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Tancos: MP pede condenação do ex-chefe da Casa Militar de Marcelo

Tancos: MP pede condenação do ex-chefe da Casa Militar de Marcelo

General João Cordeiro está a foi julgado num processo à parte por suspeitas de falsas declarações e a sentença é lida hoje à tarde. Noutras certidões extraídas do caso, as procuradoras Cândida Vilar e Helena Miguel foram ilibadas

O general João Cordeiro, ex-chefe da Casa Militar de Marcelo Rebelo de Sousa, foi o único a ter de enfrentar um julgamento nas quatro certidões extraídas do processo principal de Tancos. 

Esta segunda-feira, o militar ficará a saber se o juiz Francisco Henriques o absolve ou condena a uma pena de multa pelo crime de falsas declarações, como pretende a acusação. Durante o julgamento, que já teve duas sessões, Cordeiro manteve que nunca recebeu e-mails do então diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM), o coronel Luís Vieira. 

Acontece que, em tribunal, ficou comprovado que o coronel Vieira enviou três e-mails, em meados de 2017, a pressionar Cordeiro para este convencer Marcelo no sentido da investigação ao roubo das armas de Tancos ficar nas mãos da Judiciária Militar e não na PJ civil.  

Nos outros processos, o Ministério Público (MP) decidiu arquivar todas as suspeitas que envolviam magistrados nas certidões extraídas do processo de Tancos.

Caso arquivado

Um deles é a procuradora Cândida Vilar, que se notabilizou no combate ao crime especialmente violento. Vilar foi apanhada numa escuta com o major Vasco Brazão a sugerir-lhe que não passasse informação sobre matrículas de suspeitos do assalto à PJ civil, responsável pela condução da investigação, depois de Joana Marques Vidal (à altura dos factos, a procuradora-geral da República) ter retirado o caso à PJM.

A magistrada foi ouvida como testemunha na Relação e terá explicado que nunca pretendeu prejudicar a investigação da PJ. O caso foi arquivado sumariamente sem que Cândida Vilar tenha sido constituída arguida.  

A procuradora, que também esteve envolvida no caso da invasão dos adeptos do Sporting a Alcochete, não foi a única a tornar-se um alvo para os colegas: Helena Miguel, uma antiga advogada que se tornou procuradora, chegou a ser constituída arguida e foi alvo de buscas em casa e no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Loulé, pela suspeita do crime de violação de segredo. Mas todas as suspeitas de crime foram arquivadas — até o processo disciplinar que fora aberto contra ela foi encerrado no final de 2021.

Helena Miguel foi investigada durante quatro anos, esteve sob escuta e caiu na mira da PJ após ter sido apanhada a prometer ajuda à mulher do sargento Lima Santos, o chefe do núcleo de investigação criminal (NIC) de Loulé, detido por envolvimento no achamento das armas na Chamusca. 

Conversas em código

Há outras chamadas entre o sargento Lima Santos e a magistrada em que os dois parecem falar em código e a procuradora sugere que falem pelo WhatsApp. Mas quando foi interrogado, Lima Santos confessou ajuda à procuradora devido a um problema de saúde do filho e que esta lhe sugeriu falar com uma taróloga de Olhão, Carlita, também conhecida como “Dragão Verde”. E que era esta a “amiga” que sabia “de tudo”, relata o procurador da Relação de Évora que se encarregou da investigação a Helena Miguel.  

Mas havia suspeitas de que a “amiga” era outra: Isabel Nascimento, procuradora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que estivera colocada em Loulé e trabalhara com Helena Miguel. Em outubro de 2017, já depois do achamento, esta procuradora recebeu uma chamada de João Almeida, um militar da GNR de Loulé com quem também trabalhara antes. Estava em Lisboa e queria fazer uma visita. Combinaram um almoço que teve uma visita surpresa (para a procuradora): Lima Santos, o chefe do NIC de Loulé que já durante a sobremesa tentou saber o que estava a investigar o DCIAP. A procuradora não quis falar do caso e foi ouvida como testemunha no processo, tendo garantido que avisou um colega do MP sobre o referido almoço, alertando também ter informado o diretor do DCIAP, Amadeu Guerra, “antes e depois do [dito] almoço”.  

A versão de Lima Santos foi confirmada pela procuradora Helena Miguel quando foi ouvida, mais de três anos depois das buscas. Admitiu que falou sobre o assalto a Tancos, quer com o militar, quer com a taróloga, porque era um “processo mediático” que lhe “interessava”. Não conseguiu explicar por que razão tinha na sua posse transcrições de escutas feitas no âmbito do processo de Tancos e garantiu não ter favorecido ninguém, e que nem isso lhe foi pedido.  

Versão da taróloga desvalorizada

No despacho de arquivamento, apesar de considerar que o sargento e a procuradora “afinaram” os depoimentos e que o principal tema das conversas era o caso de Tancos — e que o objetivo era “ajudar o sargento Lima Santos” —, o procurador Manuel Taxa admite que não foi possível identificar a “amiga” que “sabia de tudo”, não dando qualquer crédito à versão da taróloga. “Se fosse, para quê tanto segredo?”

Este magistrado critica o facto de Helena Miguel não explicar como tinha documentos do processo no computador, mas considera haver uma “manifesta falta de indícios” de que a procuradora tenha tido acesso a material em segredo de Justiça e que o tenha passado a Lima Santos. Por isso, arquivou todas as suspeitas.  

Miguel A. Fonseca, advogado da procuradora, diz que irá “até às últimas consequências” para “responsabilizar” quem “humilhou a procuradora com buscas em casa e no local de trabalho” sabendo que ela “nunca praticou qualquer crime”.  

O quarto visado pelas certidões é o antigo diretor da PJ, Almeida Henriques, também ele sob suspeita de ter avisado o diretor da PJ militar, Luís Vieira, das investigações que decorriam na PJ. O polícia nunca foi ouvido, Luís Vieira já foi interrogado, mas não há despacho final sobre este caso. 

FOTO: Nuno Botelho

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