Rui Tavares é um daqueles homens demasiado inteligentes para a política e demasiado enérgicos para a inação. Racionalmente, entende a necessidade de compromissos, mas sabe que estes estão na origem da desilusão e do afastamento de muita gente em relação à política. Por isso é que a sua ideia peregrina de união à esquerda foi rejeitada quando ele a apresentou e depois prosperou na forma de guisado cozinhado nos bastidores da política, uma caldeirada maquiavélica contrária ao seu idealismo pueril.
Entre a inação e a irrelevância, optou por esta, mas em forma de partido e não em forma de individualismo tribunício, isolado. É, tudo leva a crer, um otimista. Um homem que acredita e no qual a boa vontade e uma certa lucidez – o reconhecimento dos seus limites – casam com uma inapelável incapacidade de mobilização e falta de carisma.
Não me interpretem mal. A sociedade precisa de homens como Rui Tavares, mas geralmente destina-lhes lugares de liderança em comissões de utentes de um hospital público ou em associações de pais de agrupamentos escolares da província. Na política, a inteligência, a cultura e o trabalho intelectual são desvantagens porque o que a praxis política pede é uma certa mediania do intelecto, algum instinto e, no caso dos que se contentam em ser segundas linhas ou décima escolha nas listas de um partido, um conformismo abnegado, um certo tipo de disciplina que é a variante tática da obediência.
Ora, um homem como Rui Tavares, consciente do seu valor, não se contenta em engrossar as fileiras de um partido, por mais que se reveja nos seus ideais. Precisa de um lugar de destaque em que não esteja sujeito aos compromissos, ainda que os advogue. Há nele o ardor do jovem que se candidata à Associação de Estudantes para mudar o mundo. E é esse entusiasmo pela palavra, que em Rui Tavares, ao contrário do que acontece com outros líderes, parece genuíno e não fruto da vaidade, que o impede de ser aquilo que estaria mais qualificado para ser, um daqueles quadros sólidos e pardos de que todos os partidos precisam.
Por carácter e condição, Rui Tavares prefere ser o líder de um partido inútil do que o secretário de uma coligação em que não possa determinar a cada momento o rumo a seguir. O Livre é uma espécie de laboratório em que a esquerda urbana pode ir fazendo uma série de experiências agora que o Bloco se cristalizou num partido do arco da governação – já o PC, na sua inflexível ortodoxia e conservadorismo, nunca foi adepto de grandes experimentalismos.
Só que, como é natural num laboratório gerido por amadores, tanto se pode descobrir o segredo alquímico como provocar explosões desnecessárias, como se viu no caso Joacine. Mas Rui Tavares não desiste: ei-lo de volta aos palcos políticos nesta pré-campanha eleitoral com as suas propostas irrealizáveis, o seu civismo indestrutível, o seu espírito de uma cândida determinação. Mesmo que não tenha sequer 1% dos votos, de uma coisa podemos estar certos, ele voltará.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt