva Federal norte-americana (que se reúne na quarta-feira) e um pacote robusto a acordar pela Câmara dos Representantes dos EUA, por iniciativa dos Democratas, e o secretário do Tesouro. Steven Mnuchin, da Administração Trump.

Entretanto, nestas duas semanas de março, 19 bancos centrais já cortaram nas taxas diretoras - recorde-se que o BCE não o fez na quinta-feira e que o Banco do Japão só toma decisões na próxima quinta-feira.

Agitação no mercado da dívida

A projeção global da epidemia, que a OMS tornou oficialmente em pandemia, a continuação do colapso no mercado petrolífero e uma gaffe de Christine Lagarde na conferência de imprensa de quinta-feira a propósito do disparo do prémio de risco italiano, agravaram a fragmentação no mercado da dívida pública.

A alteração foi particularmente sentida na zona euro com uma crescente divergência entre as dinâmicas dos periféricos mais endividados e das economias do centro com títulos de dívida considerados refúgio (como as obrigações alemãs).

Esta semana, o prémio de risco da dívida italiana subiu 52 pontos-base e o da dívida portuguesa aumentou 36 pontos. Os juros no mercado secundário no prazo de referência a 10 anos dispararam mais de meio ponto percentual para as obrigações portuguesas e quase sete décimas para as italianas. O risco italiano é, agora, superior ao grego.

O Tesouro português escapou, por um dia, ao disparo para 0,7% na taxa a 10 anos no leilão de dívida que realizou na quarta-feira, antes da gaffe cometida por Lagarde no dia seguinte. Pagou 0,426% na colocação de €500 milhões.

No mercado dos derivados que seguram contra o risco de incumprimento da dívida pública, está a assistir-se a um disparo do preço dos credit defaults swaps (cds, no acrónimo) a 5 anos para os periféricos do euro e para as economias emergentes mais afetadas pela guerra de preços no petróleo.

Nos últimos trinta dias, o custo dos cds disparou 221% para Portugal, 213% para a Grécia e 206% para Espanha. O preço dos CDS em Itália subiu 165% e está muito próximo do grego.

Entre os emergentes, há sete economias em que o custo dos cds disparou mais de 200% nas últimas trinta sessões: Malásia, que lidera, com um disparo de 354%, seguida da Colômbia, Filipinas, Rússia (que será a mais afetada em termos de impacto no PIB no caso do preço se manter em 30 dólares, segundo projeções da Oxford Economics), Indonésia, México e Brasil.

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