A falta de confiança nos serviços e a ausência de formação específica são os principais obstáculos sentidos pela maioria dos profissionais que trabalham na área da autodeterminação de género de crianças e jovens em Portugal, referem os dados preliminares de um trabalho científico levado a cabo por 30 cientistas vindos de nove países, nos quais se incluem três do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (UC).
81% dos inquiridos em Portugal destacam a falta de formação para trabalhar especificamente com crianças e jovens LGBTI+ - sigla que representa lésbicas, gays, bissexuais, transgénero, intersexo e outras orientações. Fatores como a falta de conhecimento sobre práticas afirmativas/recursos LGBTI+ (78,3%), a falta de conhecimento por parte dos técnicos acerca dos serviços disponíveis (69,8%) e de questões LGBTI+ em geral (66,7%), e a falta de serviços para crianças LGBTI+ (60,9%) também foram apontadas, numa abrangência de inquiridos em que 40% afirmam mesmo não conhecer qualquer serviço local, regional ou nacional dirigido a crianças e jovens desta comunidade.
No sector da educação, 73% dos profissionais nunca receberam qualquer formação
Naquele que é o primeiro estudo focado na diversidade de género em jovens e crianças, a nível europeu - “Diversity and Childhood (DaC): transformar atitudes face à diversidade de género na infância no contexto europeu” - o objetivo é diagnosticar e intervir para combater a discriminação de género em cinco áreas: escola, saúde, media, espaços públicos e instituições de apoio à criança e famílias.
No sector da educação, um dos que mais lida com a idade escolar, 73% dos profissionais inquiridos referem nunca ter recebido qualquer formação nesta área, sendo, na opinião da investigadora principal do Centro de Estudos da Universidade de Coimbra, Ana Cristina Santos, “igualmente alarmante será o facto de mais da metade destes profissionais revelar não ter acesso a recursos ou políticas específicas para crianças LGBTI+ na instituição onde trabalha, a fim de garantir uma intervenção abrangente e adequada”.
Na área da saúde, a conclusão mais preocupante, de acordo com a investigadora, prende-se com a falta de confiança nos serviços, como referem três quartos dos profissionais de saúde questionados.
Em Portugal, os resultados preliminares deste estudo, iniciado em 2019 e financiado pela Comissão Europeia até 2021, deve-nos fazer refletir, segundo Ana Cristina Santos, “a total ausência de questões LGBTI+ na formação académica e curricular de grande parte destes profissionais, com mais de metade a admitir nunca ter feito, posteriormente, uma atualização de conhecimentos ou uma formação específica para o trabalho com crianças e jovens LGBTI+”.
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