Sociedade

Demitiram-se os chefes da urgência cirúrgica do Hospital Santa Maria, em Lisboa

Demitiram-se os chefes da urgência cirúrgica do Hospital Santa Maria, em Lisboa
MIGUEL A. LOPES/LUSA

Depois do aviso no começo do mês, os dez chefes de equipa da urgência cirúrgica daquela unidade hospitalar apresentaram a demissão. Hospital garante ter dado resposta positiva às "reivindicações apresentadas"

Todos os chefes de equipa cirúrgica do serviço de urgências do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, demitiram-se do cargo. A notícia foi avançada pela RTP e confirmada pelo Expresso. Os dez médicos apresentaram a demissão esta segunda-feira, dia em que termina o prazo máximo dado à direção hospitalar para responder à carta enviada a 10 de novembro em que era exigido que fossem tomadas medidas.

“Demitiram-se do cargo de chefia e nove deles colocaram os papéis para deixar de fazer urgência por terem mais de 55 anos. Não se trata aqui só de deixar de ter chefes, trata-se também de perder nove médicos muito diferenciados do serviço de urgência”, defende ao Expresso Alexandre Valentim Lourenço, presidente do conselho regional do Sul da Ordem dos Médicos. Nove dos dez médicos que se demitiram do cargo de chefia já têm mais de 55 anos e, ao abrigo da lei, podem pedir dispensa do trabalho nas urgências.

“É muito preocupante quando estes problemas chegam aos hospitais de referência de fim de linha como o Santa Maria. É um hospital onde, por exemplo, o serviço de traumatologia serve toda a região de Lisboa”, continua. “Quando chega aos hospitais centrais reforça a nossa convicção de que se devia investir mais no Serviço Nacional de Saúde. É um sintoma de que as condições têm de ser revistas o mais rapidamente possível. O SNS tem de ser reforçado em meios, dinheiro, pessoas e organização.”

Em declarações à agência Lusa, o presidente do Sindicato dos Médicos da Zona Sul, João Proença, afirmou que o Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) “não deu qualquer resposta às pretensões dos médicos que eram muito claras", pelo que foi concretizada a demissão. “Os colegas exigiram que fossem tomadas medidas para que o banco de urgência continuasse a ter uma vida normal, porque só eram duas pessoas, um chefe de equipa e um especialista, e precisavam de seis pessoas diferenciadas", disse o dirigente sindical.

João Proença adiantou que os médicos fizeram "uma proposta de linha vermelha" ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHULN), mas como este respondeu de "forma evasiva" decidiram que, a partir de dezembro, vão comunicar que "já não fazem urgência porque têm mais de 55 anos", além de irem limitar as horas extraordinárias.

Assim, adiantou, "não só deixam de ser responsáveis de equipa como deixam de fazer bancos de urgência", ao abrigo da lei. "Isto vai tornar insolúvel o problema do Serviço de Cirurgia do hospital central da área de Lisboa e ainda por cima universitário", salientou João Proença.

Hospital garante ter dado resposta positiva às "reivindicações apresentadas"

Em comunicado enviado ao final da tarde desta segunda-feira às redações, a direção clínica do hospital refere ter realizado, "nas últimas duas semanas, cinco reuniões" com os chefes em causa, "com o objetivo de resolver [as] questões levantadas por estes profissionais".

Na sequência destas reuniões, a direção clínica "consensualizou alterações em protocolos de resposta do serviço de urgência, indo ao encontro das reivindicações apresentadas, mudanças assumidas por escrito em documentos enviados pelo diretor clínico a elencar as principais medidas a serem implementadas e a sublinhar disponibilidade para aprofundamento de outras". Ainda assim "os chefes (...) entendem que não foram resolvidas todas as questões identificadas".

No comunicado, o hospital refere ainda que, apesar do desfecho das negociações, mantém "o mesmo espírito negocial construtivo e os mesmos canais de diálogo e procura de soluções, assegurando que tudo fará para manter o normal funcionamento da sua urgência e o reforço das suas equipas".

Médicos alertaram para "situação da urgência cirúrgica" a 10 de novembro

De acordo com uma carta inicialmente enviada ao Conselho de Administração, a 10 de novembro, os dez médicos alertavam para a “situação da urgência cirúrgica, que se tem agravado nos últimos anos” e que tem piorado mais recentemente.

Em causa está a escala de serviço, que os chefes de equipa consideram “não ser exequível”. A situação do serviço, pode ler-se ainda, tornou-se mais complicada após a recusa dos assistentes hospitalares em fazer mais horas extraordinárias do que aquelas que são estabelecidas por lei. E embora os médicos apoiem a decisão, a falta de pessoal torna impossível cumprir a escala prevista.

Na missiva, dirigida ao diretor clínico do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), Luís Pinheiro, e assinada pelos dez chefes de equipa, é pedida uma reunião com carácter de urgência para apresentar a demissão a partir de 22 de novembro. A decisão já foi, no entanto, comunicada ao diretor do departamento de cirurgia, João Coutinho.

Na altura, em comunicado posteriormente enviado às redações, o CHULN confirmou a receção da carta a manifestar “total abertura” para resolver as “questões de organização interna e distribuição de serviço” levantadas pelos chefes de equipa, tendo já “agendado reuniões com os respetivos serviços para o início da próxima semana para lhes dar rápida resposta”.

“Sublinhe-se que estas equipas se mantêm em funções e que o Serviço de Urgência Central do CHULN continua a funcionar com toda a normalidade”, pode ainda ler-se.

Nas últimas semanas, queixas de falta de pessoal nos hospitais portugueses levaram, por exemplo, à demissão do diretor clínico do Centro Hospitalar de Setúbal e de mais 86 médicos, assim como o encerramento das urgências do Hospital de Leiria. Quer o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), quer a Federação Nacional dos Médicos (FNM) marcaram greve para os dias 22, 23 e 24 de novembro - entretanto suspensa com a dissolução do Parlamento.

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