Violência doméstica. Menos queixas e mais medidas de afastamento aplicadas
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Os dados do ano passado apontam para uma diminuição do número de queixas em relação ao crime de violência doméstica. No entanto, um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) revela que um terço das vítimas inquiridas disseram ter sido agredidas pela primeira vez durante a pandemia
Apesar de o número de participações às autoridades por violência doméstica ter diminuído no ano passado, em comparação com 2019, registou-se um aumento da aplicação de medidas de coação de afastamento do agressor.
De acordo com o "Diário de Notícias", as participações à PSP e à GNR diminuíram 9,1% no primeiro trimestre de 2020, em relação a 2019, mas as medidas de coação de afastamento do agressor aumentaram 29,5%. Quanto à medida de coação de afastamento com vigilância de pulseira eletrónica, o aumento foi de 38,8%. Já o número de pessoas abrangidas por tele-assistência no âmbito do crime de violência doméstica aumentou 33,4%. Este aumento verificou-se nos restantes trimestres do ano passado.
"O que me transmitiram foi uma maior autonomização das vítimas, que sentem que há mais medidas de coação e afastamento, o que de facto se traduz nos números que fomos recebendo relativos a essas medidas", explicou Rosa Monteiro, secretário de Estado para a Cidadania e a Igualdade.
Em relação à ligação entre o crime de violência doméstica e o período de pandemia que o país atravessa, a Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) revela que um terço das vítimas disseram ter sido agredidas pela primeira vez durante a pandemia.
"Este fenómeno, ainda que transversal a todos os grupos etários e níveis de escolaridade, tem especial relevo nos mais jovens e menos escolarizados. São também as pessoas que reportam dificuldades económicas ou cuja atividade profissional foi prejudicada pela pandemia quem mais refere ser vítima de violência doméstica", refere a ENSP em comunicado.
O projeto de investigação "VD@COVID19" procurou analisar a violência doméstica psicológica, física e sexual autorreportada durante a pandemia, tendo para isso recolhido, entre abril e outubro de 2020, um total de 1062 respostas a um questionário online dirigido à população.
"O desenho do estudo levou a uma maioria de respondentes com ensino superior, o que permitiu incluir grupos sociais que frequentemente têm menor participação em estudos de violência doméstica", adianta a ENSP.
Os resultados indicam que, "em tempos de covid-19, a ocorrência de situações de violência é uma realidade em Portugal com 15% dos participantes (159) a relatar ocorrência de violência no seu domicílio e um terço das vítimas (34%) disse ter sofrido violência doméstica pela primeira vez durante a pandemia". O tipo de violência mais relatada é a psicológica, com 13% (138 participantes), seguindo-se a sexual, com 1% (11), e a física, com 0,9% (10), existindo co-ocorrência de diferentes tipos de violência.
Segundo o estudo, a maioria das vítimas não procura ajuda nem a denuncia (72%), por a considerarem "desnecessária", que "não alteraria a situação" e por se sentirem constrangidas com a situação. Já os principais motivos para não denunciar a situação às autoridades policiais são que o "o abuso não foi grave" e "acreditar que as autoridades não fariam nada".