Obstetrícia: há hospitais só com obstetras acima dos 55 anos, que já podem abdicar de fazer urgências
Uma enorme lacuna de idades nos obstetras do SNS explica, em parte, o problema das urgências de alguns hospitais
Uma enorme lacuna de idades nos obstetras do SNS explica, em parte, o problema das urgências de alguns hospitais
Jornalista
O SNS tem hoje serviços de obstetrícia “carenciadíssimos”. O adjetivo, como os valores que se seguem, são trazidos à discussão pelo presidente do colégio de Obstetrícia da Ordem dos Médicos, João Bernardes. Senão, vejamos: há serviços com metade dos médicos que precisam e pelo menos cinco têm menos de metade do que aqueles que seriam desejáveis, para o fluxo de trabalho das urgências. Portimão, por exemplo, cuja urgência de obstetrícia tem encerrado, com as grávidas a serem enviadas para Faro, conta apenas com oito especialistas, quando a sua dimensão pedia 16. Daqueles oito, só quatro têm menos de 50 anos. No Hospital Amadora-Sintra, onde seria indicado ter 24, há só 17 — e apenas seis abaixo dessa idade. Em Beja o problema está agravado. Com necessidade de 16 destes clínicos, conta só com quatro e nenhum tem menos de 50 anos. Já em Ponta Delgada, entre 16 especialistas, número suficiente para o bloco de partos, só 5 são mais novos.
A idade é aqui um fator fundamental, uma vez que os obstetras com mais de 50 anos podem, caso o queiram, abdicar de fazer turnos da noite na urgência. Aos que têm mais de 55 anos, é dada a possibilidade de deixarem de fazer urgências de todo. Tal não acontece, porém. Apesar de serem metade (46%) dos especialistas em obstetrícia, os clínicos com mais de 55 anos “continuam, em 82% dos casos, a realizar Serviço de Urgência (SU)”, segundo um relatório da Ordem dos Médicos, publicado em janeiro deste ano, que tenta fazer um retrato da especialidade. Estamos perante uma área muito envelhecida. A falta de médicos jovens “exige um maior número de especialistas para cobrir as necessidades dos SU do SNS, situação que tem sido compensada pela contratação de médicos externos (‘tarefeiros’), pela multiplicação de horas extraordinárias e pela continuação da prestação em SU por especialistas com 55 ou mais anos de idade”, pode ler-se também. Neste terreno, as realidades dos hospitais condicionam bastante a dependência de médicos ‘tarefeiros’ (ver texto sobre as urgências de obstetrícia). Segundo o mesmo relatório, há nove hospitais em que mais de 60% dos clínicos têm mais de 55 anos e, portanto, só garantem urgência se quiserem. No Centro Materno Infantil do Norte (CMIN), no Porto, representam 61% do total de obstetras, nos Hospitais de Coimbra (CHUC) são 65%, na Guarda 63% e no Amadora-Sintra representam 67%. Em Santarém, onde o serviço também tem falhado, há 75% de obstetras com mais de 55 anos. Em Setúbal são 80%. Em Beja e em Castelo Branco não há um único obstetra abaixo desta idade.
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