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Sociedade

Entregas ao domicílio. A vida em duas rodas dos estafetas precários

Entregas ao domicílio. A vida em duas rodas dos estafetas precários
José Fernandes

Na sombra da app cresce um problema social. O negócio delivery faturou como nunca com a pandemia. A crise atirou para a profissão de estafeta uma multinacional de gente em situação precária e, por outro lado, fez disparar a insegurança nesta atividade. Os assaltos e as agressões a estafetas não são uma realidade virtual. A contestação cresce

Até ao dia 6 de setembro de 2020, entre a primeira e a segunda vaga da pandemia, a vida de Cristiano em Portugal passou-se em cima de uma moto. Não saía muito disto: “Rodava do meio-dia às 16h30. A essa hora desligava o meu aplicativo e ia para a faculdade. Às 19h ligava o aplicativo de novo e trabalhava até à meia-noite ou uma da manhã. Acordava de manhã cedo e ia para a faculdade.” Era um dos milhares a trabalharem no exército a que chamam delivery. Nesse dia, estacionou a moto no sítio errado. E, por um pedido, quase perdeu a vida.

Parece que foi ontem. As casas cheias, as ruas vazias. O pesado silêncio do medo, lá fora, outro de razão impossível, lá dentro. Os sós mais sós, os frágeis mais frágeis, os tristes mais tristes, os indefesos já se sabe. As horas que não queriam passar, os mortos dos outros e os nossos atualizados ao minuto, OMS, SNS, SNS24, Infarmed, DGS, regras, normas, protocolos, língua gestual, testes, isolamento profilático, distanciamento social, quarentenas, estirpes, vagas, ventiladores, aviões em terra, fronteiras fechadas, velas à janela, salmos, sessões de palminhas coletivas em homenagem aos profissionais de saúde, que a toda a hora colocavam a sua vida em risco e de vez em quando umas imagens arrepiantes no Instagram, com a cara transformada em mil socalcos de máscara.

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