Exclusivo

Sociedade

Julgamento de Pedrógão Grande. Estado ausente, um despacho perdido e uma sala lotada

Aparato de arguidos, advogados, e jornalistas à entrada do Tribunal de Leiria para o início do julgamento
Aparato de arguidos, advogados, e jornalistas à entrada do Tribunal de Leiria para o início do julgamento
PAULO CUNHA/Lusa

O Estado é o grande ausente do julgamento do incêndio de Pedrogão Grande, que começou esta segunda-feira numa lotada sala do Tribunal de Leiria e sem que seja conhecido o resultado do recurso interposto pelo Ministério Público e que pode ditar a nulidade do julgamento

A nulidade do julgamento que senta no banco dos réus 11 arguidos, apontados como tendo responsabilidades no fogo de Pedrogão que matou 66 pessoas (o julgamento abrange 63, havendo três das mortes que não fazem parte do processo) e feriu outras 44, “é uma possibilidade”, admitiu Ricardo Sá Fernandes, que representa familiares de 4 vítimas

Em causa está o recuso interposto pelo Ministério Público (MP) sobre a classificação como megaprocesso dos autos que julgam os acontecimentos de junho de 2017. Em janeiro o MP criticou a decisão e interpôs recurso para o Tribunal de Relação de Coimbra. Apesar de já haver um despacho da juíza titular, o mesmo não é do conhecimento dos diversos advogados envolvidos no processo. Esta foi a grande inquietação do julgamento que hoje começou em Leiria. “Dependendo da decisão do recurso, toda a prova produzida pode ser declarada nula e o julgamento ter de recomeçar”, revelou José Sá Fernandes.

Maria Santos, a juíza presidente do coletivo, considera que “inexistem quaisquer nulidades ou irregularidades processuais”.

Porém o MP sustenta que o processo envolve menos de 20 acusados, pelo que a distribuição “não poderia ter ocorrido na espécie de complexidade de megaprocesso”. E reforça o recurso com a possibilidade de “evitar a repetição do julgamento”.

No decorrer da manhã foi ainda notada a “ausência do Estado” do processo, lembrou o advogado Rodrigo Oliveira, que representa outra família de vítimas. José Marques, também ele advogado das vítimas, criticou uma “Justiça para os pequenos e outra para os grandes”, lamentando a “ausência das estruturas do Estado” que intervêm no combate aos fogos.

A exiguidade da sala que acolhe a audiência, com capacidade para 27 pessoas e onde se juntam 47 agentes processuais e mais 10 jornalistas, motivou ainda queixas de todos os advogados, que pediram uma “justiça feita em nome do povo e que deve ser feita com presença do público”, protestou Sá Fernandes.

E na primeira parte da sessão da manhã ficaram à porta algumas pessoas, com destaque para a filha de um dos arguidos, o antigo vice-presidente da autarquia de Pedrógão Grande.

Durante a manhã, a sessão foi dedicada ao debate introdutório, com o MP a insistir na “inação” dos 11 arguidos, que foram “negligentes” na aplicação dos planos de defesa da floresta contra incêndios.

Já a advogada de defesa do comandante António Arnaut, primeiro comandante do incêndio, recusou que o operacional seja apontado “como bode expiatório de uma tragédia que todos os anos se repete, com mais fogos e mais área ardida”.

O julgamento retoma ao princípio da tarde, com a continuação das disposições introdutórias e a audição dos primeiros arguidos.

Na sala estão presentes 11 arguidos, que respondem por crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves.

Estão ainda presentes 28 advogados, 3 funcionários judiciais e outros tantos juízes, duas procuradoras e dois agentes da PSP.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate