A carta de perigosidade, o mapa que identifica os locais de maior risco florestal, vai ficar suspensa até ao próximo ano, indicou ao Expresso o presidente da Câmara de Gouveia, depois de ter recebido garantias do Governo nesse sentido.
Dificuldades na implementação e desacordos técnicos entre os autarcas e a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Florestais estarão na base da decisão. “Estivemos reunidos com o senhor ministro do Ambiente e obtivemos a garantia que a carta de perigosidade vai ficar suspensa até 2024”, adiantou ao Expresso Luís Tadeu, presidente da Câmara de Gouveia e da Comunidade Intermunicipal da Serra da Estrela, que à semelhança de outras regiões tem contestado o documento.
O Expresso questionou o Ministério do Ambiente sobre a suspensão da carta de perigosidade, indicada ao Expresso também por outras fontes, mas não foi ainda possível obter resposta.
O mapeamento das zonas florestais de maior risco tem estado envolto em polémica com os autarcas a contestarem as restrições.
Fernando Ruas, presidente da Câmara de Viseu e que esteve no Parlamento numa audição sobre o documento, argumentou que a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural poderá limitar mais de 90% do território. E exemplifica: “Para instalar um aviário é um problema”.
A mesma opinião tem Luís Tadeu para quem é preciso “articular as diversas entidades e obter um consenso”.
Um responsável da Proteção Civil lembra que o documento tem vários problemas “técnicos, a começar na escala, que deveria ser de nível concelhio”. Este comandante, que pediu o anonimato, aponta várias restrições como a circulação de pessoas e os constrangimentos que vai gerar no território e às atividades turísticas, agrícolas e florestais”.
Tiago Oliveira, presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Florestais (AGIF), garante que quando o documento estiver em vigor “as pessoas vão poder continuar a circular nos espaços florestais”. João Verde, o responsável da AGIF por este tema, explica que “as restrições são as mesmas que existem há 17 anos”.
Com efeito, desde 2006 que quando o risco de incêndio é alto ou muito elevado “é proibida a utilização de motores de combustão nos espaços florestais e algumas áreas podem ver interditada a circulação, com exceção dos residentes e quem tenha atividade profissional”.
João Verde garante que o mapa foi testado em 2022 e “ficou demonstrado que os incêndios ocorreram nas áreas de maior perigosidade”. A cartografia utilizada é de âmbito nacional e foram estudados vários cenários que “demonstraram que os resultados não seriam diferentes se fosse usada uma escala concelhia”.
Caberá às comissões sub-regionais de proteção civil proceder “às adaptações locais que forem pertinentes”, esclarece ainda João Verde. No entanto, a transposição da Carta de Perigosidade para os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios “está atrasada porque houve pouco tempo para o fazer”, esclarece Luís Tadeu. O que terá levado o Ministério do Ambiente a suspender a entrada em vigor do documento, que estava previsto para 1 de abril.
Sobre a suspensão do documento, o responsável da AGIF assume que essa é uma questão política, sobre a qual não se pronuncia.
Com a suspensão da carta de perigosidade, continuam em vigor os planos municipais de defesa da floresta - que usam um mapa de risco de base concelhia - e serão os autarcas, enquanto responsáveis máximos pela Proteção Civil no concelho a que presidem, a determinar as restrições com base no risco de incêndio que resulta de uma combinação do histórico do número de fogos com a previsão meteorológica.
Anteriormente o gabinete de Duarte Cordeiro já tinha afirmado ao Expresso que esta “cartografia é utilizada no planeamento nacional das ações de prevenção e de pré-supressão de incêndios” e que seria “adaptada à realidade territorial regional, por parte das comissões sub-regionais de gestão integrada de fogos rurais”. Porém o processo arrastou-se e “dificilmente a 31 de março entraria em vigor”, afiança Luís Tadeu. João Verde reconhece que “tecnicamente é possível entrar em vigor em abril, na prática depende dos instrumentos legais que terão que ser publicados”.
O dispositivo de Combate a Incêndios Florestais deverá ser conhecido em maio. Dados da Agência Europeia de Fogos mostram que desde 1 de janeiro até 20 de março já arderam em Portugal 9666 hectares de mato e floresta.
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